Guiné-Bissau: voto sectário foi determinante nas eleições
14 de março de 2019
Avaliação é do analista político Rui Landim. Para ele, a vitória do PAIGC e a indicação de Domingos Simões Pereira para primeiro-ministro são um recado da população guineense para o Presidente José Mário Vaz.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
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O politólogo guineense Rui Landim considera que o voto sectário foi determinante para a nova configuração do Parlamento da Guiné-Bissau, que com os resultados provisórios, passa a ter seis partidos com assento parlamentar. Um a mais do que na última legislatura.
"Não podemos negar que o voto sectário é que explica esta nova recomposição, que não é estranha às mensagens de divisão e de suscitar medo a uma certa comunidade. O grave foi a rejeição do outro pelo simples facto de não pertencer a sua comunidade e é um perigo para a democracia e coesão nacional. Na calada da noite, vê-se candidatos a instrumentalizar votos étnicos e religiosos”, analisa.
Mudanças no Parlamento
O novo Parlamento terá as estreias de MADEM-G15, que relegou o PRS para a terceira força política mais votada, e de APU-PDGB, partido liderado por Nuno Gomes Nabian, candidato derrotado por José Mário Vaz nas presidenciais de 2014. APU-PDGB é a quarta força que arrecadou mais votos, elegendo cinco deputados.
Guiné-Bissau: voto sectário foi determinante nas eleições
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Assim sendo, Rui Landim fala de uma das eleições legislativas mais concorridas da história da Guiné-Bissau:
"Há uma grande clivagem na classe política que não tem a ver com projetos políticos, mas sim pessoais. O PAIGC tem uma maioria larga, que não significa confortável para governar. A diferença entre o primeiro lugar [PAIGC] e o segundo é expressiva: são 20 deputados a mais e com o terceiro são 26 mandatos. Mas devido a essa lutas pessoais, houve essa dispersão de votos”, avalia.
Desde as primeiras eleições realizadas na Guiné-Bissau esta foi a primeira vez que o PRS cai para a terceira posição no Parlamento. Contas feitas, a coligação PAIGC, APU-PDGB, UM e PND terão 54 deputados. Porém, isso será uma garantia para a estabilidade parlamentar e governativa do país?
"Estamos num país imprevisível. Mas em condições normais, há um ambiente favorável para a estabilização das instituições, com a aliança formada por esses partidos com suporte parlamentar confortável para aprovar programas políticos de governos. Agora, terá que reunir consensos para conseguir as revisões das leis que todos concordam ser necessário”.
Presidente em situação delicada
Com a divulgação dos resultados provisórios, Domingos Simões Pereira, presidente do PAIGC, será indicado como novo primeiro-ministro e vai reencontrar no palácio da República um Presidente que o demitiu em 2015 e que acusou o seu governo de atos de corrupção, nepotismo, entre outros. Rui Landim entende que, após os resultados das eleições de domingo, José Mário Vaz se encontra numa situação delicada e complicada.
José Mário VazFoto: Getty Images/AFP/Seyllou
"Em democracia, o povo é que manda. Esse povo desautorizou o Presidente da República. O povo sancionou, censurou e colocou-o perante a situação em que o povo diz tem que nomear este, porque nós escolhemos este e em democracia, nós, o povo, é que deitamos as regras. A situação ainda é mais complexa para o Presidente, porque estamos a menos de 80, 90 dias para eleições presidenciais. Ele não tem mãos livres para atuar porque está numa situação de candidato. Não é um Presidente no início do mandato, mas sim, no fim”.
À DW ÁFRICA, Rui Landim, considerou que a eleição do PAIGC é a forma encontrada pelo eleitor guineense de atribuir toda a responsabilidade pela crise política que começou em 2015, com a demissão do Governo de Domingos Simões Pereira, ao Presidente guineense, José Mário Vaz.
Recorde-se que de acordo com os resultados provisórios, o Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) alcançou 47 mandatos, o MADEM, 27, o Partido da Renovação Social (PRS), 21, a Assembleia do Povo Unido - Partido Democrático da Guiné-Bissau (APU/PDGB), 5, a União para Mudança (UM) e o Partido da Nova Democracia (PND), ambos com um deputado cada.
A lei eleitoral guineense prevê que os resultados oficial e definitivos sejam publicados entre sete a dez dias após a votação.
Farpas e elogios: Frases das eleições na Guiné-Bissau
Principais partidos políticos, sociedade civil e comunidade internacional acompanham de perto contagem de votos na Guiné-Bissau. CNE só divulga resultados na quarta-feira (13.03), mas PAIGC já canta vitória.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
PAIGC
O PAIGC declarou-se, na segunda-feira (11.03), vencedor das eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau. O porta-voz do partido João Bernardo Vieira garantiu que o povo conferiu ao PAIGC os destinos do país. No domingo, após votar, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse que estas eleições representam "um momento de viragem" para que, na Guiné-Bissau, "o império da lei vingue".
Foto: DW/F. Tchumá
MADEM-G15
Após o anúncio do PAIGC, o Movimento para a Alternância Democrática frisou que ninguém ganhou as eleições com maioria absoluta e que também fará parte do próximo Governo do país. As declarações de Braima Camará no domingo, dia das eleições, foram das mais críticas, pois o líder do MADEM-G15 acusou o primeiro-ministro de "usar dinheiro público para corromper líderes de opinião no dia de reflexão".
Foto: DW/J. Carlos
PRS
O Partido da Renovação Social disse, esta terça-feira, que "é falsa a informação da maioria folgada que o PAIGC sustenta para semear a confusão"."Nenhuma das forças políticas atingiu sequer a barra dos 40 deputados", disse Vítor Pereira. No domingo, depois de votar, Alberto Nambeia, líder do PRS, disse que esta votação constitui um "balão de oxigénio" para o povo, que quer mudanças no país.
Foto: DW/B. Darame
FREPASNA
Baciro Djá considera que era o candidato com mais experiência nestas eleições e, por isso, o justo vencedor. No entanto, esta segunda-feira, o líder do partido Frente Patriótica para a Salvação Nacional (FREPASNA) foi o primeiro a reconhecer a derrota no pleito. "Consideramos que o nosso resultado foi péssimo e a responsabilidade máxima é minha, enquanto presidente do partido", disse.
Foto: Presidency of Guinea-Bissau
Comissão Nacional de Eleições (CNE)
Pouco depois do arranque do pleito, no domingo, José Pedro Sambú, presidente da CNE, disse aos jornalistas que o processo estava a decorrer num "clima de transparência e sem sobressaltos". O mesmo cenário foi reportado pela porta-voz da comissão, ao final do dia. Felizberta Vaz garantiu ainda que os "pequenos problemas" que surgiram foram resolvidos. A CNE divulga os resultados esta quarta-feira.
Foto: CNE
Presidente da República
Em declarações aos jornalistas, depois de votar, no domingo, José Mário Vaz garantiu que os observadores estavam "surpresos" pela positiva com a Guiné-Bissau. O Presidente guineense pediu à imprensa para que passasse lá para fora essa "grande imagem" da Guiné-Bissau como um país onde "não há problemas". "Considero a Guiné-Bissau hoje campeã da liberdade", disse.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Primeiro-ministro guineense
Também no domingo, o primeiro-ministro guineense disse estar emocionado com a concretização de um processo eleitoral "difícil e intenso", no qual foi "necessária a intervenção da comunidade internacional". Aristides Gomes acrescentou ainda que, apesar das dificuldades, este foi um processo cheio de "pedagogia".
Foto: Präsidentschaft von Guinea-Bissau
Organização das Nações Unidas
David McLachlan-Karr, enviado das Nações Unidas à Guiné-Bissau, tem estado a reportar, com frequência, o ambiente vivido no país nestas eleições, nas redes sociais. Esta segunda-feira, o representante da ONU deu os parabéns à população guineense que, "em todo o país, saiu [às ruas] para votar pacificamente e com muito orgulho cívico".
Foto: DW/B. Darame
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Também a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), na pessoa de Luiz Villarinho Pedroso, acompanhou de perto a votação. No domingo, dia da eleição, o chefe da missão da CPLP disse que estas eleições foram um "exercício cívico exemplar", que decorreu com a "maior tranquilidade e normalidade". O balanço preliminar do escrutínio será feito ao longo desta terça-feira (12.03).
Foto: DW/N. dos Santos
CEDEAO
À semelhança da ONU e da CPLP, também a CEDEAO deu nota positiva às eleições guineenses. Numa conferência de imprensa, esta segunda-feira (11.03), Kadré Désiré Ouedraogo, chefe da Missão de Observação da CEDEAO, disse que as legislativas no país decorreram "de forma pacífica e transparente". Acrescentou ainda que espera que "todos [os partidos] aceitem os resultados".
Foto: DW/B. Darame
União Africana
Após o encerramento das urnas na Guiné-Bissau, Rafael Branco, chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Africana destacou a forma tranquila com que decorreu o processo e salientou a "participação cívica notável".
Foto: DW/Nélio dos Santos
Liga Guineense dos Direitos Humanos
Também as organizações locais fizeram chegar elogios. À semelhança do que foi dito pela CNE, Augusto Mário da Silva, presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, disse ter havido registo de "algumas falhas", mas "que foram imediatamente supridas". Tirando os atrasos na abertura das urnas em algumas mesas e trocas de cadernos eleitorais, "o processo decorreu de forma regular", disse.
Foto: DW/B. Darame
Sociedade Civil
Por último, a Célula de Monitorização do Processo Eleitoral salientou, esta segunda-feira, que "os eleitores compareceram em massa para exercer o seu direito de voto". Este grupo de monitorização das eleições, composto por 420 pessoas, espalhadas por todo o país, saudou também "a boa presença das forças de segurança nos centros de votação observados".