Executivo quer um "entendimento satisfatório" no seio das forças políticas e da sociedade civil. Embaixador que chefiou missão da CPLP no país diz que moratória para processo de adesão está a ser respeitada.
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A Guiné Equatorial mostra-se determinada a abolir a pena de morte "com uma canetada", mas num ambiente de amplo consenso político. Entretanto, o Executivo de Malabo desafia quem quer que seja a apontar um único caso de execução ou da existência atualmente de um preso político.
A informação foi transmitida ao embaixador cabo-verdiano José Luís Monteiro, chefe da Missão de Acompanhamento do Programa de Adesão da Guiné Equatorial à Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), uma semana depois de o regime de Teodoro Obiang Nguema, há 39 anos no poder, ter condenado mais de 130 pessoas, quatro delas a 96 anos de prisão, por tentativa de golpe de Estado em 2017.
A missão que decorreu entre os dias 5 e 7 deste mês foi a primeira dessa envergadura realizada pela organização lusófona cerca de cinco anos após a adesão da Guiné Equatorial.
Guiné Equatorial quer "consenso" para abolir pena de morte
A pena de morte continua vigente na Constituição do país. Falta saber qual será o momento para executar a decisão da abolição. O Governo garante que tem respeitado a moratória assumida pelo regime no âmbito do processo de adesão à CPLP, ocorrido em julho de 2014, em Timor-Leste.
"Em termos de execuções, portanto exercício efetivo da pena de morte, parece ser um facto que a moratória foi até agora respeitada. No que diz respeito à abolição da pena de morte, a parte da Guiné Equatorial tomou a iniciativa de levantar essa questão por várias vezes", afirma José Luís Monteiro.
A equipa encontrou-se, entre outras entidades, com a Presidente do Senado e com o Presidente do Comité dos Deputados, em sessão plenária dirigida pelo ministros dos Negócios Estrangeiros, Siméon Oyono Esono Angu. O diplomata cabo-verdiano diz que "não é advogado de ninguém" e que apenas está a reproduzir a ótica dos governantes do país.
Consenso
Para o Governo de Malabo, que goza de uma maioria no Senado, não basta adotar um decreto e determinar o fim da pena de morte. O Executivo quer um "entendimento satisfatório" no seio das forças políticas e da sociedade civil sobre esta matéria e não uma imposição.
"Inclusivamente também disseram que a própria população precisa de compreender bem que a pena de morte não é necessariamente a melhor defesa última contra determinadas ameaças que dizem tem vindo a crescer, como a criminalidade ligada à exploração do petróleo, etc.. Portanto, o que dão a entender é que aceitaram [acabar com a pena de morte], vão fazer isso, mas é um processo [gradual e consensual] para que, quando isso for feito, seja pacífico e não crie ressentimentos entre eles", explica o chefe da missão da CPLP.
Num balanço da missão este fim de semana em Lisboa, José Luís Monteiro transmitiu aos jornalistas a ideia, contestada pelo Governo, de haver um sentimento de que a Guiné Equatorial está a ser avaliada. Esta atitude, no entender do Executivo, contraria o tratamento igualitário que deve existir entre membros do mesmo grupo, em que alguns devem ajudar o Estado membro mais novo da organização a integrar-se melhor.
A missão esteve na Guiné Equatorial para avaliar os desenvolvimentos registados no processo de adesão e integração do país à CPLP em cinco eixos, processo esse que completa cinco anos no próximo mês de julho. "Tratou-se de examinar as atividades de um conjunto de eixos. O que fizemos foi essencialmente verificar tudo o que foi feito, como foi feito, as dificuldades encontradas, e discutir ideias sobre como melhorar no futuro a execução dessas mesmas atividades", acrescenta José Luís Monteiro. "É conversa tida entre nós membros da missão que há uma implementação entre o satisfatório e, em algum outro caso, o bom. Não do excelente."
No entanto, José Luís Monteiro acredita que, depois do relatório final a apresentar na cimeira dos chefes de Estado e de Governo de 19 de julho próximo na cidade do Mindelo, em Cabo Verde, seja possível redinamizar o processo de integração da Guiné Equatorial.
Presidentes africanos para sempre
Vários presidentes africanos governam há tanto tempo, que muitos cidadãos não conhecem outro líder do seu país. Teodoro Obiang Nguema é o líder africano há mais tempo no poder: governa a Guiné Equatorial desde 1979.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S. Alamba
Guiné Equatorial: Teodoro Obiang Nguema
Teodoro Obiang Nguema Mbasogo é atualmente o líder africano há mais tempo no poder, depois de, em 2017, José Eduardo dos Santos ter deixado o cargo de Presidente de Angola, que ocupava também desde 1979. Neste ano, Obiang chegou ao poder através de um golpe de estado contra o seu tio, Francisco Macías. Nas últimas eleições no país, em 2016, Obiang afirmou que não voltaria a concorrer em 2020.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Lecocq
Camarões: Paul Biya
Com o seu nascimento no ano de 1933, Paul Biya é o Presidente mais idoso do continente africano e apenas ultrapassado em anos no poder pelo líder da vizinha Guiné Equatorial. Biya chegou ao poder em 1982. Em 2008, uma revisão à Constituição retirou os limites aos mandatos. Em 2018, Biya, foi declarado vencedor das eleições. Os Camarões atravessam uma crise com a rebelião na parte anglófona.
Foto: picture-alliance/AA/J.-P. Kepseu
Uganda: Yoweri Museveni
Com mais de 30 anos no poder, Yoweri Museveni é, para uma grande parte dos ugandeses, o único Presidente que conhecem. 75% dos atuais 35 milhões de habitantes nasceram depois de Museveni ter subido ao poder em 1986. Em 2017, foi aprovada a lei que retira o limite de idade (75 anos) para concorrer à Presidência. Assim sendo, Museveni já pode concorrer ao sexto mandado, nas eleições de 2021.
Foto: picture alliance/AP Photo/B. Chol
República do Congo: Denis Sassou Nguesso
Foi também uma alteração à Constituição que permitiu que Denis Sassou Nguesso voltasse a candidatar-se e a vencer as eleições em 2016 na República do Congo (Brazzaville). Já são mais de 30 anos à frente do país, com uma pequena interrupção entre 1992 e 1997. Denis Sassou Nguesso nasceu no ano de 1943.
Foto: picture-alliance/AA/A. Landoulsi
Ruanda: Paul Kagame
Paul Kagame lidera o Ruanda desde 2000. Antes, já teve outros cargos influentes e foi líder da Frente Patrifótica Ruandesa (FPR), a força que venceu a guerra civil no Ruanda. Em 2017, Kagame ganhou as eleições com 98,8% dos votos. Assim poderá continuar no poder até, pelo menos, 2034. Assim ditou a consulta popular realizada em 2015 que acabou com o limite de dois mandatos presidenciais.
Foto: Imago/Zumapress/M. Brochstein
Burundi: Pierre Nkurunziza
Em 2005, Pierre Nkurunziza chegou ao poder no Burundi. Em 2015, o terceiro mandato de Nkurunziza gerou uma onda de protestos entre a população que, de acordo com o Tribunal Penal Internacional, terá causado cerca de 1.200 mortos e 400.000 refugiados. Em maio de 2018, teve lugar um referendo para alterar a Constituição, que permitiu ao Presidente continuar no cargo até 2034.
Foto: Reuters/E. Ngendakumana
Gabão: Ali Bongo Ondimba
Ali Bongo ainda está longe de quebrar o recorde do pai, que esteve 41 anos no poder, mas já vai no terceiro mandato, ganho em 2017, no meio de muita contestação. Em 2018, a Constituição do Gabão foi revista para acabar com o limite de mandatos. A nova versão da Constituição também aumentou os poderes do Presidente para tomar decisões unilateralmente.
Foto: Reuters/Reuters TV
Togo: Faure Gnassingbé
Em 2005, Faure Gnassingbé substituiu o pai, que liderou o país durante 38 anos. Ao contrário de outros países, o Togo não impunha um limite aos mandatos. Em 2017, após protestos da população contra a "dinastia" Gnassingbé, foi aprovada a lei que impõe um limite de mandatos. No entanto, a lei não tem efeitos retroativos, pelo que o ainda Presidente poderá disputar as próximas eleições, em 2020.
Foto: DW/N. Tadegnon
Argélia: Abdelaziz Bouteflika
Abdelaziz Bouteflika esteve 20 anos no poder na Argélia (1999-2019). Em 2013, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC), mas nem a idade, nem o estado de saúde travaram o Presidente de anunciar que iria procurar um quinto mandato em 2019. Em abril de 2019, face a protestos públicos, anunciou a sua renúncia ao cargo. Nesta altura, já teve 82 anos de idade.