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Tarifas: Angola e Moçambique arriscam cair numa "armadilha"

18 de junho de 2025

A China quer eliminar tarifas aplicadas às importações provenientes dos países africanos. O economista Yuri Quixina alerta que Angola e Moçambique arriscam cair numa armadilha se não desenvolverem o setor industrial.

Fórum China-África, 2024
A China é o principal parceiro comercial do continente africano. A decisão de Pequim surge num momento em que os produtos africanos enfrentam possíveis aumentos tarifários nos EUAFoto: Zhai Jianlan/picture alliance/Xinhua News Agency

A China declarou estar preparada para eliminar as tarifas aplicadas às importações provenientes dos 53 países africanos com os quais mantém relações diplomáticas, bem como novas medidas para facilitar o acesso de produtos africanos ao seu mercado. A decisão de Pequim surge num momento em que os produtos africanos enfrentam possíveis aumentos tarifários nos EUA.

De acordo com a Oxford Economics, Angola e a República Democrática do Congo eram, em 2023, os maiores exportadores africanos para a China. O país lusófono exportou quase metade (46,4%) das vendas totais para o gigante asiático, enquanto Moçambique também teve uma presença significativa, com quase 20%.

Que impactos pode ter esta decisão em Angola e em Moçambique? Em entrevista à DW, o economista angolano Yuri Quixina, membro do Conselho Económico e Social do Presidente da República, considera que a isenção de tarifas beneficia sobretudo a China, ao garantir matérias-primas baratas e novos mercados.

No entanto, o economista alerta que, sem desenvolvimento industrial, Angola e Moçambique arriscam cair numa "armadilha" de dependência.

DW África: Que impactos pode ter a isenção de tarifas chinesas nas exportações de Angola e Moçambique?

Yuri Quixina (YQ): A China vai ter uma vantagem muito interessante. Estes dois países vão exportar para a China, e a China vai receber matéria-prima a preços mais baixos para relançar a sua própria produção, no sentido de reforçar a sua competitividade a nível internacional.

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Por outro lado, Angola importa quase todos os produtos da manufatura pré-industrial da China. Há um projeto da China para abrir cidades chinesas de comércio em Luanda, algo que seguramente vai beneficiar das grandes importações. 

Moçambique também exporta matéria-prima para a China. Portanto, as exportações vão entrar quase à taxa zero, mas quem vai beneficiar claramente com essa matéria-prima a preços baixos é a China.

DW África: Existe o risco de Angola e Moçambique se tornarem excessivamente dependentes do mercado chinês?

YQ: Ambos os países dependem muito da China, mas a estratégia dos chineses é, de facto, abrir o setor comercial. 

Agora, há um elemento que eu acho interessante e que deve ser levado em consideração. Se, efetivamente, os dois países não tiverem estratégias para se relançarem internamente, através de uma reforma estrutural para explorar o talento das pessoas, no sentido de também produzirem os bens ou lançarem o setor industrial, podemos ficar cada vez mais dependentes dos bens chineses.

DW África: A decisão de Pequim surge num momento em que os produtos africanos enfrentam possíveis aumentos tarifários nos EUA. Além de uma iniciativa comercial, trata-se de uma manobra estratégica?

YQ: O poder de influência económica dos Estados Unidos em África, comparado com o da China, é menor. A China sempre esteve à frente dos Estados Unidos do ponto de vista da relação económica e comercial com África.

De acordo com a Oxford Economics, Angola e a República Democrática do Congo eram, em 2023, os maiores exportadores africanos para a ChinaFoto: Borralho Ndomba/DW

Eu penso que a ideia é procurar novos mercados, ou reativar mercados, no sentido de os produtos chineses encontrarem destinos do ponto de vista comercial, porque, se os Estados Unidos continuarem com a ideia de aumentar as tarifas à China, vão perder 30% das exportações chinesas que vão para os Estados Unidos — e essas exportações precisam de procurar novos mercados. E os novos mercados, para serem acarinhados, precisam dessa estratégia de redução de tarifas dos países africanos.

Só que, atualmente, os países africanos - como os grandes parceiros Angola, Nigéria e a África do Sul - também estão a sofrer do ponto de vista da taxa de crescimento económicoEntão, há aí, de facto, uma armadilha que a China está a tentar eliminar, estimulando cada vez mais os africanos a comprarem bens e serviços na China.

DW África: De que forma esta medida pode influenciar o desenvolvimento de indústrias locais nestes países?

YQ: No curto prazo, os bens importados pela China trazem sempre uma vantagem. Agora, a questão é no longo prazo. Se, efetivamente, os países forem inundados, cada vez mais, com produtos chineses baratos e, na sua maior parte, de baixa qualidade, sem termos uma estratégia interessante para relançar o setor industrial, então pode ser uma armadilha para esses dois paísesIsso vai depender das lideranças económicas dos dois países.

Depender apenas da importação de bens e serviços, através da estratégia de custo zero, da isenção de tarifas das matérias-primas que os países vão vender para a China, é uma armadilha muito grande e que, efetivamente, pode fazer com que esses países não se desenvolvam no médio e longo prazo, nessa perspetiva.

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