Guiné-Bissau: Silêncio do primeiro-ministro agudiza a crise
11 de junho de 2021Nuno Nabiam quebrou o silêncio. Depois de circularem no país rumores de que teria sido envenenado, o primeiro-ministro falou à imprensa esta sexta-feira (11.06), no regresso a Bissau de uma viagem oficial à Rússia.
"Infelizmente temos um país que é muito complicado. Pensamos que as autoridades [judiciais] devem atuar para chamar alguém que se pronunciou sobre isso, porque é um caso que corre o mundo."
Nabiam explicou que teve que desligar o telemóvel devido às inúmeras chamadas de familiares e amigos que tentaram obter dele informações concretas.
O governante continuou, no entanto, a recusar-se a prestar declarações sobre a atualidade política e social do país. Esta reticência preocupa vários observadores políticos guineenses, num momento em que a Guiné-Bissau vive uma das maiores crises sociais da sua história, devido a uma greve na administração pública, que já dura há seis meses, com as escolas públicas fechadas e os hospitais a funcionarem a meio gás.
Nabiam cúmplice?
O primeiro-ministro também não comentou os espancamentos de cidadãos nos últimos meses e continua em silêncio sobre as acusações de "interferências" por parte do Presidente Umaro Sissoco Embaló nos assuntos de governação.
Recentemente, o chefe de Estado exonerou membros das estruturas governamentais sem informar Nabiam.
O analista político Luís Peti diz que o silêncio de Nabiam é um indício para a sua responsabilidade direta por aquilo que corre mal no país. "O primeiro-ministro não fez nada em relação às negociações sobre as greves com as centrais sindicais. Acrescem outras situações que têm acontecido, e as violações dos direitos humanos, sobre as quais o primeiro-ministro também não diz nada. Por isso eu digo com toda a firmeza que há uma cumplicidade dele quanto a isto", afirmou Peti à DW África.
Embora Umaro Sissoco Embaló tenha garantido que não tenciona exonerar Nuno Nabiam, observadores alegam haver um mal-estar entre o primeiro-ministro e o Presidente da República. Este dataria de um confronto entre ambos durante uma sessão do Conselho de Ministros, que o chefe do Governo abandonou a meio. Nabiam não confirma nem nega as alegações.
Para o professor universitário Miguel Gama, o silêncio de Nabiam é sinal de que o primeiro-ministro não está à altura das funções que desempenha.
"Um primeiro-ministro que não reage às várias situações que afetam a sua governação, às várias situações que o país atravessa, mostra que não está comprometido com este povo e está aquém das expetativas", disse Gama à DW África.
Urge o diálogo
Os guineenses não estão apenas agastados pela longa greve da União Nacional dos Trabalhadores da Guiné (UNTG). Também a fraca comercialização da castanha de cajú agrava a crise social e a vida da população dependente do cultivo e da venda do produto.
A DW África tentou, sem sucesso, ouvir o primeiro-ministro sobre este e outros assuntos.
Luís Peti acha que Nabiam ainda vai a tempo de não deixar descarrilar a situação: "Nuno Nabiam pode emitir uma opinião política, para, pelo menos, procurar soluções políticas e governativas para os problemas sociais que têm acontecido. O primeiro-ministro pode ainda mudar o curso da situação, desde que assuma os seus poderes constitucionais e tenha algum posicionamento político e administrativo sobre os assuntos da governação."
Guero Gomes, coordenador da Casa dos Direitos, um consórcio das organizações da sociedade civil guineense, defende que a solução está no diálogo sério e franco. "Urge que sejam criadas as condições propícias para que haja um diálogo entre os diferentes atores políticos, sobretudo com o apadrinhamento da sociedade civil e demais entidades parceiras da Guiné-Bissau", disse Gomes à DW África.
Responsabilizar a CEDEAO?
O analista político Rui Landim considera que a Guiné-Bissau está em descalabro e não acredita que o país consiga resolver sozinho os seus problemas:
"É chegado o ponto da comunidade internacional perceber que o país vai para o abismo, bater a mão na mesa e dizer: 'não!'". Landim aponta a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) como primeiro interlocutor para apurar responsabilidades. "É chegado o momento de fazer com que haja o cumprimento rigoroso da Constituição da Guiné-Bissau", afirma o analista.
Nuno Nabiam, líder da Assembleia do Povo Unido-Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU-PDGB), chefia o Governo, em coligação com o Partido da Renovação Social (PRS) e o Movimento para Alternância Democrática (MADEM-G15). O Governo foi constituído após a demissão do Executivo do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), a maior força política do país.