Huambo: "Porque é que a polícia usou balas reais?"
6 de junho de 2023Depois dos distúrbios na cidade do Huambo, a polícia disse, em comunicado, que "não foi possível evitar" as mortes e endereçou condolências às famílias vítimas da violência policial. Mas, em entrevista à DW África, o diretor executivo da organização não-governamental OMUNGA critica a corporação: Não só é possível evitar mortes, como é urgente que as autoridades angolanas garantam a proteção e segurança dos cidadãos, sem usar "balas reais", diz João Malavindele.
O defensor dos direitos humanos mostra-se preocupado com os casos recorrentes de violência policial em Angola, temendo a sua repetição. Chama ainda a atenção para o descontentamento da população angolana, prevendo mais protestos um pouco por todo o país.
DW África: Como avalia a atuação da polícia nos protestos na cidade do Huambo?
João Malavindele (JM): É uma atuação a que já estamos habituados, como sempre, pela negativa. E de acordo com o que temos vindo a acompanhar através de alguns nossos parceiros, que estão lá no local, os dados que a polícia apresenta não coincidem. Fala-se em cerca de 12 mortos, e a polícia, no seu comunicado, afirma que são cinco mortos. Mais uma vez, as autoridades angolanas não foram capazes de garantir a proteção e a segurança dos cidadãos. Antes pelo contrário: Usou-se, mais uma vez, balas reais.
DW África: A polícia diz que "não foi possível evitar" e lamenta estas mortes. Não é possível à polícia evitar mortes?
JM: A polícia tem à sua disposição outros meios para neutralizar cidadãos. Acho que qualquer agente da polícia, durante a sua formação, aprende técnicas de proteção e segurança. Então, a polícia nacional deve ser reformada para evitar essas situações, que têm sido recorrentes. Sempre que a polícia sai à rua para atuar há vítimas, e por vezes vítimas mortais.
DW África: Episódios, como este que aconteceu no Huambo, podem voltar a repetir-se depois do aumento da gasolina?
JM: Claro, isso vai acontecer. Há informações de outras províncias em que as pessoas pretendem ir para a rua para manifestar o seu descontentamento. Não é só por causa do aumento do combustível. É também por causa de outras coisas que estão a acontecer. Refiro-me, por exemplo, ao nível de pobreza que muitas famílias vivem ou à nova lei que regula o funcionamento das organizações não-governamentais. Tudo isto tem vindo a aumentar os níveis de descontentamento dos cidadãos e das organizações da sociedade civil.
DW África: Este aumento do preço da gasolina é a gota de água que fez transbordar o copo?
JM: Bom, eu acho que o Governo tem as suas razões, mas as medidas contrastam muito com a realidade social das famílias angolanas. Isso gera toda essa convulsão social a que estamos a assistir.