Guiné-Bissau: Novos discursos para a segunda volta
Iancuba Dansó (Bissau)
18 de dezembro de 2019
Para o segundo "round" os candidatos assumem-se como homens de paz e unidade nacional, mas as abordagens são distintas, a começar pela suposta instrumentalização étnico-religiosa nas eleições.
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As sanções ainda em vigor contra os militares guineenses, devido ao golpe de Estado de 2012, e a necessidade de haver paz e estabilidade no país, são dos assuntos mais destacados pelos dois candidatos na campanha eleitoral para a segunda volta das presidenciais, marcadas para 29 de dezembro. Entretanto, o espaço que o voto étnico e religioso ganhou na primeira volta, realizada a 24 de novembro, contradizem os apelos.
Disputam a segunda volta Domingos Simões Pereira, cristão, e Umaro Sissoco Embaló, muçulmano, pelo que se teme pelo voto étnico e religioso, que segundo algumas vozes, é capaz de pôr e causa a unidade nacional.
E o candidato do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Domingos Simões Pereira, que desde a primeira volta dispensou as abordagens sobre o assunto, apelou à unidade nacional em Bafatá, região do leste do país e maioritariamente muçulmana, questionando: "Quando nos juntamos todos na Guiné, somos pequenos, imaginem se somos divididos?
E Pereira alerta: "Somos lembrados de que há etnias e há religiões e pensamos que o outro não pode entrar onde entramos, assim o país vai se tornar pequeno para nós e isso não devemos aceitar. Se no dia 29 não decidirem escolherem Domingos Simões Pereira, que tenham razão sobre a vossa decisão, mas se escolherem Domingos, saibam o que vão dar voz a Guiné-Bissau".
Na caça ao voto Sissoco Embaló prefere atacar adversário
E quanto a Umaro Sissoco Embaló, tema novo na sua campanha são as sanções impostas aos militares guineenses envolvidos no golpe de Estado, em 2012. O candidato do Movimento para Alternância Democrática (MADEM G-15), preferiu pautar-se por acusações ao seu adversário no lugar de continuar a divulgar o seu manifesto eleitoral. Embaló afirma que Domingos Simões Pereira é que está a impedir o levantamento do castigo:
"Quando eu era primeiro-ministro, falei com as Nações Unidas e pedi que levantassem as sanções contra os militares. E até Carlos Gomes Júnior, em Portugal, pediu o levantamento das sanções e disse que tinha perdoado os militares, mas Domingos Simões Pereira foi [lá] e disse não", diz Embaló.
Já o candidato do PAIGC nega a acusação e lembrou que no momento da aplicação das sanções, já estava na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e sem ligação com a política guineense. Mas, promete que, caso seja eleito, com a sua influência, as sanções impostas aos militares serão levantadas, num espaço de três meses.
Guiné-Bissau: Novos discursos para a segunda volta
Escolher o bem ou o mal
Para o analista político Rui Landim, há uma larga diferença nos discursos dos dois candidatos, pelo que, para o dia 29 de dezembro não haverá meio termo, será "escolher o bem ou o mal. Escolher entre ter um Estado respeitado, de lei, democrático e para todos os guineenses, onde haja igualdade da oportunidade ou ter um Estado onde vai reinar a lei da força, em que um punhado de gente organiza-se em gangues, em quadrilhas para sequestrar o país".
No dia 26 de dezembro, Domingos Simões Pereira e Umaro Sissoco Embaló vão estar frente à frente num debate na televisão pública do país, um embate que será antecedido por entrevistas feitas individualmente aos candidatos, na mesma estação televisiva.
Presidenciais: Futuro da Guiné-Bissau adiado para segunda volta
Domingos Simões Pereira e Umaro Sissoco Embaló disputam segunda volta das presidenciais na Guiné-Bissau, a 29 de dezembro. Balanço da primeira volta das eleições feito pela CPLP, CEDEAO e União Africana é positivo.
Foto: DW/B. Darame
Domingos Simões Pereira vs Umaro Sissoco Embaló
Domingos Simões Pereira foi o vencedor das presidenciais na Guiné-Bissau, no entanto, não alcançou a maioria necessária para assumir o poder. O candidato apoiado pelo PAIGC conseguiu 222.870 votos, o que representa 40,13% do eleitorado. Seguiu-se Umaro Sissoco Embaló, do MADEM-G15, com 153.530 votos, ou seja, 27,65%.
Foto: DW/B. Darame
Medalha de bronze para Nabiam
Em terceiro lugar ficou Nuno Nabiam, com 13,16% dos votos. Seguiu-se José Mário Vaz, com 12,41%, Carlos Gomes Júnior, com 2,66%, e Baciro Djá, com 1,28% do eleitorado. Vicente Fernandes conseguiu 0,77% dos votos, Mamadu Iaia Djaló 0,51%, Idriça Djaló 0,46% e Mutaro Intai Djabi 0,43% dos votos. Os candidatos que obtiveram os piores resultados foram Gabriel Fernando Indi e António Afonso Té.
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PAIGC pede apoio de APU e FREPASNA
Segue-se agora a segunda volta, marcada para 29 de dezembro. Domingos Simões Pereira, do PAIGC, já pediu o apoio aos partidos APU-PDGB e FREPASNA. DSP disse aceitar e respeitar os resultados eleitorais divulgados e deixou um recado a Sissoco Embaló: que na campanha para a segunda volta, não serão tolerados discursos de divisão dos guineenses: "serão atacados judicial e politicamente", disse.
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MADEM-G15 conta com apoiantes de Jomav
Por sua vez, Umaro Sissoco Embaló disse confiar na vitória na segunda e voltou a fazer acusações ao adversário Domingos Simões Pereira. "A Guiné-Bissau era um país laico e de concórdia nacional, Domingos Simões Pereira semeou o ódio e a divisão entre os guineenses". Embaló já havia anunciado, antes da primeira volta, que existia um acordo entre vários partidos contra DSP, em caso de segunda volta.
Foto: Privat
Grande derrotado
O antigo chefe de Estado da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, é já considerado o grande derrotado das presidenciais. Jomav, que concorreu como independente às eleições de 24 de novembro, ficou em quarto lugar na votação, atrás de Domingos Simões Pereira, Umaro Sissoco Embaló e Nuno Nabiam. O ex-Presidente conseguiu apenas 12,41% dos votos.
Foto: DW/B. Darame
Votação ordeira
A votação de 24 de novembro foi acompanhada por 23 observadores da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), 54 da União Africana, 60 da CEDEAO e 47 dos Estados Unidos da América. Todos elogiaram a "calma" e "serenidade" do processo.
Foto: picture-alliance/Xinhua News Agency
Votação "transparente"
Também a CNE deu nota positiva ao processo, dando conta de que não foram registados incidentes que possam comprometer a votação. Nestas eleições, nenhum dos 12 candidatos apresentou contestações ao processo de votação. Já na véspera das eleições presidenciais, Felisberta Moura Vaz, porta-voz da CNE, havia garantido à DW que o sistema eleitoral no país "é tão transparente que não permite fraude".
Foto: DW/B. Darame
Monitorização da sociedade civil
As eleições presidenciais, assim como aconteceu nas legislativas, voltaram a contar com o trabalho da Célula de Monitorização Eleitoral da Sociedade Civil. Após a votação, a plataforma deu nota positiva ao dia eleitoral, salientando que tudo "decorreu conforme o previsto". A rede contou com 422 observadores em todas as regiões da Guiné-Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Doze candidatos
Durante a campanha eleitoral, foram muitas as críticas feitas aos considerados fracos discursos e programas de governação apresentados. Em entrevista à DW, a Rede Nacional das Associações Juvenis considerou que alguns candidatos deixavam muito a desejar e que outros "confundem os poderes do Presidente da República com os do Executivo nas promessas eleitorais que fazem nos comícios".
Foto: DW/B. Darame
Jomav demite governo
A campanha para as presidenciais ficou marcada pela nomeação, por parte de José Mário Vaz, de um novo Governo liderado por Faustino Imbali, que foi recusado pela comunidade internacional, e que acabou por se demitir pouco tempo depois. O próprio Jomav disse-se desautorizado pelas forças de segurança, que não facilitaram a efetivação do decreto presidencial que ditou esta nomeação.