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História

Haile Selassie: O "Leão Etíope da Judeia"

Jackie Wilson | rl
12 de julho de 2018

Era um monarca tradicionalista, no entanto, foi ele que lançou as bases da Etiópia moderna. Mudanças que acabaram por conduzir à queda do próprio Haile Selassie, que participou também na criação da atual União Africana.

Haile Selassie
Foto: Comic Republic

Nascimento: a 23 de julho de 1892, perto de Harar, na Etiópia. Como o seu pai era primo e aliado próximo do Imperador Menelik II, quando ficou órfão, Haile Selassie foi convocado para a corte em Addis Ababa, em 1906. Em 1913, o neto de Menelik II, Lij Iyasu, tornou-se Imperador, no entanto, foi destituído pouco tempo depois por suspeitas de se ter convertido ao islamismo. Em 1916, Ras Tafari foi nomeado herdeiro e regente da Imperatriz Zauditu, filha de Menelik II, e em 1930, após a morte da Imperatriz Zauditu, foi coroado Imperador Haile Selassie. Foi destituído num golpe orquestrado pelo regime comunista de Derg, em 1974, e morreu menos de um ano depois, a 26 de agosto de 1975, em Addis Abeba.

Reconhecido por: ter introduzido, em 1931, a primeira constituição na Etiópia, que previa um Parlamento e um código legal, e por ter proclamado igualdade entre os etíopes. No entanto, tanto esta primeira constituição como a segunda, promulgada em 1955, foram criticadas por concederem poder demais ao próprio Imperador, pois ele mantinha o direito de reverter qualquer decisão parlamentar.

Criticado por: Tafari Makonnen, nome de batismo, é considerado, desde cedo, um bom estrategista. Há indícios de que participou na destituição do Imperador Lij Iyasu, antecessor de Zauditu, e que governou por apenas três anos. Como Imperador, Haile Selassie deu a milhares de jovens a oportunidade de estudar no estrangeiro. Mas foram estes mesmos estudantes que, mais tarde, pediram a sua destituição, perante o insucesso da reforma do país. O descontentamento com a sua monarquia culminou numa tentativa de golpe de estado em 1960, a maior ameaça ao seu governo até à data, até que foi derrubado pelo regime comunista de Derg.

Aspirações: Como regente, Ras Tafari levou a Etiópia à Liga das Nações em 1923, fazendo desta uma das poucas nações africanas independentes a obter a adesão à organização. Em 1963, o Imperador convocou a primeira reunião da Organização da Unidade Africana, que mais tarde se tornaria a União Africana. Haile Selassie  ajudou a conceber a sua primeira carta e tornou-se o seu primeiro presidente. A sede da organização foi estabelecida em Adis Abeba, capital da Etiópia.

Haile Selassie: O "Leão Etíope da Judeia"

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Como era visto Haile Selassie na Alemanha? Defendendo mais cooperação internacional, Haile Selassie viajou muito. Em 1954, tornou-se no primeiro chefe de Estado estrangeiro a visitar a recém-formada República Federal da Alemanha, recebendo o que seria relatado como "a maior receção de boas-vindas dada a qualquer visitante desde o fim da guerra". O etíope foi recebido como um igual e estava acima de tudo interessado em aprender sobre no progresso técnico, médico, agrícola e industrial que ele poderia levar de volta à Etiópia. A Etiópia continuaria a ser um parceiro estimado da Alemanha, tendo Haile Selassie sido também bem recebido em Bona em 1973, um ano antes da sua demissão.

Frases famosas:

"Além do Reino do Senhor, não existe nesta terra qualquer nação que seja superior a outra. Somos nós hoje. Serão vocês amanhã".

(Discurso na Liga das Nações, em 1936)

"A história ensina-nos que a união é a força e adverte-nos a superar as nossas diferenças na busca de objetivos comuns, para lutar, com todas as nossas forças combinadas, pelo caminho para a verdadeira fraternidade e unidade africana".

(Discurso de agradecimento durante a sua eleição como líder da Organização da Unidade Africana, em 1963)

Legado: Haile Selassie deu à Etiópia a sua primeira universidade, escolas, hospitais e um governo centralizado. As reformas que ele procuravam retratar a Etiópia como um país aberto ao mundo, tendo este Imperador ficado conhecido internacionalmente como um líder inteligente e carismático - uma posição que ele usou para o bem de toda a África, promovendo esforços pan-africanos. Sucessivos líderes africanos pós-independência viram nele um defensor dos valores africanos e da independência. Os líderes europeus saudaram-no por ser um antifascista e na Jamaica, os rastafari adoravam-no e reconheciam-no como um Messias.

Haile Selassie participou na criação da atual União AfricanaFoto: Comic Republic

Em 1922, chegava  às ruas de Adis Abeba o primeiro jornal regular da Etiópia, o país estava a progredir. Por detrás do programa de modernização estava o homem que, sob o nome de Haile Selassie, permaneceria à frente da política etíope por meio século. 

Haile Selassie era inicialmente chamado Ras Tafari. Era um jovem regente, herdeiro do trono etíope e que estava determinado a deixar a sua marca na história do país. No entanto, Haile Selassie era um homem que por si só era um paradoxo pois, se por um lado, deu início a um plano de reformas no país ao nível económico, social e político, por outro, assegurou que a monarquia retém o poder absoluto.

Lij Asfa-Wossen Asserate, historiador e sobrinho-neto do Imperador, lembra como foram os primeiros anos de mudança na Etiópia. Em entrevista à DW, o historiador, que vive atualmente na Alemanha, lembra que "o visionário jovem Ras Tafari Makonnen foi o campeão de todos os etíopes liberais". No entanto, acrescenta, "nem todos gostavam dele. Havia muitos príncipes etíopes que não concordavam com esse tipo de ocidentalização na Etiópia".

Ainda assim, Ras Tafari conseguiu manter os seus inimigos à distância e foi num ambiente de festa que, em 1930,  foi coroado imperador Haile Selassie. Um ano depois, o etíope já havia introduzido uma nova constituição na Etiópia que estabelecia um parlamento - embora com poderes limitados. No entanto, os esforços do Imperador na reforma do país foram depressa interrompidos com a invasão da Itália, em 1935, ordenada pelo fascista de Benito Mussolini. 

Discurso de Haile Selassie, em Genebra, na SuiçaFoto: Comic Republic

Um ano depois, em 1936, Haile Selassie fez um discurso memorável na Liga das Nações, em Genebra, Suiça, no qual pediu à assembleia apoio para expulsar os ocupantes do seu país. 

Durante este discurso, alguns jornalistas fascistas assobiaram e vaiaram Haile Selassie, acabando por ser expulsos. Lij Asfa-Wossen conta que o Imperador não reagiu e "continuou o seu discurso". "Lembro-me de uma frase que ficou no meu ouvido todos estes anos: "A pequena luz que se acendeu no meu país, engolirá a Europa num grande incêndio". Estas foram de facto palavras proféticas", afirma.

Apesar deste discurso impressionante, passaram mais cinco anos até que os britânicos decidissem ajudar Haile Selassie a recuperar o seu país. Em 1941, já depois do exílio, o Imperador regressa à Etiópia e é reintegrado nas suas funções, comprometendo-se a consolidar o seu reinado. Continuou com reformas educacionais e levou a Etiópia às Nações Unidas. Viajou muito. Em 1954, foi o primeiro chefe de Estado estrangeiro a visitar a recém-formada República Federal da Alemanha após a Segunda Guerra Mundial, estabelecendo uma relação duradoura entre os dois países.

Foto: Comic Republic

No palco internacional, o Imperador estava a ganhar o status de um dos mais velhos e respeitados estadistas. Na Jamaica, o Movimento Rastafari foi construído à volta do Imperador. Haile Selassie foi reconhecido como uma força importante no movimento pan-africanista e ressuscitou para ser um símbolo da independência africana. Em 1963, participou na criação da Organização da União Africana. Um verdadeiro desenvolvimento para o continente que Haile Selassie celebra num grande discurso. "Neste dia, olhamos para o futuro com serenidade, confiança e coragem. Hoje, estamos a olhar não apenas para uma África livre, mas também para uma África unida", afirmou na época.

Revolução

No entanto, na Etiópia, Haile Selassie estava a tornar-se cada vez mais autocrático. O desencantamento com a sua monarquia deu asas a uma tentativa de golpe em 1960. Um aviso a que o imperador não deu importância. Como explica o historiador Asfa-Wossen, "todos esses esforços [de Haile Selassie] na política externa não foram combinados com um interesse em assuntos internos e este foi o seu maior erro – ele não deu a devida importância ao próprio país. Então, quando a revolução finalmente chegou, lá estávamos nós, com um imperador envelhecido. Esperávamos o momento da verdade, todos sabiam que o vulcão estava prestes a entrar em erupção, e ninguém estava em posição de o parar".

A monarquia mais antiga do mundo termina com anos de crise. A 12 de setembro de 1974, Haile Selassie foi destituído. Morreu em prisão domiciliária a 27 de agosto de 1975. Tinha 83 anos.

O projeto "Raízes Africanas" é financiado pela Fundação Gerda Henkel.

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