Guiné-Conacri: Coligação quer julgamento de Alpha Condé
Lusa
10 de abril de 2022
Ex-Presidente afastado pelo coronel Mamady Doumbouya está de regresso ao país após três meses nos Emirados Árabes Unidos. Coligação insta junta militar "a abrir, sem demora, julgamento dos crimes de sangue" de Condé.
Publicidade
Uma coligação da Guiné-Conacri, que durante meses lutou contra o ex-Presidente Alfa Condé, instou este sábado (09.04) a junta no poder a abrir imediatamente o processo do antigo chefe de Estado, após o seu regresso do estrangeiro.
Alpha Condé, 84 anos, afastado do poder em setembro de 2021 pelo coronel Mamady Doumbouya e os seus homens, regressou ao país na sexta-feira, após três meses nos Emirados Árabes Unidos, com o acordo da junta, para tratamento.
Um documento do Ministério dos Negócios Estrangeiros guineense, citado pela agência de notícias AFP, indica que foram as autoridades de Conacri que pediram o regresso do ex-Presidente, por considerarem que as suas ações constituíam uma "ameaça".
As autoridades guineenses publicaram fotografias nas redes sociais de Alpha Condé a sair do avião à chegada à capital do país, segundo explicaram.
A Frente Nacional para a Defesa da Constituição (FNDC) divulgou hoje um comunicado apelando ao poder judicial a "fazer todo o possível para abrir, sem demora, o julgamento dos crimes de sangue" cometidos, disse, por "Alpha Condé e os seus capangas".
Gravação polémica
O coletivo orquestrou meses de mobilização em 2019-2020 contra um terceiro mandato do Presidente. A contestação, que foi brutalmente reprimida várias vezes, deixou dezenas de civis mortos sem impedir uma nova investidura de Alpha Condé em dezembro de 2020.
Alpha Condé deixou o país em meados de janeiro para tratamento. A junta terá estado relutante em deixá-lo ir para o estrangeiro, temendo o envolvimento em atividades contra o novo poder.
A divulgação, em março, de uma gravação atribuída ao antigo chefe de Estado, falando da necessidade de o partido de Alpha Condé de se preparar para a guerra na expectativa de uma grave deterioração da situação na Guiné-Conacri, em particular devido à alta de preços, causou muita polémica. A autoria das observações nunca foi contestada.
Um documento diplomático datado de 23 de março e dirigido à embaixada dos Emirados em Conacri diz que as recentes ações de Alpha Condé constituem "uma ameaça à paz e estabilidade" na Guiné e violam os termos de um compromisso da Comunidade dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) atuando como garante do antigo presidente. A carta exigia que Alpha Condé fosse voltasse para o país "o mais depressa possível".
Golpes de Estado em África: Um mal endémico
Em menos de um ano, o continente africano viveu oito golpes e tentativas de golpe de Estado. A maior parte aconteceu na África Ocidental, região do continente mais fértil para as intentonas. Não há fator surpresa.
Foto: Radio Television Guineenne/AP Photo/picture alliance
Níger: Tentativa de golpe fracassada
A tentativa de golpe de Estado aconteceu a 31 de março de 2021, dois dias antes da tomada de posse do Presidente Mohamed Bazoum. Na capital, Niamey, foram detidos alguns membros do Exército por detrás da tentativa. O suposto líder do golpe é um oficial da Força Aérea encarregado da segurança na base aérea de Niamey. O Níger já sofreu 4 golpes de Estado: o último, em 2010, derrubou Mamadou Tandja.
Foto: Bernd von Jutrczenka/dpa/picture alliance
Chade: Uma sucessão com sabor a golpe de Estado
Pouco depois do marechal Idriss Déby ter vencido as presidenciais, morreu em combate contra rebeldes. A 21 de abril de 2021, o seu filho, o general Mahamat Déby, assumiu a liderança do país, sem eleições, nomeando 15 generais para o Conselho Militar de Transição, entre eles familiares seus. Idriss governou o Chade por mais de 30 anos com mão de ferro e o filho dá sinais de lhe seguir os passos.
Foto: Christophe Petit Tesson/REUTERS
Mali: Um golpe entre promessas de eleições
O coronel Assimi Goita foi quem derrubou Bah Ndaw da Presidência do Mali a 24 de maio de 2021. Justifica que assim procedeu porque tentava "sabotar" a transição no país. Mas Goita prometeu eleições para 2022 e falou em "compromisso infalível" das Forças Armadas na defesa da segurança do país. Pouco depois, o Tribunal Constitucional declarou o coronel Presidente da transição.
Foto: Xinhua/imago images
Tunísia: Um golpe de Estado sem recurso a armas
No dia 25 de julho de 2021, Kais Saied demitiu o primeiro ministro, seu rival, Hichem Mechichi, e suspendeu o Parlamento por 30 dias, o que foi considerado golpe de Estado pela oposição, que convocou manifestações em nome da democracia. Saied também levantou a imunidade dos parlamentares e garantiu que as decisões foram tomadas dentro da lei. Nas ruas de Tunes, teve o apoio da população.
Foto: Fethi Belaid/AFP/Getty Images
Guiné-Conacri: Um golpista da confiança do Presidente
O dia 5 de setembro de 2021 começou com tiros em Conacri, uma capital que foi dominada por militares. O Presidente Alpha Condé foi deposto e preso pelo coronel Mamady Doumbouya - que dissolveu a Constituição e as instituições. O golpista traiu Condé, que o tinha em grande estima e confiança. Doumboya tinha demasiado poder e não se entendia com a liderança da ala castrense.
Foto: Radio Television Guineenne via AP/picture alliance
Sudão: Golpe compromete transição governativa
A 25 de outubro de 2021, os golpistas começaram por prender o primeiro ministro, Abdalla Hamdok, e outros altos quadros do Governo para depois fazerem a clássica tomada da principal emissora. No comando estava o general Abdel Fattah al-Burhan, que dissolveu o Conselho Soberano. Desde então, o Sudão vive manifestações violentas, com a polícia a ser acusada de uso excessivo de força.
Foto: Mahmoud Hjaj/AA/picture alliance
Burkina Faso: Golpe de Estado festejado
A turbulência marcou o começo do ano, mas a intentona foi celebrada em grande nas ruas da capital, Ouagadougou. A 23 de janeiro de 2022, o tenente-coronel Paul Damiba liderou o golpe de Estado ao lado do Exército. Ao Presidente Roch Kaboré não restou outra alternativa se não demitir-se. Tal como os golpistas de outros países, comprometem-se a voltar à ordem constitucional após consultas.
Foto: Facebook/Präsidentschaft von Burkina Faso
Guiné-Bissau: Intentona ou "inventona"?
Tiros, alvoroço, mortos e feridos no Palácio do Governo marcaram o dia 1 de fevereiro de 2022 em Bissau. O Presidente Umaro Sissoco Embaló diz que os golpistas queriam matá-lo e ao primeiro ministro, Nuno Nabiam. Houve algumas detenções, mas até hoje não se conhece o líder golpista. No país, acredita-se que tudo não passou de um "teatro" orquestrado pelo próprio Presidente, amplamente contestado.