Liga Guineense dos Direitos Humanos critica "intervenção musculada" da polícia no sábado (08.04.) contra manifestantes que contestam longa crise política e o Presidente Jomav. ONG diz que foi uma intimidação ao cidadão.
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A polícia usou gás lacrimogéneo, bateu e deteve sete dos descontentes por algumas horas. A libertação só tera sido possível graças a intervenção da UNIOGBIS (gabinete integrado da ONU para consolidação da paz na Guiné-Bissau) e da Liga Guineense dos Direitos Humanos. A DW África entrevistou o presidente da Liga, Augusto Silva, sobre o sucedido:
DW África: Houve algum ato de vandalismo ou de violência que justificasse o uso de gás lacrimogéneo?
Augusto Silva (AS): Não houve nenhum ato de vandalismo e nem de perturbação da ordem pública que pudesse justificar o uso de gás lacrimogéneo. As pessoas estavam a manifestar-se de forma pacífica, convocaram uma vigília para o dia de sábado e estavam lá concentradas de forma pacífica sem praticar atos que pudessem por em causa a ordem pública. Nós achamos que a intervenção da polícia foi abusiva, que visava simplesmente restringir o exercício de um direito fundamental e essa restrição foi abusiva, sem qualquer fundamento legal. Nem as circunstâncias das manifestações justificavam uma intervenção musculada da polícia.
DW África: Esta nova postura da polícia guineense pode ser entendida como uma demonstração de força, ou até intimidação, por parte do Presidente Jomav e do Governo próximo a ele?
AS: Não me posso referir diretamente ao Presidente ou ao primeiro-ministro, mas reportando-se diretamente ao ato da polícia, eu acho que é uma forma de intimidar os cidadãos para se absterem de exercer um direito cívico, constitucionalmente consagrado e nós não podemos compactuar com comportamentos do género. A polícia não deve estar para nenhum regime, deve estar para proteger os cidadãos, para defender a segurança nacional e a ordem pública, independentemente de quem esteja no poder. Portanto, pensamos que a polícia deve conformar os seus atos com os princípios de Estado de direito, princípios constitucionais e legais que regulamentam e disciplinam a atuação de agentes da ordem pública.
DW África: O Movimento de Cidadãos Conscientes e Inconformados criticou a comunidade internacional por considerar que esta tem um comportamento passivo face a crise política que a Guiné-Bissau vive. Vê a situação da mesma maneira?
AS: Não, acho que a comunidade internacional tem dado apoio dentro das suas competências ao longo desta crise. A comunidade internacional privilegiou o diálogo e nós pensamos também que esse deve ser o caminho para a saída da crise. Agora, a nossa classe política é que tem de ganhar consciência que esta crise só pode ser ultrapassada não por via da força, mas pelo diálogo e colocarmos os interesses supremos da Guiné-Bissau e do povo acima de qualquer outro interesse.
DW África: Depois desta repressão a sociedade civil vai se deixar intimidar e parar de contestar a crise política?
AS: Não, pela experiência que tenho da sociedade civil e do povo guineense [não]. O povo guineense é por natureza resistente, não é com este comportamento dos agentes policiais que nós vamos deixar de exercer os nossos direitos cívicos e fundamentais, entre outros. A sociedade mantém-se firme e determinada em não deixar cair por terra as conquistas alcançadas até aqui. A liberdade de expressão e manifestação é uma conquista histórica do povo guineense.
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Guiné-Bissau: O país onde nenhum Presidente terminou o mandato
Desde que se tornou independente, a Guiné-Bissau viu sentar na cadeira presidencial quase uma dúzia de Presidentes - incluindo interinos e governos de transição. Conheça todas as caras que passaram pelo comando do país.
Foto: DW/B. Darame
Luís de Almeida Cabral (1973-1980)
Luís de Almeida Cabral foi um dos fundadores do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e também o primeiro Presidente da Guiné-Bissau - em 1973/4. Luís Cabral ocupou o cargo até 1980, data em que foi deposto por um golpe de Estado militar. O antigo contabilista faleceu, em 2009, vítima de doença prolongada.
Foto: Bundesarchiv/Bild183-T0111-320/Glaunsinger
João Bernardo Vieira (1980/1994/2005)
Mais conhecido por “Nino” Vieira, este é o político que mais anos soma no poder da Guiné-Bissau. Filiado no PAIGC desde os 21 anos, João Bernardo Vieira tornou-se primeiro-ministro em 1978, tendo sido com este cargo que derrubou, através de um golpe de Estado, em 1980, o governo de Cabral. "Nino" ganhou as eleições no país em 1994 e, posteriormente, em 2005. Foi assassinado quatro anos mais tarde.
Foto: picture-alliance/dpa/L. I. Relvas
Carmen Pereira (1984)
Em 1984, altura em que ocupava a presidência da Assembleia Nacional Popular, Carmen Pereira assumiu o "comando" da Guiné-Bissau, no entanto, apenas por três dias. Carmen Pereira, que foi a primeira e única mulher na presidência deste país, foi ainda ministra de Estado para os Assuntos Sociais (1990/1) e Vice-Primeira-Ministra da Guiné-Bissau até 1992. Faleceu em junho de 2016.
Foto: casacomum.org/Arquivo Amílcar Cabral
Ansumane Mané (1999)
Nascido na Gâmbia, Ansumane Mané foi quem iniciou o levantamento militar que viria a resultar, em maio de 1999, na demissão de João Bernardo Vieira como Presidente da República. Ansumane Mané foi assassinado um ano depois.
Foto: picture-alliance/dpa
Kumba Ialá (2000)
Kumba Ialá chega, em 2000, à presidência da Guiné-Bissau depois de nas eleições de 1994 ter sido derrotado por João Bernardo Vieira. O fundador do Partido para a Renovação Social (PRS) tomou posse a 17 de fevereiro, no entanto, também não conseguiu levar o seu mandato até ao fim, tendo sido levado a cabo no país, a 14 de setembro de 2003, mais um golpe militar. Faleceu em 2014.
Foto: AP
Veríssimo Seabra (2003)
O responsável pela queda do governo de Kumba Ialá foi o general Veríssimo Correia Seabra, Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas. Filiado no PAIGC desde os 16 anos, Correia Seabra acusou Ialá de abuso de poder, prisões arbitrárias e fraude eleitoral no período de recenseamento. O general Veríssimo Correia Seabra viria a ser assassinado em outubro de 2004.
Foto: picture-alliance/dpa/R. Bordalo
Henrique Rosa (2003)
Seguiu-se o governo civil provisório comandado por Henrique Rosa que vigorou de 28 de setembro de 2003 até 1 de outubro de 2005. O empresário, nascido em 1946, conduziu o país até às eleições presidenciais de 2005 que deram, mais uma vez, a vitória a “Nino” Vieira. O guineense faleceu, em 2013, aos 66 anos, no Hospital de São João, no Porto.
Foto: AP
Raimundo Pereira (2009/2012)
A 2 de março de 2009, dia da morte de Nino Vieira, o exército declarou Raimundo Pereira como Presidente da Assembleia Nacional do Povo da Guiné-Bissau. Raimundo Pereira viria a assumir de novo a presidência interina da Guiné-Bissau, a 9 de janeiro de 2012, aquando da morte de Malam Bacai Sanhá.
Foto: AP
Malam Bacai Sanhá (1999/2009)
Em julho de 2009, Bacai Sanhá foi eleito presidente da Guiné Bissau pelo PAIGC. No entanto, a saúde viria a passar-lhe uma rasteira, tendo falecido, em Paris, no inicio do ano de 2012. Depois de dirigir a Assembleia Nacional de 1994 a 1998, Bacai Sanhá ocupou também o cargo de Presidente interino do seu país de maio de 1999 a fevereiro de 2000.
Foto: dapd
Manuel Serifo Nhamadjo (2012)
Militante do PAIGC desde 1975, Serifo Nhamadjo assumiu o cargo de Presidente de transição a 11 de maio de 2012, depois do golpe de Estado levado a cabo a 12 de abril de 2012. Este período de transição terminou com as eleições de 2014, que foram vencidas por José Mário Vaz. A posse de “Jomav” como Presidente marcou o regresso do país à ordem constitucional no dia 26 de junho de 2014.