O líder do maior partido da oposição em Angola criticou esta quarta-feira o discurso que José Eduardo dos Santos fez no Parlamento no início da semana. O país enfrenta graves desequilíbrios, sublinha Samakuva.
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O presidente da União Nacional para a Independência de Angola (UNITA), o maior partido da oposição angolana, Isaías Samakuva, proferiu na tarde desta quarta-feira (19.10) uma réplica ao discurso sobre o estado da nação que o Presidente da República, José Eduardo dos Santos, fez segunda-feira no Parlamento.
Em conferência de imprensa, Samakuva teceu duras criticas ao chefe de Estado, a quem acusa de adotar uma política de empobrecimento dos angolanos e de apadrinhar a corrupção no país. Isaías Samakuva considera irrealistas as declarações à nação feitas pelo Presidente José Eduardo dos Santos sobre o processo de construção de um país democrático e reconciliado.
"Os angolanos esperavam que, finalmente, ele (José Eduardo dos Santos) dissesse como vai isentar esse combate. Mas sobre isto o chefe de Estado nada disse. Porquê? Porque ele ainda não descobriu como isentar esse combate contra si próprio".
Desiquilíbrios no Estado angolano
Para Isaías Samakuva, Angola enfrenta graves desequilíbrios, como mostram os níveis de desemprego, a ausência de liberdade de imprensa e de expressão, os altos níveis de corrupção e a não responsabilização dos agentes envolvidos em atos de corrupção.
"As fragilidades do Estado ficaram demonstradas pelas debilidades do sistema de saúde, pela institucionalização dos crimes de suborno, peculato, branqueamento de capitais e corrupção, pela não responsabilização dos agentes públicos envolvidos, pela incapacidade de prestar serviços básicos a população e de cumprir satisfatoriamente as tarefas fundamentais do Estado estabelecidas pela Constituição", pontuou Samakuva.
Na sua crítica ao Presidente da República, Isaías Samakuva diz que a democracia no país invabiliza-se devido à "prostituição da economia".
"É verdade que os acionistas das empresas beneficiam do protecionismo do Estado e dos grandes contratos públicos são os próprios governantes. Mas os angolanos devem saber também que esse processo de consolidação do Estado por via da estrutura prostituída da sua economia política, serviu principalmente para inviabilizar a democracia".
Discurso do Presidente difere da realidade
José Eduardo dos Santos traçou um cenário positivo, apesar da sua desaceleração económica provocada pela baixa do petróleo no mercado internacional e pela falta de divisas. Mas para Isaías Samakuva, a crise económica resulta da concepção errada de Angola, adotada desde 2002 pelo regime de Luanda.
Por essa razão, o líder da UNITA assegura que o sistema financeiro angolano está desacreditado. "Está desacreditado porque tanto facilita os roubos ao erário público, a fuga de capitais e lavagens de dinheiros, como não tem liquidez e não garante o acesso legítimo às divisas a esmagadora maioria dos angolanos", afirmou Samakuva.
19.10.16 UNITA/Samakuva críticas - MP3-Stereo
Apesar da propaganda de que Angola está sempre a subir, as famílias angolanas continuam cada vez mais pobres e sofredoras, sublinha o líder da oposição.
Segundo o líder da UNITA, "as famílias sentem que estão cada vez mais mais pobres". Ele disse ainda que "as famílias sentem que os preços é que estão a subir, a divida pública é que está a subir, a corrupção é que está a subir, a repressão é que está a subir".
Quanto aos objetivos do milénio que o Presidente da República disse ter cumprido, Samukuva pergunta se José Eduardo dos Santos vive mesmo em Angola: "No que diz respeito a setores como o emprego formal, o abastecimento de energia e água potável, a saúde e saneamento do meio, a educação e a formação profissional entre outros, é caso para perguntarmos se o Presidente da República vive mesmo nesta Angola e se falou mesmo deste país".
O presidente da UNITA denunciou ainda a existência de um Estado paralelo criado pelo Presidente José Eduardo dos Santos para a manutenção do seu poder. "Para que o registo eleitoral em curso e as eleições gerais que vamos preparar se pautem pela lisura e transparência, é necessário que o chefe de Estado e comandante-em-chefe das Forças Armadas, respetivamente, ordene ao Titular do Poder executivo e à Casa Militar do Presidente da República para deixarem de intervir no exercício das competências constitucionais da Comissão Nacional Eleitoral", concluiu.
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".