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Guiné-Bissau: "PR acabou por reforçar a sua presença"

António Cascais
28 de janeiro de 2022

O politólogo Rui Jorge Semedo considera que Presidente da Guiné-Bissau colocou "de lado" o primeiro-ministro ao escolher os nomes para a remodelação governamental. Nuno Gomes Nabiam está no poder "de fachada", diz.

Paris | Guinea-Bissau's Präsident Umaro Sissoco Embalo
O Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco EmbalóFoto: AFP

Os novos membros do Governo da Guiné-Bissau tomaram posse, esta sexta-feira (28.01), na sequência de uma remodelação imposta pelo Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló.

O primeiro-ministro, Nuno Gomes Nabiam, mostrou concordar com a remodelação, apesar dos "desentendimento" iniciais. "Estão ultrapassadas as questões fundamentais. Houve algum desentendimento ou má interpretação, mas acabámos de ultrapassar aquilo que podia ser um problema e concordamos e agora é trabalhar para o bem do país", frisou Nuno Gomes Nabiam.

Dois partidos que sustentam o executivo, o Movimento para a Alternância Democrática (MADEM-G15) e a Assembleia do Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB), cujos membros foram nomeados, afirmam não concordar com a remodelação levada a cabo de forma "unilateral" pelo Chefe de Estado.

Em entrevista à DW África, o politólogo e analista político guineense Rui Jorge Semedo analisa o momento político na Guiné-Bissau.

Nuno Gomes Nabiam, primeiro-ministro da Guiné-BissauFoto: Braima Darame/DW

DW África: A APU-PDGB acusou o Presidente de ter tomado "decisões e violações unilaterais e sistemáticas", como é o caso da recente remodelação governamental, que não terá partido da iniciativa do primeiro-ministro Nuno Nabiam. Estas acusações têm razão de ser?

Rui Jorge Semedo (RJS): Acabei de assistir há pouco à posse dos novos nomeados. O primeiro-ministro, que concomitantemente também é presidente da APU-PDGB, entrou em contradição com a própria posição do partido e até assumiu que é normal o Presidente da República fazer essas nomeações sem passar por ele, ou seja, sem a proposta do próprio primeiro-ministro. Há muita confusão. Não dá para perceber em que pé estamos e como é que as pessoas procuram interpretar a função da República. Não sei se o primeiro-ministro, nessa sua prévia entrevista, estava a disfarçar ou se realmente é o que ele realmente pensa sobre essa postura do Presidente da República em promover uma remodelação sem dialogar sobretudo com os partidos que sustentam esse Governo.

DW África: Considera que Nuno Gomes Nabiam tem sido ultrapassado nas suas competências pelo Presidente da República? Tem sido humilhado politicamente?

RJS:  Acho que o Presidente da República acabou por colocar de lado o primeiro-ministro. O Presidente tem feito isso sistematicamente. Presidiu ao Conselho de Ministro onde acaba por retirar todo o protagonismo ao senhor primeiro-ministro. O Presidente da República assumiu essa competência do primeiro-ministro e ele, praticamente, está lá de fachada, mas não consegue assumir a sua competência institucional, não só para coordenar, mas também para liderar o executivo. Tanto que o Presidente da República disse isso, que este Governo é da sua competência e da sua iniciativa, portanto não são os partidos que agora governam que ganharam as eleições.

Rui Jorge Semedo, analista guineenseFoto: privat

DW África: Olhando para a lista dos novos ministros e secretários de Estado, quais serão os objetivos desta remodelação?

RJS: Na maioria dos casos, foi ‘trocar nove por seis’. Os ministros saíram de um pelouro e vão para o outro. O Presidente da República acabou por reforçar também a sua presença no Executivo. Tem pessoas ali que lhe são próximas, como por exemplo o ministro da Defesa, o ministro do Interior, o ministro das Finanças e a ministra dos Negócios Estrangeiros. Com esta remodelação, ele conseguiu fazer entrar mais duas pessoas próximas, que é Aristides da Silva, com o cargo dos Transportes, e a ministra da Justiça, que até então estava a ocupar o cargo de diretora nacional da Polícia Judiciária.

DW África: A ministra dos Negócios Estrangeiros, Suzy Barbosa, mantém-se, apesar de ter estado muito apagada nos últimos meses. Será que o Presidente pretende assumir o verdadeiro poder e influenciar todas as pastas?

RJS: Foi a promessa de campanha do Presidente da República. Ele já tinha dito que a pasta dos Negócios Estrangeiros estava sob sua alçada. Colocou uma pessoa próxima, a ministra Suzy Barbosa, e os dois estão a fazer o trabalho da diplomacia guineense. Mas a ministra faz tudo sob as orientações do Presidente da República e não do primeiro-ministro.

DW África: O Ministro do Interior, Botche Candé, parece ser o eterno ministro. Qual é o segredo da sua longevidade?

RJS: Ele é o típico homem político guineense: dissimulado, falso e também manifesta princípios de um regime de partido único. O Botche [Candé] recentemente afirmou que já trabalhou com todos os Presidentes da República da Guiné-Bissau. Trabalhou com Carlos Gomes, com Kumba Ialá, com Malam Bacai Sanhá, com o próprio Domingos Simões Pereira, com o Mário Vaz e agora está a trabalhar com o Sissoco. Ele encaixa muito bem nas regras do jogo e é isso que eles querem: amordaçar a democracia e restringir a liberdade de expressão, e depois manipular a própria sociedade. O Botche está a fazer isso, e muito bem, para roubar e para não fazer nada.

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