O ativista equato-guineense Luís Nzó está detido há mais de três semanas sem acusação e sem resposta a um "habeas corpus" entretanto interposto, denunciaram os seus advogados em declarações à agência de notícias Lusa.
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"Ele regressava a casa com os seus filhos no passado dia 6 ao fim da tarde quando foi abordado pela polícia. Levaram-no primeiro à Presidência e daí ao comissariado central da Polícia, que chamam Guantánamo, e aí o têm detido até hoje, mas não o acusam de nada", disse Angél Obama, um dos advogados de Luís Nzó.
Até agora, o ativista não foi conduzido a um juiz ou submetido a qualquer interrogatório formal, indicou por outro lado, Maria Jesus Bikene Obiang, também advogada de Luís Nzó.
Isto mesmo foi confirmado à Lusa por Jerónimo Ndong Mesi, secretário-geral da União Popular, entretanto afastado da função pela justiça da Guiné Equatorial. Jerónimo Ndong, amigo pessoal de Luís Nzó, tem visitado o ativista todos os dias e confirmou à Lusa que o ativista "foi detido no dia 6 e até hoje não lhe disseram nada".
Jerónimo Ndong Mesi acrescentou ainda que Nzó terá sido detido quando seguia para casa com os seus filhos, que "seguiam à frente", no final do trabalho. "Ele sobrevive como vendedor ambulante, trazia a carreta com as mercadorias e eles levaram-no com tudo. Agora, a mulher está a tentar que lhe deem as coisas, para continuar a vender e alimentar os filhos, mas nem isso", relatou.
Situação indefinida
"O grave no país é que se sequestre pessoas e não se diga nada", sublinhou Angél Obama. "Por isso interpusemos o 'habeas corpus'. Se se detém alguém não só tem que haver um argumento judicial, como a pessoa detida tem que ser apresentada a um juiz".
"Na atual situação, Luís Nzó está sequestrado. A intenção deste 'habeas corpus' foi a de forçar a acusação ou a libertação após mais de 72 horas de detenção", mas ninguém dá qualquer resposta. Nada!", disse a mesma fonte.
"Ele está detido num comissariado da polícia. Não houve qualquer interrogatório formal. Após uma detenção, a polícia deve fazer um atestado, também não o fez", explicou Angél Obama.
"O grave é que ninguém sabe o que vai acontecer com ele. Não se sabe até quando vão mantê-lo detido. Estamos em período de férias judiciais até 15 de janeiro, mas numa situação destas, como a do caso do Luís, isso não pode ser argumento para a ausência de decisão", defendeu ainda.
Mensagens no telemóvel
No momento da interpelação, Nzó terá sido questionado pela polícia sobre duas mensagens que tinha no seu telemóvel. Numa delas dava conta de que o chefe de Estado, Teodoro Obiang, não iria participar na Cimeira do Clima, realizada no início do mês em Madrid; e na outra dava voz ao rumor de que o Presidente equato-guineense tinha assistido pessoalmente à tortura de sequestrados, envolvidos na alegada tentativa de golpe de dezembro de 2017.
"Os agentes perguntaram-lhe como sabia que o Presidente tinha assistido à tortura dos sequestrados e como sabia que não iria a Madrid e ele disse que o sabia pelas redes sociais, que eram rumores. Mas aqui é sempre assim, nunca se sabe nada, só há rumores", explicou a advogada Bikene Obiang. Angél Obama e Jerónimo Ndong Mesi confirmam a alegada razão da detenção.
O advogado equato-guineense Ponciano Mbomio Nvó denunciou no final de novembro último a detenção de quatro opositores ao regime do Presidente Teodoro Obiang, adiantando que tinham sido "sequestrados" no Sudão do Sul e levados para cadeias na Guiné Equatorial. Entre esses quatro elementos da oposição sequestrados, "dois são ex-militares do Exército espanhol, guineenses, mas com nacionalidade espanhola", disse também.
As mensagens encontradas no telemóvel de Luís Nzó, segundo o que a polícia terá transmitido ao próprio, referir-se-iam a estes quatro opositores, que teriam sido "torturados na presença" do próprio chefe de Estado, de acordo com os relatos coincidentes das três fontes contactadas pela Lusa.
Presidentes africanos para sempre
Vários presidentes africanos governam há tanto tempo, que muitos cidadãos não conhecem outro líder do seu país. Teodoro Obiang Nguema é o líder africano há mais tempo no poder: governa a Guiné Equatorial desde 1979.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S. Alamba
Guiné Equatorial: Teodoro Obiang Nguema
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é atualmente o líder africano há mais tempo no poder, depois de, em 2017, José Eduardo dos Santos ter deixado o cargo de Presidente de Angola, que ocupava também desde 1979. Neste ano, Obiang chegou ao poder através de um golpe de estado contra o seu tio, Francisco Macías. Nas últimas eleições no país, em 2016, Obiang afirmou que não voltaria a concorrer em 2020.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Lecocq
Camarões: Paul Biya
Com o seu nascimento no ano de 1933, Paul Biya é o Presidente mais idoso do continente africano e apenas ultrapassado em anos no poder pelo líder da vizinha Guiné Equatorial. Biya chegou ao poder em 1982. Em 2008, uma revisão à Constituição retirou os limites aos mandatos. Em 2018, Biya, foi declarado vencedor das eleições. Os Camarões atravessam uma crise com a rebelião na parte anglófona.
Foto: picture-alliance/AA/J.-P. Kepseu
Uganda: Yoweri Museveni
Com mais de 30 anos no poder, Yoweri Museveni é, para uma grande parte dos ugandeses, o único Presidente que conhecem. 75% dos atuais 35 milhões de habitantes nasceram depois de Museveni ter subido ao poder em 1986. Em 2017, foi aprovada a lei que retira o limite de idade (75 anos) para concorrer à Presidência. Assim sendo, Museveni já pode concorrer ao sexto mandado, nas eleições de 2021.
Foto: picture alliance/AP Photo/B. Chol
República do Congo: Denis Sassou Nguesso
Foi também uma alteração à Constituição que permitiu que Denis Sassou Nguesso voltasse a candidatar-se e a vencer as eleições em 2016 na República do Congo (Brazzaville). Já são mais de 30 anos à frente do país, com uma pequena interrupção entre 1992 e 1997. Denis Sassou Nguesso nasceu no ano de 1943.
Foto: picture-alliance/AA/A. Landoulsi
Ruanda: Paul Kagame
Paul Kagame lidera o Ruanda desde 2000. Antes, já teve outros cargos influentes e foi líder da Frente Patrifótica Ruandesa (FPR), a força que venceu a guerra civil no Ruanda. Em 2017, Kagame ganhou as eleições com 98,8% dos votos. Assim poderá continuar no poder até, pelo menos, 2034. Assim ditou a consulta popular realizada em 2015 que acabou com o limite de dois mandatos presidenciais.
Foto: Imago/Zumapress/M. Brochstein
Burundi: Pierre Nkurunziza
Em 2005, Pierre Nkurunziza chegou ao poder no Burundi. Em 2015, o terceiro mandato de Nkurunziza gerou uma onda de protestos entre a população que, de acordo com o Tribunal Penal Internacional, terá causado cerca de 1.200 mortos e 400.000 refugiados. Em maio de 2018, teve lugar um referendo para alterar a Constituição, que permitiu ao Presidente continuar no cargo até 2034.
Foto: Reuters/E. Ngendakumana
Gabão: Ali Bongo Ondimba
Ali Bongo ainda está longe de quebrar o recorde do pai, que esteve 41 anos no poder, mas já vai no terceiro mandato, ganho em 2017, no meio de muita contestação. Em 2018, a Constituição do Gabão foi revista para acabar com o limite de mandatos. A nova versão da Constituição também aumentou os poderes do Presidente para tomar decisões unilateralmente.
Foto: Reuters/Reuters TV
Togo: Faure Gnassingbé
Em 2005, Faure Gnassingbé substituiu o pai, que liderou o país durante 38 anos. Ao contrário de outros países, o Togo não impunha um limite aos mandatos. Em 2017, após protestos da população contra a "dinastia" Gnassingbé, foi aprovada a lei que impõe um limite de mandatos. No entanto, a lei não tem efeitos retroativos, pelo que o ainda Presidente poderá disputar as próximas eleições, em 2020.
Foto: DW/N. Tadegnon
Argélia: Abdelaziz Bouteflika
Abdelaziz Bouteflika esteve 20 anos no poder na Argélia (1999-2019). Em 2013, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), mas nem a idade, nem o estado de saúde travaram o Presidente de anunciar que iria procurar um quinto mandato em 2019. Em abril de 2019, face a protestos públicos, anunciou a sua renúncia ao cargo. Nesta altura, já teve 82 anos de idade.