Guiné-Bissau: Presidente tem "esquadrão de repressão" - ONG
Lusa
12 de outubro de 2020
O presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, Augusto Mário Silva, acusou esta segunda-feira o Presidente da Guiné-Bissau de adotar a "implantação do terror" para limitar a liberdade de expressão dos cidadãos.
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O presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, Augusto Mário Silva, acusou esta segunda-feira (12.10) Umaro Sissoco Embaló de defender a violência ao afirmar: "Quem não se cuidar, alguém há de cuidar dele".
Mário Silva vai ainda mais longe e acusa o Presidente da Guiné-Bissau de criar um "esquadrão de repressão" para implantar o terror e limitar a liberdade dos cidadãos: "O Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, tem adotado, como método do seu consulado, a implantação de terror para controlar a mente e liberdade de expressão dos cidadãos", afirmou.
"Para a materialização desta sua intenção maléfica emergiu em Bissau um esquadrão de repressão cuja referência moral é supostamente o senhor Umaro Sissoco Embaló, que, com a bênção deste, anda a espalhar terror em tudo quanto é sítio", salientou.
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O que está em causa?
Pandemia tornou-se justificação para atacar jornalistas
01:59
O presidente da Liga falava em conferência de imprensa realizada na Casa dos Direitos, em Bissau, onde dois ativistas do Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15, partido político no Governo e o partido do Presidente) acusaram alegados membros elementos do batalhão da Presidência de os terem espancado na Presidência da República.
Os dois ativistas, Carlos Sambú e Queba Sani (Kelly), especificaram que foram raptados no bairro da Ajuda, na capital guineense, por um militar e por Tcherno Bari, mais conhecido por 'Tcherninho', da segurança do chefe de Estado, Umaro Sissoco Embaló.
O Madem-G15 já condenou o ataque aos dois ativistas. Também o primeiro-ministro guineense, Nuno Nabian, afirmou no sábado (10.10) que ninguém está acima da lei no país, nem o próprio, nem o Presidente do país, e que os autores dos alegados espancamentos de dois ativistas políticos serão levados à Justiça.
O chefe de Estado guineense já tinha lamentado o sucedido aos dois ativistas. Em declarações em Lisboa, no aeroporto Osvaldo Vieira, após ter regressado da sua visita oficial a Portugal, Umaro Sissoco Embaló disse que os dois eram como filhos e que os iria receber em Bissau.
Liga nega agenda
Em reação às declarações de Sissoco Embaló, que acusou a Liga Guineense dos Direitos Humanos de ser parcial, Augosto Mário Silva recorda que a Liga "foi a primeira organização a denunciar o rapto do deputado Marciano Indi". Nota ainda que, no caso do Armando Dias, dirigente do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), a intervenção da Liga permitiu que tivesse acesso a um advogado e medicamentos.
"Queremos garantir ao senhor Presidente que a Liga Guineense dos Direitos Humanos não tem uma agenda seletiva na sua luta pela consolidação do Estado de Direito democrático. Nunca o teve e nem nunca o terá", salientou.
Na declaração à imprensa, a organização não-governamental de defesa dos Direitos Humanos aconselhou também o chefe de Estado a ter uma "conduta republicana digna das funções que ocupa, evitando deste modo proferir declarações que instiguem à violência e ao ódio".
"Esquadrão do terror" na Presidência
A Liga Guineense dos Direitos Humanos relembrou ainda ao Presidente que os vários casos de ataques contra ativistas políticos e jornalistas que têm acontecido no país "evidenciam fortes indícios de que teriam sido materializados por homens do tal esquadrão de terror que conta com o beneplácito do Presidente".
Augusto Mário Silva sublinhou que a Liga tem de condenar "tanta barbárie", que "visa criar um clima de terror e de medo generalizado" e que é um "retrocesso nas várias décadas de conquista" de um Estado de Direito.
A Liga disse também que na República da Guiné-Bissau "ninguém está acima da lei" e que todos os cidadãos têm o direito de "recorrer aos órgãos jurisdicionais para garantir a responsabilização do infrator".
Augusto Mário Silva deixou também críticas ao Ministério do Interior, que, em vez de proteger os cidadãos, passou a ser "símbolo de tortura e de repositório de cidadãos sequestrados".
Países africanos que mais violam a liberdade de imprensa
Gana é o país africano mais bem classificado no "<i>Ranking</i> Mundial da Liberdade de Imprensa" dos Repórteres sem Fronteiras. A Eritreia é o pior em África e, a nível mundial, só é melhor que a Coreia do Norte.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
Eritreia - posição 179º lugar
A liberdade de imprensa é considerada "não existente". Em 2001, uma série de medidas repressivas contra <i>media</i> independentes levaram a uma onda de detenções. O Presidente Isaias Afeworki é visto como um “predador” da liberdade de imprensa e usa os meios de comunicação nacionais como seus porta-vozes. Escritores, locutores e artistas são censurados e a informação é escondida dos cidadãos.
Foto: picture-alliance
Sudão - 174º lugar
Na capital Cartum, pratica-se a chamada “censura pré-publicação". O Governo detém jornalistas arbitrariamente e interfere abertamente na produção de notícias. A "Lei da Liberdade de Informação de 2015" é vista como uma outra forma de exercer controlo governamental sobre a informação pública. Os jornalistas têm de passar por um teste e obter uma permissão para trabalhar.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Burundi - 159º lugar
Repressão estatal contra a liberdade de imprensa e intimidação de jornalistas é comum no país. <i>Media </i> controlados pelo Estado substituem cada vez mais estações de rádio independentes, depois de a maior parte delas ter sido forçada a fechar, após uma tentativa de golpe de estado há três anos. Centenas de jornalistas fugiram do país desde 2015. Na foto, protesto de jornalistas no país.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
República Democrática do Congo - 154º lugar
Defensores dos <i>media</i> falam em jornalistas mortos, agredidos, detidos e ameaçados desde que Joseph Kabila sucedeu ao pai na presidência do país em 2001. Orgãos de comunicação internacionais queixam-se que o Governo interfere nos sinais de rádio ou corta mesmo a transmissão. Protestos da oposição levaram as autoridades a interromper ou cortar o acesso à Internet.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Suazilândia - 152º lugar
Esta monarquia absoluta tem a reputação de obstruir o acesso à informação e impedir os jornalistas de fazerem o seu trabalho. Os <i>media</i> estão sujeitos a leis restritivas e repórteres são frequentemente chamados a tribunal pelo seu trabalho. Auto-censura é comum. Um editor saiu recentemente do país depois de fazer uma reportagem sobre negócios obscuros ligados ao Rei Mswati III (na foto).
Foto: picture-alliance/dpa
Etiópia - 150º lugar
O Governo tem uma mordaça sobre os órgãos de comunicação e os jornalistas trabalham sobre condições muito restritivas. Com a Eritreia, este país tem uma das mais altas taxas de jornalistas detidos na África subsariana. Na foto, o jornalista etíope Getachew Shiferaw, que foi condenado a 18 meses de prisão por ter falado com um dissidente.
Foto: Blue Party Ethiopia
Sudão do Sul - 144º lugar
Os jornalistas são obrigados pelo Governo a evitar fazer cobertura do conflito. Órgãos de comunicação internacionais denuciaram casos de assédio e foram banidos deste jovem país, onde pelo menos 10 jornalistas foram mortos desde 2011. Na foto, dois jornalistas do Uganda que tinham sido detidos por autoridades no Sudão do Sul.
Foto: Getty Images/AFP/W. Wudu
Camarões - 129º lugar
O Governo chamou às redes sociais uma “nova forma de terrorismo”, e bloqueia frequentemente o acesso às mesmas. Emissões de rádio e televisão foram bloqueadas duas semanas em março, durante o período eleitoral. Jornais que publicam conteúdos que desagradam políticos no poder são banidos e jornalistas e editores são detidos.
Foto: picture alliance/abaca/E. Blondet
Chade - 123º lugar
Os jornalistas arriscam-se a detenções arbitrárias, agressões e intimidações. Nos últimos meses, o Governo tem vindo a reprimir plataformas de <i>social media</i> e ciber-ativistas. A Internet tem estado bloqueada no país desde 28 de março, no seguimento de um “apagão” da Internet devido a manifestações da sociedade civil e protestos dos órgãos de comunicação num chamado “dia sem imprensa”.
Foto: UImago/Xinhua/C. Yichen
Tanzânia - 93º lugar
Críticos dizem que o Presidente John Magufuli tem vindo a atacar a liberdade de expressão deliberadamente, desde que tomou posse em 2015. Jornalistas foram presos ou dados como desaparecidos. Orgãos de comunicação social foram fechados ou impedidos de publicar durante longos períodos de tempo. Leis que podem ser usadas contra os <i>media</i> foram apertadas.