Guiné-Bissau "não está à beira de uma guerra civil"
Iancuba Dansó (Bissau) | Lusa
7 de fevereiro de 2020
Garantia é do primeiro-ministro, Aristides Gomes, na sequência da promessa de Umaro Sissoco Embaló de tomar posse como Presidente, independentemente da decisão da justiça sobre a nulidade das eleições.
Publicidade
O primeiro-ministro da Guiné-Bissau, Aristides Gomes, afirmou esta sexta-feira (07.02) que ninguém pode amedrontar com palavras e tranquilizou a população ao afirma que o país "não está à beira de uma guerra civil" devido ao impasse pós-eleitoral.
"Queremos dizer que não estamos, de maneira nenhuma, à beira de uma guerra civil. Uma só pessoa, um grupo de pessoas, não pode, de maneira nenhuma, desestabilizar a Guiné-Bissau", observou Aristides Gomes, prometendo uma resposta inteligente do Governo, "mas não com brutalidade".
O primeiro-ministro falava à saída de um encontro que manteve no Palácio do Governo, em Bissau, com embaixadores acreditados no país, com os quais analisou a situação política e as declarações de Umaro Sissoco Embaló, apontado com o vencedor das eleições presidenciais pela Comissão Nacional de Eleições (CNE).
Guiné-Bissau "não está à beira de uma guerra civil"
Simões Pereira alerta para responsabilização
Também Domingos Simões Pereira - líder do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e declarado pela CNE como o candidato derrotado na segunda volta - insurgiu-se esta sexta-feira contra as declarações do declarado vencedor do escrutínio.
Domingos Simões Pereira - que tem estado em silêncio nas últimas semanas, apesar do ambiente tenso no país - falou esta sexta-feira em conferência de imprensa. Numa alusão a Umaro Sissoco Embaló, o líder do PAIGC fez uma chamada de atenção: "Se alguém pretender pôr em causa a paz e a tranquilidade internas, será responsabilizado pelo povo guineense”.
Simões Pereira sublinhou ainda que "o Governo tem a obrigação de governar o país" e é "um Governo de maioria do PAIGC", pelo que, segundo o líder do partido, "tem que garantir ao povo guineense que está a governar e a administrar o país de acordo com as leis e as normas, impondo a ordem interna na República da Guiné-Bissau".
"Fazer a guerra para se fazer a paz"
Na quinta-feira, depois do seu regresso a Bissau, depois de uma visita a vários países africanos, o candidato declarado vencedor das presidenciais pela CNE disse que será investido no cargo, no dia 27 deste mês, com ou sem o aval do líder do Parlamento e independentemente da decisão do STJ.
Sissoco Embaló referia-se ao pedido de nulidade das eleições, apresentado na máxima instância judicial guineense pela candidatura de Domingos Simões Pereira. Umaro Sissoco Embaló deixou ainda um alerta: "Às vezes é preciso fazer a guerra para fazer a paz, se é necessário vamos fazer guerra para fazer a paz e a Guiné-Bissau vai-se libertar".
"Todos sabem que Umaro Sissoco Embaló é o novo Presidente da Guiné-Bissau. Não há nenhuma negociação, e digo isso com todo o sentido de responsabilidade. E mando também um recado ao chefe de Estado Maior das Forças Armadas de que o Comandante Supremo das Forças Armadas, com ou sem posse, sou eu", frisou.
Gomes convoca embaixadores acreditados na Guiné-Bissau
02:39
Apelos à legalidade
À DW África, o jornalista Bacar Camará aponta o respeito pela legalidade como saída para o impasse político na Guiné-Bissau: "Os tribunais estão a fazer os seus trabalhos, alguém interpôs um recurso, o tribunal tem por obrigação apreciar este recurso, mas ainda não decidiu sobre nada e eu acho que é preciso respeitar as instituições da República".
O jornalista lembra que "embora a CNE seja o órgão competente para divulgar os resultados, há um outro órgão que pode apreciar a decisão da CNE, e nós chamamos a isso de tribunais".
O STJ já está a analisar os documentos que lhe foram entregues na terça-feira pelo coletivo de advogados do PAIGC. O grupo pede a nulidade da segunda volta das eleições por alegadas irregularidades que, segundo o coletivo, "puseram em causa a verdade eleitoral".
Entretanto, a Comunidade Económica de Estados da África Ocidental (CEDEAO) vai aproveitar a cimeira da União Africana (UA), na Etiópia, para debater a crise pós-eleitoral na Guiné-Bissau. Em comunicado, a CEDEAO pede aos ministros dos Negócios Estrangeiros da CEDEAO para que avisem aos respetivos chefes de Estado que vai haver uma reunião extraordinária da organização sub-regional para analisar a crise pós-eleitoral na Guiné-Bissau.
A cimeira decorre entre domingo e segunda-feira e a reunião da CEDEAO está prevista para domingo à noite.
Farpas e elogios: Frases das eleições na Guiné-Bissau
Principais partidos políticos, sociedade civil e comunidade internacional acompanham de perto contagem de votos na Guiné-Bissau. CNE só divulga resultados na quarta-feira (13.03), mas PAIGC já canta vitória.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
PAIGC
O PAIGC declarou-se, na segunda-feira (11.03), vencedor das eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau. O porta-voz do partido João Bernardo Vieira garantiu que o povo conferiu ao PAIGC os destinos do país. No domingo, após votar, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse que estas eleições representam "um momento de viragem" para que, na Guiné-Bissau, "o império da lei vingue".
Foto: DW/F. Tchumá
MADEM-G15
Após o anúncio do PAIGC, o Movimento para a Alternância Democrática frisou que ninguém ganhou as eleições com maioria absoluta e que também fará parte do próximo Governo do país. As declarações de Braima Camará no domingo, dia das eleições, foram das mais críticas, pois o líder do MADEM-G15 acusou o primeiro-ministro de "usar dinheiro público para corromper líderes de opinião no dia de reflexão".
Foto: DW/J. Carlos
PRS
O Partido da Renovação Social disse, esta terça-feira, que "é falsa a informação da maioria folgada que o PAIGC sustenta para semear a confusão"."Nenhuma das forças políticas atingiu sequer a barra dos 40 deputados", disse Vítor Pereira. No domingo, depois de votar, Alberto Nambeia, líder do PRS, disse que esta votação constitui um "balão de oxigénio" para o povo, que quer mudanças no país.
Foto: DW/B. Darame
FREPASNA
Baciro Djá considera que era o candidato com mais experiência nestas eleições e, por isso, o justo vencedor. No entanto, esta segunda-feira, o líder do partido Frente Patriótica para a Salvação Nacional (FREPASNA) foi o primeiro a reconhecer a derrota no pleito. "Consideramos que o nosso resultado foi péssimo e a responsabilidade máxima é minha, enquanto presidente do partido", disse.
Foto: Presidency of Guinea-Bissau
Comissão Nacional de Eleições (CNE)
Pouco depois do arranque do pleito, no domingo, José Pedro Sambú, presidente da CNE, disse aos jornalistas que o processo estava a decorrer num "clima de transparência e sem sobressaltos". O mesmo cenário foi reportado pela porta-voz da comissão, ao final do dia. Felizberta Vaz garantiu ainda que os "pequenos problemas" que surgiram foram resolvidos. A CNE divulga os resultados esta quarta-feira.
Foto: CNE
Presidente da República
Em declarações aos jornalistas, depois de votar, no domingo, José Mário Vaz garantiu que os observadores estavam "surpresos" pela positiva com a Guiné-Bissau. O Presidente guineense pediu à imprensa para que passasse lá para fora essa "grande imagem" da Guiné-Bissau como um país onde "não há problemas". "Considero a Guiné-Bissau hoje campeã da liberdade", disse.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Primeiro-ministro guineense
Também no domingo, o primeiro-ministro guineense disse estar emocionado com a concretização de um processo eleitoral "difícil e intenso", no qual foi "necessária a intervenção da comunidade internacional". Aristides Gomes acrescentou ainda que, apesar das dificuldades, este foi um processo cheio de "pedagogia".
Foto: Präsidentschaft von Guinea-Bissau
Organização das Nações Unidas
David McLachlan-Karr, enviado das Nações Unidas à Guiné-Bissau, tem estado a reportar, com frequência, o ambiente vivido no país nestas eleições, nas redes sociais. Esta segunda-feira, o representante da ONU deu os parabéns à população guineense que, "em todo o país, saiu [às ruas] para votar pacificamente e com muito orgulho cívico".
Foto: DW/B. Darame
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Também a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), na pessoa de Luiz Villarinho Pedroso, acompanhou de perto a votação. No domingo, dia da eleição, o chefe da missão da CPLP disse que estas eleições foram um "exercício cívico exemplar", que decorreu com a "maior tranquilidade e normalidade". O balanço preliminar do escrutínio será feito ao longo desta terça-feira (12.03).
Foto: DW/N. dos Santos
CEDEAO
À semelhança da ONU e da CPLP, também a CEDEAO deu nota positiva às eleições guineenses. Numa conferência de imprensa, esta segunda-feira (11.03), Kadré Désiré Ouedraogo, chefe da Missão de Observação da CEDEAO, disse que as legislativas no país decorreram "de forma pacífica e transparente". Acrescentou ainda que espera que "todos [os partidos] aceitem os resultados".
Foto: DW/B. Darame
União Africana
Após o encerramento das urnas na Guiné-Bissau, Rafael Branco, chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Africana destacou a forma tranquila com que decorreu o processo e salientou a "participação cívica notável".
Foto: DW/Nélio dos Santos
Liga Guineense dos Direitos Humanos
Também as organizações locais fizeram chegar elogios. À semelhança do que foi dito pela CNE, Augusto Mário da Silva, presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, disse ter havido registo de "algumas falhas", mas "que foram imediatamente supridas". Tirando os atrasos na abertura das urnas em algumas mesas e trocas de cadernos eleitorais, "o processo decorreu de forma regular", disse.
Foto: DW/B. Darame
Sociedade Civil
Por último, a Célula de Monitorização do Processo Eleitoral salientou, esta segunda-feira, que "os eleitores compareceram em massa para exercer o seu direito de voto". Este grupo de monitorização das eleições, composto por 420 pessoas, espalhadas por todo o país, saudou também "a boa presença das forças de segurança nos centros de votação observados".