Na lista das coisas que menos respeitam fronteiras a música ocupa um lugar de topo. E quando a língua e cultura são similares as conexões entre os seus fazedores são maiores. Será que funciona assim também nos PALOP?
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Durante o Festival de Música Africana de Würzburg, que aconteceu em maio aqui na Alemanha, também falamos sobre este tema com o músico cabo-verdiano Dino D'Santiago.
DW África: Relativamente ao elo entre os músicos dos PALOP, sente que é forte ou a organização funciona como ilhas independentes e com conexões especiais entre algumas dessas ilhas?
Dino D'Santiago (DS): Sabe que já foi assim, mas hoje em dia [já não é]. Consigo avaliar pelo meu caso, tenho no mínimo uma música com cada país lusófono. Tenho intercâmbio com todos, no Brasil, Angola, em Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau e com Portugal, claro, foi a ponte que nos ligou. Então acho que esse abraço é mais do que evidente e os próprios Governos já começam a sentir isso e a fluir mais na CPLP.
DW África: E quais são as suas referências?
DS: Vão desde o Bana ao Ildo Lobo, Tito Paris, obviamente, a Cesária Évora, Paulo Flores e o Bonga, Filipe Mukenga, Manecas Costa, Calú Mendes... Olha, são diversos. A família Novela toda, eu adoro aquela família, a Selma Uamusse, uma moçambicana lindíssima que canta tão bem, que acho que devia vir a este festival... São tantos. E Bob Marley, sem dúvidas é a minha maior fonte de inspiração. E em Portugal a nova geração do fado com a Marisa e Ana Moura, eu vou bebendo um pouco de tudo.
DW África: Dá a um dos clássicos do Ildo Lobo, o Djonsinho Cabral, um toque mais tecno. Como é levar essas msituras para um público mais velho? Há recetividade?
DS: Vou ter de dizer mais uma vez que sou afortunado, ainda há duas semanas estive em Cabo Verde e no palco com os Tubarões a cantar precisamente Djonsinho Cabral. O técnico de som dos Tubarões, que é baixista, é a pessoa que me faz o som sempre que vou a Cabo Verde. Os Bulimundo chamaram-me para a casa do baterista, já bem velhos, sentei-me a porta e eles deram-me o primeiro vinil deles e todos puseram as mão na minha cabeça a darem-me a benção para eu elevar a nossa cultura e a agradecerem-me. Sempre tenho um deles a ver o concerto em Cabo Verde. Então acho que sou uma pessoa muito privilegiada. Por isso sinto que eles abraçam-nos se nós respeitarmos a génese do que eles fizeram.
DW África: Trabalha em parceria com músicos alemães?
ONLINE Dino II - MP3-Mono
DS: Sim, fiz agora um projeto maravilhoso que se chama Lusafro, juntamente com o programa Cosmos da WDR de Francis Gay. Juntamente com a Womex fizeram uma coisa enorme em Cabo Verde em que juntaram cada elemento da lusofonia com os sons eletrónicos da Alemanha, de Berlim e Colónia, mais especificamente. Fizemos um projeto lindo que vamos trazer agora em julho para o sul da Alemanha e em novembro para Berlim.
DW África: E como surge esse projeto?
DS: O Francis Gay viu-me a tocar várias vezes e disse que a primeira opção que viu quando idealizou este projeto em Cabo Verde era ter-me como cabeça de cartaz juntando todos os outros. E felizmente conseguiu, com um fundo cultural vindo da Alemanha e com a Womex envolvida e a Piranha Womex, com a Christine Semba, o Tony Amado de Angola, Buruntuma da Guiné-Bissau, Fatou Diakité, Nissa Barbosa, Batchart, Hélio Batalha... Tanta gente de vários lugares que eu fiquei admirado. E senti pena por não terem sido os portugueses a pensarem nisso, foi preciso os alemães pegarem na nossa lusofonia sentirem o potencial e trazerem para a Alemanha.
O som da Beira: djembês de Moçambique
Djongue é percussionista profissional na Beira e membro de várias bandas. Nos últimos cinco anos, Djongue ensinou a si mesmo como construir djembês, tambores originários da África Ocidental.
Foto: Gerald Henzinger
O construtor de djembês
Djongue é percussionista profissional na Beira e membro de várias bandas. Nos últimos cinco anos, Djongue ensinou a si mesmo como construir djembês. Para produzir esses tambores originários da África Ocidental, Djongue precisa de madeira, pele de cabra, três aneis de ferro, um pedaço de pano e uma corda resistente.
Foto: Gerald Henzinger
Busca por especialistas
Djongue procura alguém que saiba fabricar os tradicionais "pilões de milho", que têm formas parecidas com um djembê. Um vendedor que comercializa esses pilões leva o percussionista a um mestre da produção da ferramenta de moagem. O mestre mora no vilarejo de Macuacua, a 80 km da cidade da Beira, na mata da província central de Sofala.
Foto: Gerald Henzinger
Um marceneiro na floresta
Alberto é mestre marceneiro e especialista na produção dos trituradores "pilão". Sua oficina fica debaixo de uma árvore. Sua ferramenta é um machado de ferro. Com métodos simples, ele trabalha pedaços maciços de madeira, formando as bases para a produção de pilões e tambores.
Foto: Gerald Henzinger
Negócio fechado!
O marceneiro Alberto concorda em fornecer bases de madeira para a fabricação de tambores. Djongue combina o preço de três bases com Alberto, que este deverá entregar num prazo de duas semanas.
Foto: Gerald Henzinger
Nos fundos do açougue
A membrana esticada na parte superior do tambor é de pele de cabra, que Djongue compra nos fundos de um açougue na Beira. Uma cabra inteira custa entre 600 e mil meticais (entre 20 e 35 euros). Quase toda a cabra é destinada à alimentação. As tripas fazem sucesso entre os consumidores.
Foto: Gerald Henzinger
O valor de uma cabra
Em Moçambique, a pele de uma cabra não costuma ser reaproveitada. Portanto, Djongue paga apenas dez meticais (30 centavos de euro) pela pele, que ele vai limpar e esticar sobre o tambor, assim que os aneis de ferro estiverem prontos.
Foto: Gerald Henzinger
Primeiros ajustamentos
Uma serralharia e uma oficina mecânica funcionam neste mesmo local na Beira, a segunda maior cidade de Moçambique. É aqui que Djongue encomenda os aneis de ferro para o djembê. São estes aneis que vão manter a pele de cabra esticada sobre o tambor.
Foto: Gerald Henzinger
Trabalho em equipa
A oficina é equipada com um maçarico e várias ferramentas de serralharia. Djongue precisa de comprar o material bruto para os aneis de ferro no mercado ou numa loja de materiais de construção, e trazê-lo para a oficina.
Foto: Gerald Henzinger
Paciência e precisão
Os três aneis são ajustados individualmente ao djembê. O ferro de dez milímetros de espessura precisa de ser encurvado. Se o anel ficar muito grande, é preciso cortar um pedaço dele. Se ficar muito pequeno, é preciso enxertar um pedaço no ferro. O processo é aplicado até que todos os três aneis caibam perfeitamente na base.
Foto: Gerald Henzinger
Mais um ingrediente
Djongue compra as cordas para o tambor no Mercado da Praia Nova, na periferia da Beira. Após negociar, ele compra dez metros de corda por 140 meticais (cerca de 4,50 euros).
Foto: Gerald Henzinger
Começa a montagem
Agora, Djongue tem todos os componentes do djembê. Só precisa de montar o tambor. Mas isso não é tão fácil quanto soa. A pele de cabra é ligeiramente esticada sobre a base – e precisa de secar durante uma semana.
Foto: Gerald Henzinger
Atenção ao detalhe
Ainda é preciso retirar os pelos da pele de cabra antes que se possa batucar no tambor. Com um caco de vidro, Djongue raspa minuciosamente a superfície da pele de cabra até que esta fique completamente lisa. Ele precisa de estar atento, porque a pele é fina e o caco, afiado.
Foto: Gerald Henzinger
Já tem dono
O djembê agora só precisa de ser completamente esticado para ficar pronto. Este djembê será vendido a uma funcionária europeia. Djongue vendeu-lhe tanto o tambor quanto uma aula de percussão.
Foto: Gerald Henzinger
Construindo o futuro
Djongue estabeleceu uma pequena rede de fornecedores e de entrega de djembês em Beira. Os djembês de Djongue são cobiçados especialmente pelos estrangeiros que trabalham na Beira. Um djembê custa 4 mil meticais, o equivalente a 130 euros. Djongue está a economizar para abrir uma loja na Beira.