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Guineenses protestam: "A luta tem de ser consequente"

João Carlos
25 de julho de 2024

Guineenses em Portugal protestam no sábado contra a "ditadura" na Guiné-Bissau. Exigem a marcação das eleições presidenciais para este ano e pedem a reabertura da Assembleia Nacional Popular.

Protestos em Lisboa contra o Presidente Sissoco Embaló, abril de 2024
Foto: João Carlos/DW

Guineenses em Portugal manifestam-se este sábado (27.07) contra a ditadura, face à crise política e social na Guiné-Bissau.

A mobilização encabeçada pela "Frente Popular", na Guiné-Bissau, visa exigir ao Presidente guineense, Umaro Sissoco Embaló, a marcação da data das próximas eleições presidenciais, cumprindo o calendário imposto pela Constituição e Lei Eleitoral.

Os organizadores da manifestação exigem também a retirada das forças colocadas por Sissoco na Assembleia Nacional Popular, de modo a permitir o funcionamento deste órgão central. Querem igualmente a eleição de um novo secretário executivo da Comissão Nacional de Eleições (CNE) e exigem a realização da eleição para escolha do novo presidente do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

Em entrevista à DW África, um dos membros da organização do protesto de sábado em Portugal, o ativista guineense Yussef, que não revela o nome completo, fundamenta as reivindicações dos manifestantes e exorta os políticos do país a se juntarem ao movimento.

DW África: Quais as exigências da diáspora com esta manifestação de sábado em Portugal? Contam com uma ampla adesão dos guineenses?

Yussef (Y): Contamos com uma ampla adesão, mas independentemente do número de guineenses, africanos e todos aqueles que se solidarizam com o povo da Guiné-Bissau neste momento, cremos que é extremamente importante sair às ruas, aqui em Lisboa, à semelhança daquilo que irá acontecer em toda a Guiné-Bissau. As palavras de ordem são fundamentais neste momento, tendo em conta a situação política: realização de eleições presenciais, respeito à Constituição da Guiné-Bissau e à lei eleitoral.

A partir do dia 27 de fevereiro de 2025, Umaro Sissoco Embaló já não terá legitimidade para se sentar na Presidência da República da Guiné-Bissau. Como tal, as eleições têm de se realizar no final deste ano, nomeadamente em novembro. Essa é a primeira reivindicação.

"A partir do dia 27 de fevereiro de 2025, Sissoco Embaló (foto) já não terá legitimidade para se sentar na Presidência da República da Guiné-Bissau", alerta ativista.Foto: Alexei Maishev/TASS/dpa/picture alliance

A segunda tem a ver com o respeito, mais uma vez, pela decisão do povo da Guiné-Bissau, que tem respaldo na Assembleia Nacional Popular, que deve ser reaberta. Para quê? Para que, em primeiro lugar, se possa formar uma nova comissão executiva da Comissão Nacional de Eleições, porque é fundamental que este órgão, que tem como responsabilidade organizar as eleições, esteja de acordo com a lei da Guiné-Bissau. Neste momento, há uma situação de caducidade.

Então, é preciso resolver essa situação, e isso passa pela reabertura da Assembleia Nacional Popular. Ao mesmo tempo, existe um outro órgão, que é um órgão de soberania, que foi assaltado por milícias e até hoje não houve uma reivindicação de quem deu essa ordem, mas é fundamental que haja igualmente esta legitimação constitucional no que diz respeito a este órgão de soberania, que é o Supremo Tribunal de Justiça. Estas são as razões pelas quais nós saímos à rua.

DW: Do pacote das vossas exigências, espera-se algum eco destes protestos junto do Presidente Sissoco?

Y: Na verdade, não temos propriamente como aferir se haverá, esse eco. Infelizmente, a tendência tem sido negativa. Ou seja, nós estamos perante uma deriva autoritária, estamos perante um esvaziamento das instituições políticas na Guiné-Bissau. Como tal, à luz das declarações, ações e omissões de Umaro Sissoco Embaló, não posso, neste momento, acreditar que possa haver um eco positivo.

Contudo, há necessidade de toda uma geração de guineenses assumir a sua responsabilidade histórica e, como tal, nós pensamos que, neste momento, a tática a ser assumida é de sair à rua.

DW: Após o desfecho do caso do 1 de fevereiro, o protesto de sábado vai exigir também a libertação dos detidos?

Y: Nós defendemos as liberdades democráticas. Na Guiné-Bissau, existem tribunais que supostamente deveriam ser independentes. Diz-se que, quando o tribunal decide, há que cumprir a ordem do tribunal. O tribunal não está subordinado nem à Presidência da República, nem ao Governo ou quaisquer outros órgãos de soberania. Está subordinado às leis da Guiné-Bissau.

"Os guineenses devem assumir a sua responsabilidade histórica e sair à rua", apela Yussef.Foto: João Carlos/DW

Se o tribunal, após averiguações, chegar à conclusão que não há razões para que aqueles detidos continuem na prisão e ordenem a sua libertação, eu creio que, no mínimo da boa fé, no sentido jurídico, estes senhores que estão presos devem ser libertados.

DW: Domingos Simões Pereira, líder do PAIGC, anunciou ontem o seu regresso a Bissau. Como avalia este regresso? O que isso quer dizer? É uma esperança?

Y: Nós pensamos que todos os que neste momento se revêem nestas palavras de ordem que levantamos devem dar o seu contributo para uma mudança concreta na Guiné-Bissau, uma mudança política. Isto é tanto mais verdade quando falamos do líder do maior partido da Guiné-Bissau, do líder do partido que ganhou as eleições legislativas, do líder do partido que tem o maior número de deputados na Assembleia Nacional Popular, do líder do partido que tem vindo a fazer uma oposição vis-à-vis ao regime.

Eu creio que existe igualmente uma responsabilidade por parte de Domingos Simões Pereira, enquanto líder do PAIGC, de fazer face ao regime. Não nos cabe dizer como. O que nos cabe sim dizer é que a luta tem que ser consequente. A resistência política tem que ser consequente.

Se até hoje se enverdeou por todo um conjunto de iniciativas e, ao mesmo tempo, não se vêem resultados concretos, porque vemos que o regime continua na sua senda de autoritarismo, de consolidação do seu absolutismo, há que pensar em outras alternativas. E uma delas é, realmente, aquilo que nós vamos fazer, tanto na Guiné-Bissau, através da "Frente Popular", como aqui em Lisboa, que é sair às ruas, mobilizar a população politicamente, com palavras de ordem concretas, no sentido de irmos ao encontro dos objetivos pelos quais fizemos a luta de libertação nacional, que, neste caso, é o respeito das regras democráticas e, ao mesmo tempo, pelo progresso e melhoria das condições de vida do povo de Guiné-Bissau.

DW: Acha que, desta vez, e dada a chuva de críticas dos partidos políticos a Sissoco, estes se juntarão aos protestos de rua? Já não é só o PAIGC que critica, também o PRS, MADEM...

Y: A Frente Popular, na Guiné-Bissau, apelou a todos os guineenses para saírem à rua, independentemente da cor partidária. A partir do momento em que há uma convergência às palavras de ordem defendidas pela Frente Popular, que é o respeito pelas liberdades democráticas, respeito pela Constituição da Guiné-Bissau, que obriga à marcação de eleições, a abertura da Assembleia Nacional Popular e a validação, tanto do Supremo Tribunal de Justiça como da CNE, eu creio que todos os guineenses devem sair à rua neste momento. Obviamente que existe a possibilidade de líderes políticos demonstrarem vontade de apoiar esta manifestação, é provável que os militantes das suas organizações saiam à rua. Mas eu creio que, neste momento, cada guineense deve pensar pela sua cabeça.

Eu creio que cada guineense, se fizer esta reflexão, chegará à conclusão que, independentemente das posições dos líderes políticos, por mais importantes que elas possam ser, é fundamental que cada guineense assuma a sua responsabilidade de sair à rua este sábado. E acreditamos que isso vai acontecer. 

Guineenses em Portugal protestam contra "regime de Sissoco"

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