Candidato do MPLA à Presidência da República é acusado de compra de votos pela generalidade dos partidos na oposição angolana e alguns observadores independentes. UNITA apelou à intervenção da Justiça, sem sucesso.
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Segundo os partidos da oposição angolana, a acusação de corrupção eleitoral contra o atual ministro da Defesa e candidato do partido no poder, Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), à Presidência da República, João Lourenço, é sustentada pelo facto de estar a oferecer aos cidadãos-eleitores bens materiais - como por exemplo motorizadas, televisores, frigoríficos, utensílios agrícolas e muito mais - nas digressões que tem estado a efetuar um pouco por todo país, em campanha eleitoral.
De acordo o líder da bancada parlamentar da União Nacional Pela Libertação de Angola (UNITA), Adalberto da Costa Júnior, trata-se de uma conduta punível pela Lei Eleitoral. Segundo Costa Júnior, seu partido já fez uma participação criminal junto à Procuradoria-Geral da República e ao Tribunal Constitucional, mas os órgãos de justiça estariam fazendo ouvidos de mercador.
"Nós levamos à Assembleia uma série de ilegalidades cometidas por esta candidatura e também à plenária da Assembleia. Portanto, há aqui mais de uma dezena de violações de artigos da Lei Constitucional. Nós fizemos o apelo à intervenção do Tribunal de Contas, à intervenção do Tribunal Constitucional, naturalmente à Procuradoria da República, mas as nossas instituições estão partidarizadas, simplesmente," acusa Costa Júnior.
"Nós fomos ao limite de meter dois processos nos tribunais comuns, uma ação popular e uma ação cautelar. Nem respeitaram nem uma, nem outra. E a ação cautelar tem timing [tempo] para responder," relata o líder da bancada parlamentar da UNITA.
A Lei Eleitoral, no seu Artigo 193, determina que "aquele que, para persuadir alguém a votar ou a deixar de votar em qualquer partido ou candidato, oferecer ou prometer emprego público ou privado ou qualquer vantagem patrimonial a um ou mais eleitores, ainda que por interposta pessoa, mesmo que as coisas oferecidas ou prometidas sejam dissimuladas a título de ajuda pecuniária para custear despesas de qualquer natureza, é punido com pena de prisão maior de dois a oito anos e multa de 250.000,00 a 1.500.000,00 Kwanzas" (ou seja, multa de cerca de 1.400 a 8.400 euros).
Acusações variadas
A coligaçao eleitoral Convergência Ampla de Salvação em Angola (CASA-CE), liderada por Abel Chivukuvuku, não está de fora do assunto. Lindo Bernardo Tito, um dos vice-presidentes, diz que a prática demonstrada pelo candidato do partido do Governo é uma mostra de que, se o MPLA vencer essas eleições, o poder será transferido "de um corrupto para outro corrupto".
MMT 14.06 Candidato do MPLA, João Lourenço, acusado de comprar votos - MP3-Stereo
"O candidato do MPLA tem propagado a quatro ventos que vai combater a corrupção. Mas ele está a ser o primeiro corrupto. Ou seja, quando ele vai para os seus atos e fica a oferecer bens e outros meios para comprar o voto, está a fazer uma corrupção eleitoral. Logo, é uma pessoa na qual não se poder acreditar, não é? Quem vai acreditar num indivíduo que, por um lado, diz combater a corrupção e depois pratica atos de corrupção?" questiona Bernardo Tito.
Coque Mukuta, do Centro de Integridade Pública de Angola, diz ser urgente colocar um basta à impunidade e ao abuso de poder por parte do partido governante.
"Isso não devia acontecer, mas aqui a grande responsabilidade é dos políticos. Os políticos precisam, desde já, colocar um basta para que isso não aconteça, nem neste nem nos próximos pleitos," considera.
Entretanto, para José Patrocínio, coordenador da Associação Omunga, neste momento, o que mais preocupa é o facto de José Lourenço estar a inaugurar obras públicas.
"A questão de dar uma mota a um simpatizante, de dar um televisor a um cantor - embora eu não concorde, embora eu acho que é baixo - não é para mim uma questão grave, não será isso que vai destruir o processo eleitoral," avalia.
Contatada pela DW, a porta-voz da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), Júlia Ferreira, recusou-se a falar sobre o assunto, alegando que só poderia se pronunciar mediante uma solicitação de entrevista por escrito e com autorizaço do presidente da CNE.
José Eduardo dos Santos deixará saudades?
Dos Santos anunciou no início de 2017 que deixará o poder ao fim de 38 anos. Será que os angolanos terão saudades? Os comícios e as manifestações no país e fora de Angola nos últimos anos não deixam chegar a um consenso.
Foto: Getty Images/AFP/A. Pizzoli
Setembro de 2008 - Luanda
Este comício do MPLA em Kikolo, Luanda, foi assistido por milhares de pessoas durante a campanha para as eleições de 2008, as primeiras em 16 anos. O MPLA obteve 82% dos votos, tendo conquistado 191 dos 220 lugares da Assembleia Nacional de Angola.
Foto: picture-alliance/ dpa
Março de 2011 - Angola
No entanto, e apesar da maioria conseguida nas eleições de 2008, nos anos seguintes realizaram-se várias manifestações, em Angola, e não só, contra o Governo. A 7 de março de 2011, teve início no país uma onda de manifestações inspiradas na Primavera Árabe. Na organização destas manifestações estava o Movimento Revolucionário de Angola, também conhecido como "revús".
Foto: picture-alliance/dpa
Março de 2011 - Londres
No mesmo dia (7 de março), cerca de 30 pessoas sairam às ruas em Londres para protestar contra o Presidente José Eduardo dos Santos. Os manifestantes exigiram a saída do pai de Isabel dos Santos gritando "Zédu fora!" e "Zé tira o pé".
Foto: Huck
Fevereiro de 2012 - Benguela
Em 2012, ano de eleições no país, o número de manifestações organizadas pelos não apoiantes de José Eduardo dos Santos continuou a crescer. O protesto retratado na fotografia teve lugar em Benguela, a 13 de fevereiro. "O povo não te quer", gritaram os manifestantes.
Foto: DW
Junho de 2012 - Luanda
A 23 de maio de 2012, o presidente angolano anuncia que as eleições legislativas se irão realizar a 31 de agosto. Sensivelmente um mês depois, a 23 de junho, o Estádio 11 de Novembro, em Luanda, encheu-se de militantes e simpatizantes do MPLA para aplaudir José Eduardo dos Santos e apoiar a sua candidatura.
Foto: Quintiliano dos Santos
Julho de 2012 - Viana
Cartazes a favor de dos Santos num comício da campanha para as eleições de 2012 em Viana, arredores de Luanda. A 31 de agosto, o MPLA vence as eleições com mais de dois terços dos votos. Depois de uma mudança da Constituição, o Presidente já não é eleito diretamente, mas sim indiretamente nas legislativas. Como cabeça de lista do MPLA, José Eduardo dos Santos é eleito Presidente de Angola.
Foto: Quintiliano dos Santos
Maio de 2015 - Benguela
Nos anos seguintes continuaram os protestos contra o Presidente. Foram-se somando episódios de violência e detenções. 2015 torna-se-ia um ano complicado no que às críticas a JES diz respeito. No aniversário do "27 de maio", em Benguela, por exemplo, 13 ativistas foram detidos minutos depois de começarem um protesto. No mesmo dia, também houve detenções em Luanda.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Junho de 2015 - Luanda
Em junho de 2015, tem início um dos episódios da governação de José Eduardo dos Santos mais criticados. 15 ativistas angolanos, entre eles Luaty Beirão, foram detidos sob acusação de planeaream um golpe de Estado. Para além de terem despoletado muitas manifestações, estas detenções tiveram mediatismo um pouco por todo o mundo devido às greves de fome levadas a cabo por muitos dos detidos.
Foto: DW/P. Borralho
Julho de 2015 - Lisboa
No dia 17 de julho realizou-se, em Lisboa, a primeira manifestação em Portugal a favor da libertação destes jovens. "Basta de repressão em Angola", ouviu-se na capital portuguesa. Dias mais tarde, em Luanda, a polícia reagiu violentamente contra algumas dezenas de manifestantes que protestaram no Largo da Independência.
Foto: DW/J. Carlos
Agosto de 2015 - Luanda
A 2 de agosto e sob o lema "liberdade já", cerca de 200 pessoas, entre as quais vários artistas angolanos - poetas, políticos, atores e artistas plásticos - juntaram-se, em Luanda, para pedir a libertação dos 15 ativistas angolanos detidos. Sanguinário, Flagelo Urbano, Toti, Jack Nkanga, Sábio Louco, Zwela Hungo, Mona Diakidi, Dinameni, Fat Soldie e MCK foram alguns dos artistas presentes.
Foto: DW
Agosto de 2015 - Luanda
Dias mais tarde foi a vez das mães dos ativistas se fazerem ouvir. Nas ruas de Luanda, pediram a libertação dos seus filhos, mesmo depois da manifestação ter sido proibida pelo Governo.
Foto: DW/P. Ndomba
Agosto de 2015 - Lisboa
Nem no dia do seu aniversário (28 de agosto), José Eduardo dos Santos teve "descanso". Cidadãos descontentes, quer em Lisboa, quer em Angola, voltaram às ruas. Na capital portuguesa, voltou a pedir-se liberdade para os ativistas. Exigiu-se ainda liberdade de movimento, de pensamento, de expressão e de imprensa em Angola.
Foto: DW/J. Carlos
Novembro de 2015 - Luanda
No dia em que se celebraram os 40 anos da independência de Angola, proclamada a 11 de novembro de 1975, pelo então Presidente António Agostinho Neto, vários jovens voltaram a fazer ouvir-se. 12 manifestantes foram detidos.
Foto: DW/M. Luamba
Março de 2017 - Cazenga
No início de 2017, José Eduardo dos Santos anunciou a saída da Presidência. O cabeça-de-lista do MPLA às eleições gerais deste ano será o atual ministro de Defesa João Lourenço. O candidato foi recebido por centenas de apoiantes naquele que foi o seu primeiro ato de massas da pré-campanha, no município do Cazenga, em Luanda, a 4 de março.