Huambo: Profissionais de saúde em greve até 8 de junho
José Adalberto
1 de junho de 2018
Trabalhadores do setor da saúde protestam contra retirada da folha de salário. Vários serviços e unidades de saúde estão abrangidos. Apenas casos mais urgentes serão atendidos.
O sindicato provincial dos trabalhadores da administração pública e serviços diz que a medida resulta da falta de resposta do Executivo, quanto à reposição dos seus filiados na folha de salários.
"É declarada a greve no setor da saúde em toda extensão da Província do Huambo, a partir das 7 horas, do dia 31 de maio, até ao dia 8 de junho, de 2018. Para além, dos funcionários retirados do SIGFE [Sistema Integrado de Gestão Financeira do Estado, ferramenta que oferece o suporte tecnológico para o pagamento dos salários], apela-se à solidariedade de outros profissionais que não foram abrangidos por esta medida”, informa a declaração lida por Joaquim Binga.
Segundo o sindicato, durante a greve, irão funcionar apenas os serviços mínimos para acudir os pacientes em estado grave. Várias unidades e categorias profissionais serão abrangidas:"repartições municipais, hospital central, hospitais municipais, centros de saúde e todos os serviços e todas as categorias profissionais tais como médicos, enfermeiros, técnicos de diagnóstico e terapeuta, técnicos administrativos, serviços de internamento, medicina, cirurgia, consultas externas, raio-X, pediatria e laboratório" .
Huambo: Profissionais de saúde em greve até 8 de junho
Sem qualquer notificação
Para o enfermeiro José Domingos, que trabalha no hospital do Mbave, também ele abrangido pela medida, a decisão do sindicato é justa, e protesta contra a forma como foi retirado da folha de pagamento.
"Sem nos informarem, fomos retirados do sistema e, até agora não sabemos as razões”, disse o enfermeiro.
Maria Pedro é técnica auxiliar de diagnóstico e terapeuta, e faz parte do grupo dos atingidos pela medida do Ministério das Finanças. Viúva e sem outra fonte de rendimentos, Maria Pedro espera que a situação seja resolvida o mais rápido possível.
"Não sei o que fazer. Sou viúva, não consigo acudir as necessidades dos meus filhos. Por outro lado, tem de haver mais respeito porque não somos respeitados. Falam connosco como querem e isso nos dói muito”, lamentou a terapeuta.
"Quem sofre é o povo"
O ativista cívico Abraão Messasa considera justas as razões evocadas pelos sindicatos para as paralisações. Messasa apela ao executivo a resolução das preocupações dos sindicatos.
"No fundo é o povo que sofre. Os grevistas têm toda razão. É de louvar a iniciativa destas greves, porque está a crescer o movimento de cidadania. Outrossim, o povo é que sofre porque são os pacientes por atender que ficam abandonados. Se o próprio serviço em si, em atividade já é difícil, imagine sem estes serviços”, explicou Messasa.
A DW, tentou, por todos meios, entrar em contacto com a direção provincial da saúde, mas ninguém ligado aquele departamento aceitou falar.
A cidade do Huambo está transformada, nos últimos dias, num palco de manifestações de vária índole. Este fim de semana, por exemplo, um grupo de jovens pretende manifestar-se no domingo, contra a governação de João Baptista, que acusam de nepotismo.
Artivismo: a arte política de André de Castro
O papel político da arte é o mote de "Liberdade Já", a exposição do artista brasileiro André de Castro que lembra, entre outros ativistas, os presos políticos angolanos.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
"Liberdade Já" em serigrafia
A arte pode ter uma missão política - é o que prova esta exposição de André de Castro, a primeira mostra a solo do artista visual brasileiro na Europa. Este primeiro painel à entrada da exposição, em Lisboa, é um tributo aos presos políticos angolanos. O autor deu-lhe o título de "Liberdade Já", slogan que alimentou o movimento de solidariedade internacional pela libertação dos ativistas.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
Debate sobre política internacional
Tanto este projeto "Liberdade Já" (2015) como "Movimentos" (2013-2014) tiveram repercussão mundial. O artista brasileiro destaca, através das suas obras, os jovens presos políticos de Angola, libertados em 2016. As suas imagens acabam por incentivar o debate sobre acontecimentos políticos internacionais.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Os "revús" compõem o painel…
O artista compõe o painel com "monoprints" em serigrafias repetidas. Aqui podem ver-se alguns dos jovens angolanos presos em Luanda, em 2015, por discutirem um livro sobre métodos pacíficos de protesto. Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Nuno Álvaro Dala, Nito Alves, Benedito Jeremias e Nelson Dibango, entre outros, foram julgados pelo crime de atos preparatórios para a prática de rebelião.
Foto: DW/J. Carlos
… e multiplicam-se pelo mundo digital
O luso-angolano Luaty Beirão foi escolhido como símbolo do ativismo político, dando força à exposição, com a curadoria da Muxima. Os retratos multiplicaram-se no mundo digital, foram reproduzidos em t-shirts e posters. A venda das serigrafias expostas em mostras coletivas em Lisboa e Nova Iorque, em 2016, reverteu integralmente a favor das famílias dos presos políticos angolanos.
Foto: DW/J. Carlos
Além de Angola...
Em dezembro, André de Castro comemorou com as irmãs a abertura da exposição em Lisboa, que também apresenta rostos de ativistas como José Marcos Mavungo, advogado e ativista de Cabinda. Além de Angola, o artista desafia os visitantes a revisitar o movimento da Primavera Árabe. Dá a conhecer as pessoas e as suas lutas, propondo um ângulo mais pessoal e humano na narração do momento histórico.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Arte como ator social
No interesse do público e das comunidades, o artista brasileiro assume ser um promotor social. "Ao expor 'Movimentos' e 'Liberdade Já' juntos, a mostra permite um recorte da arte como ator social, questionando intenção, receção, apropriação e estética nas ruas e na internet", afirma André de Castro. É o que mostra a coleção "Movimentos", colocada na outra parede da sala.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Coragem para mudar o mundo
Nesta segunda parede, André de Castro imortaliza várias causas em diversas partes do mundo. São mulheres e homens que recusam aceitar a forma como são tratados pelos respetivos Estados. Acreditam, tal como o autor da exposição, que o mundo pode ser muito melhor. Por isso, com coragem, decidiram sair à rua.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Identidade política dos manifestantes…
Este primeiro projeto de André de Castro, em 2013, foi selecionado para a 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e visto por mais de 40 mil visitantes, passando por Miami (2013), Nova Iorque (2014) e Brasília (2015). As serigrafias, que resultam de entrevistas realizadas através das redes sociais, retratam as identidades políticas dos manifestantes de diferentes países.
Foto: DW/J. Carlos
… e cultura das manifestações
Através das serigrafias, o artista procurou valorizar a força da ação individual dos manifestantes. Cada participante enviou uma foto de rosto, usando as redes sociais, e respondeu a uma série de perguntas sobre a sua identidade política. Assim, foram criados retratos políticos individuais que, em conjunto, formam uma mini etnografia da cultura material e imaterial das manifestações.
Foto: DW/J. Carlos
Do outro lado do mundo
Em Nova Iorque, no Zuccotti Park, a sugestão original foi ocupar Wall Street, símbolo dos capitais financeiros internacionais. Porque, afinal, foi a especulação de capitais que deu origem à crise que atormentou o mundo há anos. Questiona Daniel Aarão Reis, ao apresentar a exposição: "Como aceitar que os responsáveis não ficassem com o fardo principal das medidas de superação desta mesma crise?"
Foto: DW/J. Carlos
Novos dispositivos de mobilização
A arte política de André de Castro, que também evoca figuras como Ghandi e Martin Luther King, faz lembrar a tradição dos grandes movimentos dos anos 1960, que dispensava partidos e sindicatos. Ao invés disso, surgiram novos dispositivos de mobilização e de ação.
Foto: DW/J. Carlos
Espelho D’ Água valoriza as serigrafias
A exposição, que também será posteriormente exibida no Porto (a norte de Portugal), encontra-se no Espaço Espelho D’Água, em Lisboa. A calçada deste espaço, tipicamente portuguesa, foi construída com base numa obra do autodidata artista plástico angolano, Yonamine, que tem vivido em diversos países de África, Europa e América do Sul.