Milhões de crianças vítimas de trabalho infantil no Uganda
Alex Gitta (Kampala)
11 de fevereiro de 2018
De acordo com dados do governo ugandês, as crianças entre os 5 e os 17 anos são as mais exploradas no Uganda. Apesar de existirem leis que criminalizam o trabalho infantil, não são aplicadas.
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São seis da manhã e há uma criança a atravessar a rua Kampala no centro da cidade com o mesmo nome. Corre em direção ao mercado de Nakasero, um dos mais populares.
"Chamo-me Bugembe Abdu Rahman e venho de Zirobwe. Não estou na escola, porque não tenho dinheiro para as propinas. Por isso vendo sacos de plástico no mercado de Nakasero a partir das cinco da manhã. Mas não estou aqui há muito tempo", diz, com vergonha.
Aos 13 anos, Bugembe é uma das muitas crianças vítimas do trabalho infantil no Uganda. No total, são mais de dois milhões o número de menores vítimas deste flagelo neste país.
Bugembe sabe que o tio não lhe dará dinheiro pela tarefa que lhe atribuiu, mas o seu sonho é voltar à escola e ser médico. Por isso prefere ajudar a família. Só regressará a casa depois das nove da noite.
O sonho de acabar a escola
A história repete-se em todo o país. No mercado de Ruti, perto de Mbarara, Collins Turyamuhaki também tem 13 anos, embora ninguém imagine que atrás desta idade está uma criança que trabalha para pagar a escola do irmão mais novo. Collins Turyamuhaki ganha a vida a embalar bananas.
09.02.2018 Trabalho infantil no Uganda - MP3-Mono
"Ensaco bananas e por cada saco pagam-me 3000 ou 2000. Num dia consigo embalar três ou quatro sacos. Uso o dinheiro para comprar livros e para pagar a escola e às vezes os meus pais também me ajudam quando podem", afirma.
Mas este é só o trabalho de Collins Turyamuhaki durante a manhã. À tarde ele ajuda os clientes do mercado a carregarem as suas compras em troca de um pagamento. Mais tarde, vende fruta nas ruas de Mbarara. Apesar do ritmo do trabalho, esta criança de 13 anos tem o sonho de um dia acabar a escola.
"Eu sei que este tipo de trabalho não me vai tornar rico, por isso quero fazer dinheiro suficiente para voltar para a escola e quando terminar a escola já não voltarei para aqui", promete-se a si mesmo.
Pobreza generalizada
O Instituto de Estatística do Uganda estima que 45% das famílias vivam abaixo do limiar da pobreza. Apesar de a legislação ugandesa criminalizar o trabalho infantil, a implementação da lei está longe de ser uma realidade.
Jeremiah Kamurari é presidente do distrito de Isingiro. À DW, este governante admite que a lei é fraca e que os políticos, em busca de votos, falham em aplicá-la.
"Eu quero assegurar que nenhuma criança nesta área fará este tipo de trabalhos forçados. Todas as crianças devem ir para a escola", afirma este responsável político.
"Temos de garantir que os pais destas crianças são detidos e condenados, porque o futuro destas crianças está nas mãos deles e podem tornar-se um outro problema no futuro. Eu não permitirei que isso aconteça e lutarei contra este crime", garante.
Minas de ouro na Nigéria: trabalho mortal para crianças
Centenas de crianças trabalham em minas de ouro na Nigéria. Há alguns meses, 28 crianças morreram, envenenadas com chumbo. De lá para cá, pouco ou nada mudou. O correspondente da DW Adrian Kriesch visitou a região.
Foto: DW/A. Kriesch
Veneno dourado
Centenas de crianças trabalham, todos os dias, em minas de ouro na Nigéria. Em maio, 28 crianças morreram, envenenadas com chumbo - todas menores de seis anos. Os irmãos tinham levado pedras da mina para casa. Para separar o metal precioso da pedra, usa-se produtos químicos tóxicos. Pequenas quantidades podem ser fatais para um menor de seis anos.
Foto: DW/A. Kriesch
Normalidade assustadora
Basta o contacto com roupas contaminadas com chumbo para crianças menores de seis anos entrarem em colapso. Meses depois da tragédia na Nigéria, a realidade continua a ser assustadora: muitas das crianças que trabalham nas minas de ouro têm à volta de seis anos de idade. Garimpam dia após dia, de manhã à noite. Aqui, mal se vê adultos.
Foto: DW/A. Kriesch
Pó de chumbo mortal
Para proteger melhor as crianças, uma organização promove uma sessão de esclarecimento numa aldeia. As crianças não devem trazer roupas da mina para casa, não devem mexer em químicos e devem evitar minas de alto risco. Mais difícil é proibir as crianças de trabalhar.
Foto: DW/A. Kriesch
Minas em vez da escola
"A minha família precisa do dinheiro", conta Habi. Ela não sabe quantos anos tem, sabe apenas que trabalha há 24 meses na mina. Ainda assim, ao contrário de muitos dos seus amigos, Habi vai de vez em quando à escola.
Foto: DW/A. Kriesch
Acesso difícil
Muitas minas de ouro ficam no estado do Níger, no centro-oeste da Nigéria. Durante a época das chuvas, a região fica separada do resto do país. A única estrada para o Níger transforma-se num rio. Os carros não conseguem circular, as motorizadas têm de ser transportadas à mão. O caos ilustra bem a forma como esta região foi esquecida pelo Estado.
Foto: DW/A. Kriesch
"Trabalho infantil?"
Depois da morte das 28 crianças, foi criada uma força especializada em envenenamentos por chumbo. Mas em Kagara, a sede do Governo local, nega-se que haja trabalho infantil. "O que significa isso, trabalho infantil?", pergunta o líder da força, Alhaji Abdullahi Usman Katako. Ele diz que, durante a época das chuvas, é impossível tomar medidas de maior envergadura devido às más condições da estrada.
Foto: DW/A. Kriesch
Cuidados médicos quase inexistentes
Cerca de 80% das crianças da região têm altas concentrações de chumbo no sangue. Mas faltam médicos para as tratar. Próximo da mina, só há um posto médico. Mas o médico nunca estudou Medicina, tirou apenas um curso rápido na capital provincial. Dezenas de crianças tiveram de ser levadas para tratamento em localidades maiores.
Foto: DW/A. Kriesch
143 alunos, um professor
Na escola de Shikira, há um professor para 143 alunos – e ele ensina todas as disciplinas. "Muitas vezes, os alunos baldam-se às aulas e vão para o garimpo", conta Abdullahi Garba. Muitos pais não conseguiram pagar o uniforme da escola e mandaram os filhos para o trabalho nas minas. "Preciso de mais apoios para conseguir fazer alguma coisa contra isso."
Foto: DW/A. Kriesch
Mais minas do que atos
O jornalista nigeriano Arukaino Umukoro diz que, desde a notícia das mortes por envenenamento com chumbo, pouco ou nada mudou. Pelo contrário: Há mais minas do que antes. "Os habitantes da aldeia não conhecem outra coisa que não o garimpo. O Estado tem de arranjar alternativas para estas pessoas e investir na educação", diz Umukoro.