Irregularidades na Conta Geral do Estado de Moçambique
Leonel Matias (Maputo)
12 de abril de 2018
Tribunal Administrativo moçambicano aponta várias irregularidades na Conta Geral do Estado de 2016, como divergências nos dados das receitas e nos registos dos impostos. RENAMO questiona: Quem ficou com os dividendos?
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Na lista de irregularidades elaborada pelo Tribunal Administrativo consta também a ausência de registos das receitas dos dividendos efetivamente pagos ao Estado.
Aponta também para a existência de divergências nos registos dos impostos, assim como nos montantes sobre os desembolsos e reembolsos de empréstimos resultantes de acordos de retrocessão.
Por outro lado, algumas entidades de âmbito central não declararam a cobrança de receitas próprias previstas no Orçamento. Na indústria extrativa, os custos recuperáveis reportados por grandes empresas envolvidas na exploração do gás continuam sem serem certificados.
O tema esteve em debate esta quarta (11.04) e quinta-feira (12.04) no Parlamento, em Maputo, e dividiu as bancadas, com a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO, no poder), a considerar que o mesmo espelha a execução do Orçamento de 2016, enquanto a oposição defendeu a sua reprovação.
Onde estão os dividendos?
Para o deputado Samo Gudo, da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o principal partido da oposição, face às irregularidades avançadas pelo Tribunal Administrativo é caso para perguntar: "Quem é que ficou com os dividendos, onde estão?"
O Governo afirmou que estão em curso várias medidas com vista a garantir maior transparência e o reforço da gestão da coisa pública.
Irregularidades na Conta Geral do Estado de Moçambique
Por seu turno, o deputado Silvério Ronguane, do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), considerou que constitui igualmente motivo de apreciação negativa da Conta Geral do Estado o facto de o relatório reconhecer que o Produto Interno Bruto (PIB) desceu para 3.8% e a inflação média subiu em flecha para 19,9%. "Chumbar, assim, não dá", sublinhou.
A bancada da FRELIMO sublinhou que 2016 foi um ano atípico. "Mesmo assim, o Governo, por via de esforços, garantiu todas as despesas sociais básicas para as populações", sublinhou o deputado Daniel Teixeira.
Segundo o primeiro-ministro, Carlos Agostinho do Rosário, "não obstante esta situação atípica a nossa política orçamental continuou a privilegiar a alocação em média de 60% da despesa pública a setores prioritários que inclui a educação, saúde e abastecimento de água."
Ainda as dívidas ocultas
A oposição fez questão de sublinhar que o debate da Conta Geral do Estado de 2016 acontece numa altura em que o país atravessa uma crise causada pelas dívidas ocultas contraídas por três empresas em 2013 e 2014, com garantias do Estado e sem o conhecimento do Parlamento e dos parceiros internacionais.
Acusaram o Governo de estar alegadamente a negociar com os credores a reestruturação da dívida com promessas de pagamento, com base nas receitas que vão resultar da venda de gás em 2022 e 2023. A oposição disse que os moçambicanos recusam-se a pagar esta dívida e exigiu a divulgação do relatório de auditoria a estas dívidas e a responsabilização dos infratores.
Por seu turno, o ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, defendeu o diálogo permanente com os credores argumentando que a dívida não vai desaparecer enquanto não for alcançado um acordo sobre a matéria.
O país está a negociar neste momento com os credores 17% do stock total da dívida, que "representa 41% do serviço da dívida", avançou Maleiane. "Analisamos em função das capacidades do país para servir a educação, saúde e tudo isso. E estamos a dizer que não é possível neste momento fazer este pagamento. Então, temos que encontrar alguma saída", declarou o ministro.
Moçambique: O que foi feito ao dinheiro destas obras?
É a pergunta de vários cidadãos de Massinga, província moçambicana de Inhambane. Cada vez há mais obras na vila, que nunca chegam ao fim.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras atrasadas
As obras arrastam-se no município de Massinga, sul de Moçambique, e os cidadãos querem saber porquê. Os empreiteiros ganham obras de construção civil na região, mas muitas são abandonadas após ser pago 50% do dinheiro para a sua execução, segundo o Conselho Municipal. A Justiça já notificou alguns empreiteiros para explicarem os atrasos, mas as estradas e avenidas continuam em péssimas condições.
Foto: DW/L. da Conceição
Mercado por construir
A União Europeia e a Suécia financiaram a construção de um mercado grossista em Massinga. Segundo a placa de identificação, as obras começaram a 28 de setembro de 2017 e deviam ter terminado a 28 de janeiro, mas até agora estão assim. O município remete as responsabilidades para o empreiteiro; contactada pela DW, a empresa negou explicar o motivo do atraso nas obras.
Foto: DW/L. da Conceição
Jardim perdido
O Conselho Municipal de Massinga gastou mais de 1,5 milhões de meticais (20.000 euros) para construir aqui um jardim etnobotânico - um projeto com a participação do Governo central e da Universidade Eduardo Mondlane. Mas as plantas colocadas aqui desapareceram e o terreno está abandonado. O Município promete que o jardim voltará a funcionar em breve, embora falte água para regar as plantas.
Foto: DW/L. da Conceição
Estrada sem fim à vista
Os trabalhos neste troço de cinco quilómetros duram há mais de três anos. O município de Massinga culpa o empreiteiro pela demora; a DW tentou contactar a empresa, sem sucesso. Segundo o município, aos 4,8 milhões de meticais (63 mil euros) pagos inicialmente ao empreiteiro foram acrescentados outros 3,9 milhões (51 mil euros) para continuar as obras, que deviam ter terminado em outubro.
Foto: DW/L. da Conceição
Estrada acabada?
25 de setembro de 2017 era a data de "entrega" desta estrada, segundo a placa de identificação. Mas a via, que parte da EN1 até ao povoado de Mangonha, continua em estado crítico. A obra está orçada em cerca de 1,9 milhões de meticais (quase 25 mil euros). Tanto a Administração Nacional de Estradas, delegação de Inhambane, como o Conselho Municipal recusaram comentar este assunto.
Foto: DW/L. da Conceição
Mais obras por acabar
Os trabalhos da pavimentação desta avenida também já deviam ter terminado, mas as obras continuam. O custo: cerca de 3,9 milhões de meticais (cerca de 51 mil euros). Mas a avenida continua por pavimentar. A DW tentou perguntar o motivo da demora à empresa Garmutti, Lda, responsável pela execução da obra, sem sucesso.
Foto: DW/L. da Conceição
Falta transparência
Segundo o regulamento de contratação de empreitadas de obras públicas, nos locais de construção devem constar as datas de início e do término dos trabalhos. Mas não é isso que acontece aqui. Segundo um relatório do governo local, um ano depois desta obra começar, só 30% dos trabalhos foram concluídos. O empreiteiro está incontactável; a empresa não tem escritório em Inhambane.
Foto: DW/L. da Conceição
Fatura sobre fatura
O orçamento inicial para os trabalhos de reabilitação no Hospital Distrital de Massinga rondava os dois milhões de meticais (cerca de 26 mil euros), mas, meses depois, o custo aumentou 600 mil meticais (8.000 euros).
Foto: DW/L. da Conceição
Edifício milionário
Este edifício custou à edilidade mais de 40 milhões de meticais (acima de 500 mil euros), sem contar com os equipamentos novos - cadeiras, secretárias ou computadores. Alguns empreiteiros acham estranho que tenha custado tanto dinheiro, porque o material de construção foi adquirido na região. Em resposta, o município justifica os custos com a necessidade de garantir o conforto dos funcionários.
Foto: DW/L. da Conceição
Adjudicações continuam
O município de Massinga continua a adjudicar novas empreitadas apesar de muitas obras não terem terminado. Vários residentes dizem-se enganados pelo edil, Clemente Boca, por não cumprir as promessas eleitorais.
Foto: DW/L. da Conceição
Campo por melhorar
Todos os anos, a Assembleia Municipal de Massinga aprova dinheiro para melhorar este campo de futebol, mas o campo continua a degradar-se. Segundo membros da assembleia, o dinheiro "sai" dos cofres públicos, mas nada muda e os jogadores "sempre reclamam". Em cinco anos, terão sido gastos 30 mil meticais (cerca de 400 euros). Nem o edil, nem os gestores do campo dizem o que foi feito ao dinheiro.
Foto: DW/L. da Conceição
"Fazemos sozinhos"
Devido à demora na construção de mercados e bancas, os residentes da vila de Massinga têm feito melhorias por conta própria, para manterem os seus produtos em boas condições. Questionados pela DW, os vendedores disseram que preferem "fazer sozinhos", porque se esperarem pelo município nunca sairão "do sol, da chuva e da poeira".