Interesses obscuros causam conflitos de terras em Moçambique
Sitoi Lutxeque (Nampula)
3 de maio de 2017
A sociedade civil corrobora a posição dos bispos católicos que criticam a usurpação de terras devido a grandes projetos. O Governo desvaloriza as críticas.
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Os conflitos de terras continuam a dividir o Governo, a sociedade civil e os religiosos, sobretudo ligados à Igreja Católica. Estes dizem que têm recebido muitas queixas da população nos últimos anos.
Os bispos católicos de Moçambique endereçaram recentemente (30.04) uma carta às comunidades e às chamadas "pessoas de boa vontade" para denunciar a usurpação de terras no país. Consideram que "Moçambique está em agonia profunda" devido a problemas de terras.
"Os conflitos sobre a terra nascem por causa de interesses obscuros", afirmou à DW África o padre Cantifulas de Castro.
"Devemos acordar do nosso sono. Podem aparecer projetos muito grandes. Mas qual é a essência desses projetos? Qual é o bem que se pode encontrar nesses projetos para o povo?'', questiona Cantifulas de Castro.
São principalmente as elites políticas e económicas que continuam a beneficiar do uso da terra, aponta o padre católico.
"Quando se fala de agricultura industrializante [que ocupa extensas áreas], o que vai ganhar o pequeno [cidadão] com isso?”, questiona ainda Cantifulas de Castro. É necessário "batalharmos pela defesa da nossa terra e pela promoção dos direitos humanos", defende o padre.
Na província de Nampula, no norte de Moçambique, há muitas empresas que ocuparam extensas áreas de terra, afirma o padre Cantifulas de Castro. Para isso, os nativos foram, de alguma forma, expulsos das suas terras sem receber qualquer benefício em troca.
"Estamos numa eminência de morte, pode não ser uma morte física, mas o coração vai sentindo que realmente estamos a ser estrangeiros na nossa própria terra'', diz Cantíflus de Castro. Em jeito de apelo acrescenta: "O povo não deve aceitar, de ânimo leve, conceder ou entregar a sua terra''.
Fecha-se os olhos às leis em nome de interesses
A falta de implementação e fiscalização da legislação sobre a terra continua a dar espaço às elites políticas e governamentais nos negócios relacionados com a terra, sublinha António Lagres, oficial de programas da Solidariedade Moçambique, organização não-governamental que defende os direitos das comunidades na província de Nampula, norte do país."Temos políticas públicas bem desenhadas e temos mecanismos que punem, mas o que estamos a fazer é fechar os olhos para não se fazer cumprir as leis, deixando espaço para as pessoas fazerem e desfazerem'', lamenta António Lagres.
Terras - MP3-Mono
Autoridade refuta críticas
Bernardo Alide, diretor provincial de justiça, assuntos constitucionais e religiosos, é cauteloso ao comentar a situação de perda de terras por parte das comunidades.
Para Bernardo Alide, o Governo moçambicano não viola os direitos humanos nem apoia a usurpação de terras pertencentes às comunidades.
"A lei de defesa dos direitos humanos já existe, é só observarmos o que diz. Portanto, eu penso que esse pronunciamento [da Igreja Católica] não está em concordância com aquilo que se vive na comunidade. Hoje em dia, as comunidades sabem dizer o que é que têm que fazer em relação aos direitos humanos'', afirmou Bernardo Alide.
Refira-se que a Constituição da República de Moçambique de 2004 diz no seu artigo 109º que "a terra é propriedade do Estado''. No entanto, com as enormes descobertas de recursos naturais e minerais, as comunidades continuam a queixar-se dos parcos benefícios que contemplam as pessoas que tiveram de abandonar as suas terras para dar lugar à implementação dos chamados megaprojetos de exploração de recursos.
África exige justiça ambiental
Cientistas dizem que a Terra poderá aquecer até quatro graus até ao fim do século. A África já sofre com o aquecimento global. Caso não se combata a alteração do clima, as consequências serão desastrosas.
Foto: Getty Images/AFP/S. Maina
Há cada vez menos água em África
Segundo o Banco Mundial, basta um aquecimento do clima de dois graus centígrados para que caia menos um terço de chuva em África. O que terá como consequência um aumento das secas. Na seca extrema de meados de 1990, os pastores etíopes perderam cerca de metade do seu gado.
Foto: Getty Images/AFP/S. Maina
Chuva a mais
Futuramente as chuvas poderão aumentar no leste da África. Mas serão chuvas torrenciais concentradas em poucos dias e não regulares e distribuídas pelo ano. Em 2011, a cidade portuária tanzaniana Dar-es-Salam foi surpreendida por fortes quedas de chuva, que submergiram bairros inteiros. Pelo menos 23 pessoas morreram, outras 10 000 tiveram que abandonar as suas casas.
Foto: cc-by-sa-Muddyb Blast Producer
Colheitas falhadas
Em África cerca de 90% dos produtos agrários são cultivados por pequenos agricultores. Caso não se reforce marcadamente a sua resistência contra o aumento de secas e enchentes, mais 20% pessoas do que hoje vão passar fome, alerta a Organização das Nações Unidas.
Foto: Getty Images/AFP/A. Joe
Riscos para a saúde
Já hoje a alimentação deficiente por causa de colheitas fracas representa um problema em muitos países. Muitas pessoas mudam-se para os bairros de lata das grandes cidades, onde doenças como a cólera se espalham rapidamente. Um aumento da temperatura poderá fazer disparar a incidência de doenças como a malária, inclusive nos planaltos africanos, onde, até agora, a maleita não existe.
Foto: Getty Images/S. Maina
Extinção das espécies
O aumento da temperatura influencia eco sistemas completos. Muitos animais e plantas não se conseguem adaptar suficientemente depressa. Segundo um relatório do Conselho Mundial do Clima, entre 20% a 30% de todas as espécies estão ameaçadas de extinção por causa da mudança do clima.
Foto: CC/by-sa-sentouno
O Kilimanjaro sem neve
A manta de neve do monte Kilimanjaro tem 12 000 anos. Nos últimos 100 anos derreteu mais de 80% do seu gelo. Caso prevaleçam as condições atuais, o gelo no Kilimanjaro desaparecerá entre 2022 e 2033, calcula uma equipa de cientistas do Estado federado do Ohio, nos Estados Unidos da América. A seca e a falta de chuva levam a que o gelo derreta rapidamente.
Foto: Jim Williams, NASA GSFC Scientific Visualization Studio, and the Landsat 7 Science Team
Só quando a última árvore for abatida ...
A mudança do clima deve-se, sobretudo, aos carros, centrais de energia e fábricas na Europa, América e Ásia. Mas o abate de árvores em muitas florestas africanas, por exemplo, para produzir carvão vegetal, aumenta o CO2 na atmosfera e contribui para o esgotamento dos solos. Em tempos, um terço da superfície do Quénia era floresta, hoje são apenas 2%.
Foto: Getty Images/AFP/T. Karumba
Muda a muda cresce a floresta
Hoje, muitas pessoas já se aperceberam da necessidade de medidas para contrariar este desenvolvimento nefasto. Há algumas décadas, cidadãos empenhados no Quénia começaram a plantar novas árvores, contribuindo para que a superfície florestal crescesse para 7%. As árvores impedem que a chuva leve a preciosa terra arável e retiram os gases de efeito de estufa da natureza.
Foto: DW/H. Fischer
Proteção através da diversidade
As monoculturas são vulneráveis a secas e animais daninhos. Se forem plantadas diversas frutas lado a lado, a colheita fica assegurada, mesmo que uma espécie falhe. Segundo o Programa Ambiental das Nações Unidas, a agricultura ecológica aumenta também bastante mais a resistência às consequências da mudança do clima do que a agricultura convencional.
Foto: Imago
Menos palavras, mais ação
Reservas subterrâneas de água da chuva, seguros contra o risco de colheitas falhadas: há muitas maneiras de, pelo menos, amenizar as consequências do aquecimento global. A assistência ao desenvolvimento e a protecção do clima não podem ser separadas, exigiram, recentemente, os delegados numa conferência das Nações Unidas. Mas não houve promessas concretas de assistência.
Foto: picture alliance/Philipp Ziser
Paris desperta expectativas
“Justiça ambiental, já!” exigiram os manifestantes na Conferência do Clima das Nações Unidas em Durban, na África do Sul, em 2011. Agora o mundo aguarda a conferência que se realiza em Paris no fim de 2015. Está planeada a assinatura de um acordo global sobre o clima, com o objetivo de limitar o aquecimento global a dois graus centígrados e reduzir as consequências nefastas da mudança do clima.