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Guiné-Bissau: Um ano após o "golpe" ainda não se fez justiça

Iancuba Dansó (Bissau) | Lusa
1 de fevereiro de 2023

Um ano depois da tentativa de golpe de Estado na Guiné-Bissau, analistas consideram que ainda há muito por explicar e denunciam "irregularidades" no processo judicial sobre o que aconteceu a 1 de fevereiro de 2022.

Guinea-Bissau | Präsident Umaro Sissoco Embalo mit Militär
Foto: Iancuba Danso/DW

Faz esta quarta-feira (01.02) um ano que homens armados atacaram o Presidente guineense e membros do Executivo, no Palácio do Governo, a sede do Executivo guineense, em Bissau. 

12 meses depois do caso "1 de fevereiro", considerado pelas autoridades guineenses uma tentativa de golpe de Estado, aguarda-se esclarecimentos sobre as circunstâncias do sucedido, que provocou 11 mortos e várias detenções. 

Em dezembro passado, foi adiado o início do  julgamento  de vários suspeitos, entre militares e civis, devido às obras de reabilitação das vias que dão acesso ao Tribunal Regional de Bissau, lugar onde deveria decorrer a sessão.

Em declarações à DW África, o jurista Fodé Mané elenca um conjunto de alegadas irregularidades neste caso, começando por lembrar que a lei guineense prevê seis meses para que se faça a investigação e acusação, sob pena de o processo ficar arquivado.

"Não se fez a investigação de uma forma que convença as pessoas e, por isso, não se fez o julgamento", aponta.

Mais grave, continua o jurista, "é que o Ministério Público mandou que fosse mudada a medida de prisão que tinha sido aplicada [aos suspeitos] para o pagamento de caução ou a apresentação periódica, [mas] isso não se verificou". 

Violência e "sequestro"

No dia 1 de fevereiro 2022, a sede do Governo guineense foi alvo de um ataque armado Foto: AFPTV TEAMS/AFP/Getty Images

Apesar de haver decisões judiciais a ordenar a libertação de alguns detidos, cerca de três dezenas de pessoas, entre militares e civis, estão na prisão há um ano, acusados de participar no assalto ao Palácio do Governo, em fevereiro de 2022.

Em conferência de imprensa na Casa dos Direitos, em Bissau, o presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, Augusto Mário Silva, voltou hoje a exigir a libertação de 17 destes detidos e reafirmou a condenação de qualquer ato de violência: "Os cidadãos guineenses precisam de saber o que efetivamente se passou, quem são os responsáveis por estes atos e que as pessoas sejam efetivamente responsabilizada."

Contactado pela DW África, o advogado de 23 detidos em conexão com o caso, Marcelino Intupe, preferiu não prestar declarações. Intupe denunciou, em dezembro, que foi espancado na sua residência dias antes do início do julgamento, que viria ser adiado.

Para Victor Imbana, representante judicial de um dos detidos, o seu constituinte está "sequestrado".

"Lamentável é que o meu constituinte não foi acusado, por isso, no julgamento que se marcou [para 6 de dezembro de 2022] não se fez representar, porque simplesmente, no cumprimento das formalidades, o tribunal não podia notificar nem os advogados nem ele, porque não faz parte das pessoas acusadas", argumenta, em entrevista à DW.

"Mas lamentavelmente continua nas celas", continua. "Tudo enquanto [defesa] nós fizemos, porque na circunstância em concreto nós estamos perante um sequestro".

Três feridos no ataque a rádio privada em Bissau

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Para o jornalista Armando Lona, não há vontade política para que se faça justiça no "caso 1 de fevereiro": "Aconteceu um ato em que morreram onze pessoas e deveria fazer-se algo para apurar a verdade, mas parece-me que o atual regime pouco tem feito para se conhecer a verdade, porque para ter justiça é preciso vontade, sobretudo vontade política, mas não me parece que [seja o caso]". 

Advogados, familiares e organizações dos direitos humanos denunciaram as alegadas condições precárias nas celas, onde os suspeitos continuam detidos. 

Em comunicado, o Governo guineense lembrou hoje as 11 vítimas mortais registadas no ataque: "Hoje, o Governo da Guiné-Bissau relembra a memória das vítimas deste bárbaro atentado e manifesta a sua solidariedade para com as famílias dos jovens heróis tombados na defesa da pátria e da democracia."

"Tratou-se de um ato hediondo a mando de terceiros que atentaram contra a democracia e a mudança, pretendendo subverter a vontade popular expressa nas urnas", salienta-se no comunicado divulgado na rede social Facebook.

Comunidade internacional "não está" preocupada

O jurista Fodé Mané não acredita que este caso se resolva agora, alegando que "há um conformismo perante esta situação, principalmente dos órgãos judiciais, de alguns setores da sociedade civil, que saíram como quem está a advogar a favor do poder".

O jurista guineense diz ainda que a grande maioria da comunidade internacional "não faz constar na sua agenda a questão da liberdade, dos direitos fundamentais e dos direitos humanos" na Guiné-Bissau.

Apesar de as autoridades considerarem que o país está agora mais estável, o jornalista Armando Lona deixa um alerta: "Enquanto reina a impunidade, como tem sido o caso da Guiné-Bissau, estamos a criar condições para que se reproduzam novos eventos, que infelizmente não são agradáveis para o país".

No dia 1 de fevereiro do ano passado, um grupo de homens armados assaltou o Palácio do Governo, onde decorria a reunião do Conselho de Ministros, presidida pelo Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, resultando em onze mortos. Na sequência, a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) destacou as suas forças militares para "garantir a estabilidade" na Guiné-Bissau. 

"Suspeitos de narcotráfico" por trás da tentativa de golpe

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