Instabilidade política ameaça segurança na Somalilândia
Maria Gerth-Niculescu | rl
21 de dezembro de 2019
O adiamento das eleições parlamentares na Somalilândia e a crescente repressão da liberdade de expressão estão a agitar o cenário político e a ameaçar a segurança na região.
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A Somalilândia é uma região autoproclamada independente que luta há vários anos pelo reconhecimento internacional. Apesar de realizar eleições presidenciais frequentemente, a votação para o Parlamento não se realiza neste território desde 2005.
O recente adiamento das legislativas para 2022 provocou descontentamento, tanto na oposição, como nos jovens, que não se revêm na atual governação.
"Temos uma geração inteira incapaz de eleger os seus próprios representantes, porque todos os que têm menos de 30 anos não eram elegíveis para votar em 2005, quando o nosso Parlamento foi eleito", diz Guleid Ahmed Jama, advogado e analista político.
"Há um distanciamento entre as autoridades eleitas e a maioria da população que está a sofrer por causa do desemprego e de outras questões sociais", acrescenta.
Falta de união
Apesar desta realidade, a ativista dos Direitos Humanos, Rakiya Omaar, afirma que, a seu ver, os jovens ainda não estão unidos país. "[É verdade que] a percentagem de jovens é enorme, mas isso não significa que eles tenham peso político. Infelizmente não se organizam como um todo em torno das suas agendas políticas… [Por isso] e até que o façam, que tomem a iniciativa de superar as divisões (…) e se divorciem dos partidos políticos, não acho que vá mudar muita coisa”, critica.
As eleições legislativas estavam agendadas para dezembro de 2019, mas foram adiadas por divergências entre os partidos sobre a nova Comissão Nacional de Eleições.
O principal partido da oposição, Waddani, acusa o partido no poder, Kulmiye, de nomear membros tendenciosos para o organism. Em protesto pelo adiamento das parlamentares, a oposição convocou uma manifestação na sede do partido na capital Hargeisa. O protesto acabou por ser reprimido.
"A polícia usou uma força excessiva e disparou tiros. O secretário-geral do nosso partido, o porta-voz e alguns membros foram presos e libertados uma semana depois. Para nós, tratou-se de uma prisão ilegal porque, como membros da oposição, temos o direito de criticar o governo, como acontece em qualquer democracia no mundo”, afirmou Abdirahman Mohamed Abdillahi, presidente do Waddani.
Somalilândia: Instabilidade política ameaça segurança no território
O partido no poder nega a repressão contra o protesto da oposição e diz que a culpa pelo adiamento da votação é do partido Waddani.
Ameaça terrorista
Algumas organizações de defesa dos Direitos Humanos alertam que o aumento das prisões e detenções arbitrárias de jornalistas e figuras da oposição podem ameaçar a democracia nacional.
Também o advogado e analista político Gulei Ahmed defende que a instabilidade política pode custar à Somalilândia a segurança do território, uma vez que o Estado está muito próximo da Somália, onde grupos terroristas como o Al-Shabaab estão ativos.
Laas Geel: pinturas milenares na Somalilândia
Estas formações rochosas na Somalilândia abrigam algumas das mais antigas pinturas rupestres em África. As cavernas de Laas Geel são uma janela para o passado.
Foto: DW/J. Jeffrey
Se gosta de arte antiga, é por aqui
"Estas são das mais importantes pinturas rupestres no leste de África", explica Xavier Gutherz, um arqueólogo francês que mostrou ao mundo as cavernas de Laas Geel em 2002. São importantes "pela grande quantidade e qualidade dos painéis e pela singularidade das representações do gado e das pessoas." As cavernas ficam a 55 quilómetros a nordeste da capital da Somalilândia, Hargeisa.
Foto: DW/J. Jeffrey
Um segredo local
"Os habitantes conheciam as cavernas, mas evitavam-nas porque não entendiam o que eram e tinham receio", explica Abdisalam Mohamed, especialista em turismo da Somalilândia. Há cerca de 12 abrigos pintados ao longo de um afloramento granítico por cima de dois cursos de água secos. Quando chove, enchem-se de água. Daí o nome do local: "Laas Geel", um bebedouro de camelos.
Foto: DW/J. Jeffrey
Terra de pastores
O local abrigado e o clima da região preservaram as pinturas, que têm entre 5.000 a 10.000 anos. As imagens mostram figuras humanas a beber leite das vacas e a viver da pastorícia, explica Abdisalam. Segundo especialistas, Laas Geel é prova de que este estilo de vida já existira no Corno de África milhares de anos antes de chegar à Europa ocidental.
Foto: DW/J. Jeffrey
Obra do diabo
"Quando eu era pequeno, pensávamos que estas pinturas estavam ligadas ao diabo", conta Musa Abdi, de 57 anos, que andou toda a vida por Laas Geel. Hoje em dia, Musa ajuda a proteger o local. "Agora sei o que são. São agora parte de mim. Se este se local ficar mais conhecido, talvez ajude ao reconhecimento da Somalilândia como país."
Foto: DW/J. Jeffrey
A ponta do "icebergue"
Alguns destas formações rochosas contêm 350 pinturas. E há mais noutros sítios. A arqueóloga somali Sada Mire observou cerca de 100 locais com pinturas rupestres na Somalilândia. Incluindo em Dhagax Khoure, a 45 quilómetros a noroeste de Hargeisa, e Dhambalin, a 100 quilómetros a leste da cidade costeira de Berbera. Provavelmente, existirão outros 1.000 locais por descobrir, diz a especialista.
Foto: DW/J. Jeffrey
Difícil de encontrar
Laas Geel fica fora da principal estrada asfaltada, entre Hargeisa e Berbera - esta zona poderá ser um potencial destino turístico, devido às praias cristalinas e ao seu centro histórico, com arquitetura otomana. Mas só é acessível aceder a Laas Geel através de uma estrada acidentada, que pode não agradar a muitos turistas.
Foto: DW/J. Jeffrey
Animais que desapareceram
As girafas já não andam por aqui, devido ao clima árido e às formações rochosas, mas ainda aparecem nas pinturas rupestres de Laas Geel (no cimo da fotografia, à esquerda). Estas imagens sugerem que houve uma mudança de clima. Abdisalam aponta para aquilo que serão chacais ou hienas que parecem perseguir a girafa.
Foto: DW/J. Jeffrey
Mais pessoas podiam vir aqui
Laas Geel atrai alguns turistas estrangeiros e membros da diáspora da Somalilândia. "Quando os turistas vão à Etiópia, também pedem para vir aqui", diz Khalid Muhamed, um agente turístico da região. O estado semi-autónomo ainda é alvo da instabilidade política na região. Espera-se que este local possa atrair muito mais pessoas no futuro.
Foto: DW/J. Jeffrey
À espera de título da UNESCO
Uma equipa da UNESCO visitou Laas Geel, mas o local não pôde receber o título de Património Mundial porque a Somalilândia não é reconhecida pelas Nações Unidas e a Somália não ratificou a Convenção para a Proteção do Património Mundial, Cultural e Natural de 1972. O Governo da Somalilândia não disponibilizou dinheiro para proteger as pinturas, e algumas começam a deteriorar-se.
Foto: DW/J. Jeffrey
Perguntas sem resposta
O sol põe-se em Laas Geel - até hoje, um local de mistérios. Ninguém sabe qual era o objetivo de quem pintou estas figuras. Talvez elas tenham resultado de rituais, sugere o arqueólogo Gutherz. Milhares de anos depois, é impossível saber ao certo.