Ainda é cedo para saber o destino dos investimentos de Isabel dos Santos em Portugal, após a exoneração da empresária da Sonangol. Mas analistas reconhecem que a filha do ex-Presidente angolano poderá perder influência.
Para já, deverão ficar inalterados, comenta o diretor do Jornal Económico, Filipe Alves. As participações acionistas da empresária angolana Isabel dos Santos, considerada uma das investidoras mais poderosas em Portugal, somam mais de 3,3 mil milhões de euros, repartidos por setores estratégicos como a banca, energia e telecomunicações. Segundo Filipe Alves, a exoneração da filha de José Eduardo dos Santos pelo seu sucessor na Presidência, João Lourenço, não põe em causa o capital aplicado nesses setores.
"Creio que [Isabel dos Santos] não perde o poder, porque para isso era necessário que houvesse uma alteração radical da sua fortuna. Se houvesse uma nacionalização, um cenário mais extremo, nesse caso sim, [perderia]", afirma Alves.
A saída de Isabel dos Santos da chefia da Sonangol contribuirá, no entanto, para desfazer a ideia de que a empresária desfrutava de "alguma forma de proteção política" em Angola.
"Muitos empresários, grupos portugueses, que antes viam Isabel dos Santos como uma espécie de parceira predileta para chegar ao poder angolano deixam de a ver nesse sentido", acrescenta o jornalista.
Império em declínio?
A Sonangol, chefiada até meados do mês por Isabel dos Santos, tem uma posição acionista de peso na congénere portuguesa Galp e no Millennium BCP. Neste banco comercial português, a petrolífera é o segundo maior acionista, detendo mais de 15% do capital.
Abordado pela DW, à margem de um Fórum sobre o futuro da banca portuguesa, esta quarta-feira (29.11), Nuno Amado, presidente do Millennium BCP, evitou falar de eventuais reflexos no banco das mudanças em Angola.
"Acho que há um sinal de confiança no BCP, o que acho que é importante em termos de mercado internacional. Quanto ao reflexo das mudanças em Angola, falamos depois", resumiu.
Mas dos Santos continua a ter bastante influência noutras empresas. Além de uma parceria com a Sonaecom na ZOPT, a empresária angolana tem participações muito relevantes na empresa de telecomunicações NOS. Tem ainda participações no banco Euro BIC (Portugal) e na EFACEC, onde detém 65% do capital em parceria com a estatal Empresa Nacional de Distribuição de Eletricidade (ENDE). Na Amorim Energia, detém 45% do capital, por intermédio da Esperanza Holding, entidade controlada pela Sonangol, mas que tem igualmente Isabel dos Santos como investidora.
Império de Isabel dos Santos em Portugal em declínio?
"Menos capital para investir"
Hélder Gomes, especialista em Assuntos Africanos, afirma, no entanto, que, "ao ser exonerada em contornos humilhantes", Isabel dos Santos poderá, no futuro, ter "menos capital" para investir em Portugal. Para o analista, formado em Relações Internacionais, as ligações tentaculares da filha de Eduardo dos Santos à banca, energia, média, engenharia e mobilidade poderão ter os dias contados.
"O Presidente que cumpriu há pouco tempo os primeiros 50 dias à frente dos destinos da República de Angola parece apostado em desfazer tudo aquilo que Isabel dos Santos fez - por exemplo à frente da Sonangol, que ele apelidou como 'a galinha dos ovos de ouro' de Angola", diz.
Na opinião de Gomes, é de se prever também uma menor presença acionista de capital angolano em Portugal, com impacto na bolsa portuguesa.
"Eu diria que ainda é cedo para aferir esse impacto bolsista. Agora, não tenho dúvidas de que alguma coisa irá mudar uma vez que a estrutura da Sonangol mudou", diz o analista, acrescentando que "uma vez que também João Lourenço quer aumentar a concorrência nas telecomunicações e nos cimentos, outros dois setores onde Isabel dos Santos tem empresas líder em Angola, acho que as coisas podem, de facto, alterar-se."
O especialista não tem dúvidas quanto à diminuição da forte influência de Isabel dos Santos no investimento em Portugal, o que poderá também afetar a vida de muitas empresas portuguesas, por exemplo no setor dos média.
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.