Filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos admitiu esta semana a possibilidade de ser candidata às eleições gerais de 2022. Constitucionalista não vê inconvenientes, mas ativista suspeita de possível "vingança".
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Numa entrevista concedida à cadeia televisiva portuguesa RTP, na quarta-feira (15.01), a empresária angolana Isabel dos Santos deixou em aberto a possibilidade de se candidatar à Presidência da República nas eleições gerais de 2022.
Em declarações à DW África, o constitucionalista angolano Manuel Pinheiro diz que "não vê qualquer inconveniência". A dupla nacionalidade de Isabel dos Santos é o ponto que tem provocado mais polémica. Mas o jurista esclarece que o impedimento previsto na lei angolana não se coloca no seu caso porque a empresária tem cidadania originária de dois países: Angola e Rússia.
"Mesmo a própria Constituição proíbe a cidadania adquirida. Adquirida por naturalização, por adoção, por casamento ou por regularização extraordinária por prestação de serviços relevantes a qualquer país. Ela não se enquadra em nenhum destes casos. Ela é cidadã de origem angolana e é cidadã de origem ao que se diz de uma cidadã russa", explica.
Estado angolano vs. Isabel dos Santos
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Os candidatos às eleições presidenciais em Angola devem ser os cabeça de lista de um partido ou coligação de partidos, de acordo com a lei.
Manuel Pinheiro não vê a possibilidade de Isabel dos Santos concorrer na lista do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), o partido no poder. Assim, segundo o jurista, caso reúna as condições, a multimilionária poderá concorrer por outra força política.
"Penso que está descartada qualquer possibilidade de ela ser a candidata do MPLA, uma vez que o MPLA já tem uma direção e tem um candidato [João Lourenço], que inclusivamente já manifestou a sua pretensão de se candidatar à sua sucessão em 2022", sublinha.
"Isabel dos Santos é uma fera ferida"
Porque pretende Isabel dos Santos candidatar-se ao cargo de Presidente da República de Angola? O ativista e investigador Nuno Álvaro Dala, do caso "15+2", aponta três cenários possíveis: a suposta cisão que se regista no seio do MPLA, dar continuidade ao legado do seu pai José Eduardo dos Santos e "um plano de vingança política que visa naturalmente fazer sentir toda uma vontade em conseguir o poder para promover transformações".
Depois do arresto das suas contas, lembra o ativista, "Isabel dos Santos é uma fera ferida".
Outra pergunta que se faz na sociedade angolana é se Isabel dos Santos terá aceitação popular em função da imagem do seu pai, associada a atos de corrupção e má gestão da coisa pública. Nuno Dala não tem dúvidas de que a empresária "partirá em desvantagem caso venha a candidatar-se".
"Ela é um exemplo acabado daquele processo que beneficiou um pequeno grupo que se enriqueceu de uma forma bastante violenta e, naturalmente pornográfica e imoral. Não existe autoridade moral nem ética em Isabel dos Santos, porque a sua riqueza foi construída à custa de todo um sacrifício de um povo", critica.
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.