Durante a campanha eleitoral de 2017, o então candidato do MPLA João Lourenço prometeu combater a corrupção. Analistas mostram-se reticentes quanto ao cumprimento desta promessa e falam em "justiça seletiva" em Angola.
Publicidade
Foi precisamente em junho de 2017, durante a campanha eleitoral, na província angolana do Zaire, norte de Angola, que o atual Presidente João Lourenço prometeu "colocar sal na gasosa", ou seja, combater a corrupção - algo que está presente em quase todos os setores da vida do país.
Para além do termo "gasosa", os cidadãos angolanos também utilizam a palavra "micha" para se referirem à corrupção que, se regista, sobretudo, na relação entre o agente da polícia e o cidadão.
Será que João Lourenço já fez o que prometeu? "Não há sinais de que o combate a corrupção tenha produzido efeitos. Aliás, há um combate tímido", responde o o jornalista angolano Ilídio Manuel.
João Lourenço cumpriu a promessa de "colocar sal na gasosa"?
"Não se tem, por exemplo, conhecimento de uma figura de proa, os tais chamados marimbondos, que tenham sido condenados em tribunal. O que temos são processos que estão a decorrer e, em alguns dos casos, os réus estão em prisão domiciliária", exemplifica.
Um destes cidadãos em prisão domiciliária é o antigo responsável do Fundo Soberano de Angola, José Filomeno dos Santos, filho do ex-Presidente José Eduardo dos Santos. Se for condenado, a defesa deverá interpor recurso e normalmente estes casos levam algum tempo, lembra Ilídio Manuel, o que, por si só, não acelera o combate ao fenómeno, acrescenta.
"Justiça seletiva"
Por outro lado, o jornalista angolano suspeita que exista uma "justiça seletiva" na responsabilização de alguns titulares de cargos públicos implicados em atos de corrupção ou branqueamento de capitais. "O que temos vindo a assistir também - e que levanta muitas suspeitas - é uma espécie de justiça seletiva. As figuras conetadas com o ex-Presidente da República têm sido visadas e aquelas que passaram para o lado de João Lourenço, que são marcadamente corruptas, não estão a ser perturbadas do ponto de vista criminal e cível", diz.
O analista Osvaldo Mboco, professor da Universidade Técnica de Angola (UTANGA), também suspeita que haja casos de "justiça selectiva" no país. "É fundamental que este combate contra a corrupção não seja um combate seletivo, não seja um combate de uns e outros não", defende.
Em Berlim, João Lourenço fala sobre corrupção e a RDC
04:49
Osvaldo Mboco considera que a "cruzada contra a corrupção e a impunidade" levada a cabo pela justiça e o Presidente João Lourenço tem tido um efeito intimidatório nos governantes da nova era, mas lembra que deverá levar ainda algum tempo para se reduzir o índice.
"Hoje, o servidor público tem muito mais cuidado na gestão do erário público, está ali para servir e não o contrário. Mas também não podemos dizer que os esquemas de corrupção já não existem. Existem, em pequena ou em média escala, diferente em relação ao passado, mas existem. A corrupção não vai acabar. O que se quer é mitigar e reduzir os níveis de corrupção", afirma.
Corrupção endémica: Luta é de todos
Por isso,o analista defende a necessidade do envolvimento de todos para lutar contra a chamada corrupção sistémica e endémica na sociedade angolana: "Temos de entender que o combate a corrupção em Angola não é única exclusivamente uma tarefa do Presidente João Lourenço. É um trabalho que pertence a toda sociedade".
No princípio deste mês, a Direção Nacional de Prevenção e Combate a Corrupção da Procuradoria-Geral da República (PGR), enviou uma série de mensagens para os telemóveis dos cidadãos a apelar: "Juntos por uma Angola sem corrupção. Diga não à corrupção. Denuncie!"
Mas, para Osvaldo Mbonco, a PGR angolana precisa de fazer mais. "Há necessidade de levar palestras para as escolas, mercados e orfanatos. Debater-se, discutir-se e informar a geração mais nova que é fundamental cuidar do que é património de todos com espírito de patriotismo acima de tudo, com espírito de dedicação e entender que as pessoas são serviçais da própria nação. A estratégia de combate a corrupção da PGR tem que sair do papel para ação", salienta.
Mesmo sem a Sonangol, Isabel dos Santos ainda tem um império empresarial
A mulher mais rica de África, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos, foi exonerada da liderança da petrolífera estatal angolana. Mas continua a ter uma grande influência económica em Angola e Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Bilionária angolana diz adeus à Sonangol
A 15 de novembro, Isabel dos Santos teve de renunciar à presidência do conselho de administração da Sonangol. Em meados de 2016, o seu pai, o então Presidente José Eduardo dos Santos, nomeou-a para liderar a companhia petrolífera estatal. A nomeação era ilegal aos olhos da lei angolana. O novo Presidente angolano, João Lourenço, estava, por isso, sob pressão para demitir Isabel dos Santos.
Foto: picture-alliance/dpa
Carreira brilhante à sombra do pai
Isabel dos Santos, filha de José Eduardo dos Santos e da sua primeira mulher, a jogadora de xadrez russa Tatiana Kunakova, nasceu em 1973, em Baku. Durante o regime do seu pai, no poder entre 1979 e 2017, Isabel dos Santos conseguiu construir um império empresarial. Em meados de 2016, a liderança da Sonangol, a maior empresa de Angola, entrou para o seu currículo.
Foto: picture-alliance/dpa
Conversão aos princípios "dos Santos"
Isabel dos Santos converteu o grupo Sonangol, sediado em Luanda (foto), às suas ideias. Nomeou cidadãos portugueses da sua confiança para importantes cargos de gestão e foi muito criticada pela ausência de angolanos em posições-chave na empresa.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
Presença firme nas telecomunicações
Mesmo após o fim da sua carreira na Sonangol, Isabel dos Santos continua forte no meio empresarial: possui 25% da UNITEL desde o seu lançamento, em 2001, a empresa tornou-se a principal fornecedora de serviços móveis e de internet em Angola. Através da UNITEL, dos Santos conseguiu estabelecer vários contactos comerciais e parcerias com outras empresas internacionais, como a Portugal Telecom.
Foto: DW/P. Borralho
Redes móveis em Portugal e Cabo Verde
Isabel dos Santos detém a participação maioritária na ZON, a terceira maior empresa de telecomunicações de Portugal, através de uma sociedade com o grupo português Sonae. Também em Cabo Verde, dos Santos - com uma fortuna estimada em 3,1 mil milhões de dólares, segundo a revista Forbes - está presente nas telecomunicações com a subsidiária UNITEL T+.
Foto: DW/J. Carlos
Expansão com a televisão por satélite
Lançada em 2010 por Isabel dos Santos, a ZAP Angola apresenta-se como o maior fornecedor de televisão por satélite no país. Desde 2011, a ZAP está presente também em Moçambique, onde conquistou uma parcela importante do setor. Em Moçambique, a empresa compete com o antigo líder de mercado, a Multichoice (DSTV), da África do Sul.
Foto: DW/P. Borralho
Bancos: o segundo pilar do império
Atrás das telecomunicações, o setor financeiro é o segundo pilar do império empresarial de Isabel dos Santos. A empresária detém o banco BIC juntamente com o grupo português Américo Amorim - o empresário português conhecido como "o rei da cortiça" que morreu em julho de 2017. É um dos maiores bancos de Angola, com cerca de 200 agências. É também o único banco angolano com agências em Portugal.
Foto: DW/P. Borralho
Com a GALP no negócio do petróleo
Também no petróleo, dos Santos fez parceria com Américo Amorim. Através da empresa Esperanza Holding B.V., sedeada em Amesterdão, a empresária angolana está envolvida na Amorim Energia que, por sua vez, é a maior acionista da petrolífera portuguesa GALP. A GALP também administra os postos de gasolina em Moçambique (na foto) e em Angola onde, curiosamente, compete com a Sonangol.
Foto: DW/B.Jequete
Supermercado em Luanda
Em 2016, abriu em Luanda o Avennida Shopping, um dos maiores centros comerciais da capital angolana. Várias empresas do império dos Santos operam neste centro comercial, como o Banco BIC, a ZAP e a UNITEL. Assim, a empresária beneficia em várias frentes do crescente mercado de bens de consumo em Luanda.
Foto: DW/P. Borralho
350 milhões de dólares em supermercados
Uma das maiores lojas do Avennida Shopping é o hipermercado Candando. É operado pelo grupo Contidis, controlado por Isabel dos Santos. Nos próximos anos, deverão ser construídos em Angola vários Candando. No total, a Contidis quer investir mais de 350 milhões de dólares nas filiais.