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Inteligência artificial pode revolucionar saúde em África?

Frederick Schwaller
28 de dezembro de 2023

Especialistas consideram que a inteligência artificial pode beneficiar o setor da saúde em África e colmatar grandes lacunas na prestação de cuidados e mão-de-obra, se as barreiras infraestruturais forem ultrapassadas.

O médico e técnico de laboratório Gabriel Fernando Castigo realizou testes laboratoriais na cadeia de máxima segurança de Maputo, em novembro de 2023
O médico e técnico de laboratório Gabriel Fernando Castigo realizou testes laboratoriais na cadeia de máxima segurança de Maputo, em novembro de 2023Foto: Alfredo Zuninga/AFP

A inteligência artificial (IA) tem sido apontada como um fator de transformação dos cuidados de saúde em todo o mundo, não apenas em países com rendimentos mais elevados, como os EUA e a China.

Em África, a inteligência artificial está a ser utilizada em todo o continente para melhorar os cuidados de saúde, desde a gestão de bases de dados em Marrocos à leitura de genomas na África do Sul, passando pelo rastreio da Covid-19 na Etiópia ou pela análise de exames médicos no Gana.

"Nos últimos três anos, assistiu-se a um boom de pessoas que utilizam a IA para resolver problemas de saúde no continente", afirma Ayomide Owoyemi, especialista em saúde pública e tecnologia da Universidade de Illinois, nos EUA.

A tecnologia está a ajudar a lidar com os maiores desafios da região em matéria de cuidados de saúde, incluindo a malária, a tuberculose e o VIH/SIDA.

Diagnóstico da tuberculose em Moçambique

O diagnóstico de doenças tem sido, até agora, dos projetos de IA mais bem-sucedidos.

Em Moçambique, por exemplo, os profissionais de saúde testaram a IA como forma de detetar a tuberculose numa prisão de alta segurança. Utilizaram máquinas de raios X portáteis ligadas a um programa de IA para diagnosticar a doença em pessoas em menos de cinco minutos, e com tanta precisão como os médicos.

"Foi a primeira vez que se demonstrou que esta abordagem da inteligência artificial pode funcionar nas prisões. Agora, tem de ser alargada a todos os que dela necessitam e, em última análise, a todo o país", considera Suvanand Sahu, diretor executivo adjunto da StopTB, que liderou o projeto em Moçambique.

A OMS estima que 10 milhões de pessoas desenvolvem a doença a nível mundial todos os anos, mas cerca de 3 milhões de pessoas não estão a receber os cuidados de saúde de que necessitam.

"A tuberculose é a maior causa de morte entre todas as infecções e, embora a incidência global esteja a diminuir, não está a diminuir tão rapidamente como gostaríamos. A tecnologia está a evoluir e há muitas utilizações para ela nos cuidados de saúde - a redução do impacto global da tuberculose é uma delas", disse Sahu à DW.

Programa-piloto utilizou inteligência artificial para detetar tuberculose numa prisão de MoçambiqueFoto: Alfredo Zuninga/AFP

Colmatar a falta de médicos

Um dos maiores benefícios da inteligência artificial em África é ajudar os profissionais de saúde a fazer mais com recursos limitados.

A IA pode preencher a lacuna deixada por médicos e outros profissionais de saúde altamente qualificados que deixam o continente para trabalhar noutras partes do mundo, disse à DW Ayomide Owoyemi.

"Um dos maiores desafios que enfrentamos atualmente no continente é o facto de os países não conseguirem manter a mão de obra no setor da saúde. A Nigéria perde muitos médicos que vão para países mais ricos. É uma batalha que não podemos ganhar porque as pessoas mudam-se para locais onde o salário é melhor", acrescenta o especialista.

O baixo número de médicos significa que a maioria das pessoas que atualmente presta cuidados de saúde básicos são trabalhadores comunitários.

"O que a IA pode fazer é aumentar o número de profissionais de saúde menos qualificados que têm estado a prestar cuidados de saúde. Isto é essencial nos próximos anos porque vamos continuar a perder médicos", conclui Owoyemi.

Manter os projetos em África

Um grande desafio é manter os benefícios dos projetos a longo prazo. Segundo Owoyemi, até agora, a maioria dos projetos na área da saúde foram estudos-piloto que raramente se traduziram em mudanças de longo prazo no sistema.

"Os programas são, na sua maioria, financiados por dois ou três anos a partir do estrangeiro e utilizam mão de obra externa. Depois disso, fazem as malas e vão-se embora. Mas se os governos africanos receberem financiamento, podem criar organizações e políticas que garantam que o programa se mantém vivo durante o máximo de tempo possível", afirma.

Para o especialista, é importante que os países africanos comecem a criar fundos e agências específicas para gerir a integração a longo prazo da IA nos sistemas de saúde.

Com os governos e as organizações locais na liderança, poderiam concentrar-se nas prioridades dos cuidados de saúde, com projetos de IA definidos pelas necessidades locais e não pelo que os parceiros externos ditam.

E os benefícios seriam muito mais vastos. Os projetos de cuidados de saúde com IA necessitam de trabalhadores qualificados e com formação, em setores como a informática, a educação e a energia.

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Desafios de infraestruturas

A implementação de mais programas de cuidados de saúde traz muitos desafios. Um deles é a infraestrutura limitada: grandes partes de África não têm suficiente acesso à Internet para executar projectos de IA em grande escala.

"A maior dificuldade é implantar sistemas de computação para os profissionais de saúde. Eles trabalham em locais onde as infraestruturas são fracas: sem energia, sem computadores. Por isso, temos de ponderar como implementar a inteligência artificial", diz Owoyemi.

Outro desafio são os próprios dados. A maior parte dos algoritmos de aprendizagem automática são testados em bases de dados armazenadas fora de África, o que limita a sua utilização na resolução de problemas de saúde específicos da população africana.

Um exemplo conhecido é o da genética: 95% dos dados provêm de genomas europeus, o que limita a utilização da IA na análise de genomas de pessoas não europeias e na deteção de doenças.

Mas as perspectivas estão a melhorar. Já há programas em curso em universidades africanas e empresas privadas que recolhem dados sobre cuidados de saúde em África.

A organização StopTB, por exemplo, também está a envolver mais equipas de investigação africanas na construção de novos sistemas de IA para dar resposta a preocupações de saúde específicas da região.

E também está em curso o projeto Três Milhões de Genomas Africanos (3MAG), cujo objetivo é sequenciar os genomas de três milhões de pessoas em África. Este projeto já identificou variações genéticas em grupos etnolinguísticos em África que eram anteriormente desconhecidas.

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