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Guiné-Bissau: PR em busca de um Parlamento "mais submisso"

António Cascais
16 de maio de 2022

A dissolução do Parlamento é "mais um retrocesso" na democracia guineense, segundo o analista Rui Jorge Semedo. Agora, o Presidente da República "vai reforçar a sua presença no Executivo" para impor a sua agenda.

Paris | Guinea-Bissau's Präsident Umaro Sissoco Embalo
Foto: AFP

No dia em que o Presidente da República (PR) da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, dissolveu o Parlamento e marcou eleições legislativas para 18 de dezembro, surgiram muitas e severas críticas, sobretudo porque o país ficará durante mais de oito meses sem Parlamento constituído.

O que é que isto significa para a democracia da Guiné-Bissau? Em entrevista à DW África, o sociólogo e analista político guineense Rui Jorge Semedo lamenta "mais um retrocesso" no país e acusa Sissoco Embaló de afastar os parlamentares do cenário político em busca de uma configuração "ainda mais submissa à sua agenda".

DW África: Poderá o PR agora governar o país, sem controlo parlamentar, durante 8 meses, pelo menos? Que repercussões terá isso para a democracia da Guiné-Bissau?

Rui Jorge Semedo (RJS): É mais um retrocesso. Isso foi a consequência de uma relação promíscua e submissa que o Parlamento manteve sempre com a Presidência da República. O que está a acontecer neste momento é que há uma dificuldade, uma resistência - a posteriori - do Parlamento relativamente às investidas do senhor Presidente da República. Começou com a denúncia do acordo secreto assinado com o Senegal, depois a situação da revisão constitucional, em que o Parlamento continua a fincar os pés, porque é a sua competência constitucional, e, por último, a questão da retirada, ou não, da imunidade parlamentar ao líder do PAIGC. Há outra situação que ainda não veio à tona que é o mal-estar entre a bancada do MADEM-G15 e o próprio PR. Isso foi dito, em parte, pelo representante do MADEM, que esteve na semana passada na audiência com o PR para discutir a dissolução do Parlamento.

Rui Jorge SemedoFoto: privat

DW África: Insisto na pergunta sobre os oito meses que faltam para a realização de novas eleições. Não será demasiado tempo sem Parlamento constituído?

RJS: Relativamente ao tempo, há muito que a Guiné-Bissau não está a cumprir com os ditames constitucionais. Isso é mais uma dificuldade de interpretação das leis e ainda vai correr muita tinta, mas certamente que esta decisão não será alterada, de forma alguma. Com isso, o Presidente vai também ganhar tempo, pelo menos, para influenciar alguma configuração favorável no Parlamento na próxima legislatura que possa contribuir para a sua agenda - cuja passagem no Parlamento ele não conseguiu influenciar. O grande desafio agora é ter uma configuração que continue ainda mais submissa à agenda do PR.

DW África: O PR decidiu manter Nuno Nabiam à frente do Governo, como primeiro-ministro. Quem é que vai governar, de facto, a Guiné-Bissau nos próximos tempos?

RJS: O PR, numa das suas declarações, havia informado que o Governo que foi agora deposto, que caiu com a dissolução do Parlamento, era o Governo do Presidente, não era de nenhum partido que estava na base. Agora, ele vai reforçar a sua presença no Executivo ou talvez essa aliança continue a ser necessária para poder dar um certo equilíbrio, uma certa estabilidade às agendas em curso.

DW África: Tudo isto acontece nas vésperas da chegada de um número grande de soldados do contingente de estabilização da CEDEAO. O que é que isto significa?

RJS: Tem tudo a ver com a assinatura do acordo secreto entre Umaro Sissoco Embaló e Macky Sall [Presidente do Senegal], com a revisão constitucional que a CEDEAO quer impor à Guiné-Bissau a todo o custo, com a criação de um regime presidencialista no país, e o Parlamento estava na contramão dessa agenda. A única forma de facilitar tudo isso é retirar os parlamentares do cenário político e forjar uma nova configuração que poderá vir a corresponder àquilo a que estamos a assistir.

DW África: Será que o Presidente Umaro Sissoco Embaló, com a chegada dos soldados da CEDEAO, se sente mais bem preparado para tomar os passos que tomou?

RJS: Isso é previsível. Não é nada mais, nada menos que a atribuição de um certificado de incompetência às nossas Forças Armadas. Aproveitou o caso de 1 de fevereiro para forjar todo esse teatro.

Reflexões Africanas: As ameaças à democracia da Guiné-Bissau

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