Guiné-Bissau: PAIGC demarca-se de sessão parlamentar
Maria João Pinto | Lusa
27 de junho de 2020
Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde diz que "atual estado de terror" no país "põe em causa, de forma séria e objetiva, a realização da sessão ordinária", convocada para segunda-feira, 29 de junho.
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Numa carta enviada na sexta-feira (26.06) ao presidente da Assembleia Nacional Popular (ANP), Cipriano Cassamá, a que a DW África teve acesso, o grupo parlamentar do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) afirma que procedeu "a uma profunda análise da situação política vigente no país" e conclui que "está posta em causa (...) a realização da sessão ordinária cujo início está marcado para 29 de junho". A sessão convocada pela comissão permanente da ANP é aguardada com grande expectativa, uma vez que deverá determinar quem tem a maioria no Parlamento, atualmente dividido em dois blocos que reivindicam o seu direito a formar Governo.
O PAIGC reitera que "desde a instalação do atual Governo inconstitucional e ilegal, regista-se uma profunda degradação do ambiente político e de segurança no país", lembrando o sequestro do deputado Marciano Indi, presidente do grupo parlamentar do APU-PDGB, em maio, e o rapto do dirigente do PAIGC Armando Correia Dias, em junho. O grupo parlamentar denuncia ainda detenções arbitrárias e raptos de militantes do PAIGC nos últimos dias "por parte de agentes do Ministério do Interior", incluindo a detenção de elementos do corpo de segurança do primeiro-ministro Aristides Gomes, em Bissau, "sem acusação formal".
O PAIGC afirma ainda que "neste momento, forças da ordem e militares estão a ser destacadas de forma seletiva para seguir e acompanhar deputados" e questiona "se a verdadeira missão é garantir a segurança (...) ou controlar os seus movimentos".
Coação e insegurança
Ao mesmo tempo, o grupo parlamentar afirma que "alguns deputados do PAIGC estão sendo impedidos de exercer a sua atividade política junto da sua bancada parlamentar (...) podendo, eventualmente, vir a participar na sessão plenária sob forte pressão psicológica, intimidação e coação".
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O partido critica ainda o que diz ser "a passividade total da comunidade internacional, em particular da CEDEAO [Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental], no tocante à garantia de segurança", que afirma condicionar o funcionamento normal da Assembleia Nacional.
Destacando "o atual estado de terror" que se vive na Guiné-Bissau, o grupo parlamentar do PAIGC afirma estar posta em causa a realização da sessão ordinária cujo início está marcado para 29 de junho e exige que sejam criadas as condições para que os deputados possam exercer "livremente as suas funções". Concluindo a carta, o grupo lembra ainda que a convocação da sessão plenária "ocorre num momento em que continua a vigorar o estado de emergência sanitária” devido à Covid-19 e destaca "a ausência do país de um número considerável de deputados".
Parlamento dividido
A Guiné-Bissau está a viver um período de especial tensão política, com o Parlamento dividido em dois blocos com ambos a reivindicarem a maioria parlamentar e a defenderem o seu direito de formar Governo. A crise política agudizou-se depois de não ter havido entendimento entre as várias partes para formar um Governo, até 22 de maio, que respeitasse os resultados das eleições legislativas de 2019, ganhas pelo PAIGC.
O prazo dado pela CEDEAO, que tem mediado a crise política no país, não foi respeitado, nem o de 18 de junho dado pelo chefe de Estado guineense, Umaro Sissoco Embaló.
O Presidente guineense, que admitiu dissolver o Parlamento caso não houvesse o entendimento entre as várias fações políticas, disse agora que vai esperar pela sessão plenária marcada para 29 de junho, onde será determinado quem tem a maioria parlamentar.
O dia das eleições legislativas na Guiné-Bissau
O pleito decorreu de uma forma ordeira, os observadores fizeram balanço positivo do ato eleitoral e o Presidente até chamou a Guiné-Bissau "campeã da liberdade". Acompanhe as eleições através das imagens da DW África!
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Longas filas no início do dia
As urnas abriram as 07h00 de domingo na Guiné-Bissau. Mais de 761 mil eleitores guineenses foram chamados às urnas para votarem nas eleições legislativas e escolherem, entre os candidatos de 21 partidos políticos, os novos representantes do parlamento do país.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
Três mil mesas em todo o país
Os eleitores puderam votar em mais de três mil mesas de voto distribuídas pelos 29 círculos eleitorais da Guiné-Bissau. A maior parte das mesas concentrou-se na capital, Bissau (foto). Antes de entregar os documentos para votar, os agentes eleitorais controlaram a identificação de cada eleitor.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
Guineenses esperam solução para crise
Há esperança que estas eleições legislativos de 2019 venham a solucionar a crise política que o país vive desde meados de 2015, após a demissão, pelo Presidente José Mário Vaz, do Governo liderado por Domingos Simões Pereira, vencedor das legislativas de 2014 com maioria absoluta. Ambos são do mesmo partido, o PAIGC, mas não conseguiram cooperar nos últimos anos.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
"Guiné-Bissau é campeã da liberdade"
Em declarações ao jornalistas, depois de votar, o Presidente guineense José Mário Vaz disse que as eleições ocorreram "sem mortos, sem espancamentos, sem prisões arbitrárias, sem golpes de Estado, sem prisioneiros políticos." O Chefe de Estado salientou que o pleito teve lugar num ambiente de "liberdade de manifestação, de expressão e de imprensa" e considerou a Guiné-Bissau "campeã da liberdade".
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Poucas queixas sobre a organização eleitoral
Agentes das brigadas de votação queixaram-se da falta de agentes de segurança em algumas mesas de voto e falam de uma baixa afluência nas regiões do interior do país. Houve queixas de alguns guineenses, que não conseguiram votar, porque possuíam cartão de eleitor, mas não tinham o seu nome nos cadernos eleitorais, feitos a partir de uma base informatizada.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Boas notas dos observadores
O Chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Africana, Rafael Branco (à esq.), deu nota positiva ao processo eleitoral. "As mesas de voto abriram a horas, nós estivemos lá. O processo de abertura correu sem qualquer incidente, as populações estavam lá à espera da sua vez para votar, num ambiente de tranquilidade", afirmou Rafael Branco à DW África.
Foto: DW/Nélio dos Santos
CPLP: "Exercício cívico exemplar"
A missão da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) disse que as eleições na Guiné-Bissau foram um "exercício cívico exemplar" que decorreu com a "maior tranquilidade e normalidade". A CPLP fez um balanço positivo do ato eleitoral sem registo de incidentes.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
Votação também no estrangeiro
Em Portugal, a votação na mesa de voto da Embaixada da Guiné-Bissau em Lisboa decorreu com normalidade. Registou-se apenas a reclamação de um eleitor que não conseguiu votar por não ter obtido o cartão de eleitor durante o recenseamento eleitoral. A mesa da Assembleia de Voto nº 1 teve como presidente Braima Seidi, que dirigiu uma equipa constituída por elementos de seis partidos políticos.
Foto: DW/J. Carlos
Contagem nos próximos dias
As urnas na Guiné-Bissau fecharam às 17h00 (hora local) de domingo. Ao longo dos próximos dias, os votos serão contados. A porta-voz da Comissão Nacional de Eleições (CNE), Felisberta Vaz, disse que os resultados oficiais provisórios serão conhecidos na terça-feira (12.03). As eleições legislativas foram impostas pela comunidade internacional após uma longa crise política desde 2015.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
Três partidos como favoritos
O favorito à vitória é o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Seguem-se, segundo analistas, o Partido da Renovação Social (PRS) e o Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15). O último foi formado por dissidentes que saíram do PAIGC após longas divergências entre as várias alas do antigo movimento de libertação.