João Lourenço nega ter poderes constitucionais excessivos
Lusa | kg
29 de junho de 2019
Presidente angolano defende que a revisão da Constituição do país não é um ato obrigatório, mas diz que processo pode ocorrer a qualquer momento. UNITA e CASA-CE querem alteração do texto da Carta Magna de Angola.
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O Presidente angolano, João Lourenço, negou esta sexta-feira (28.06) deter poderes constitucionais excessivos. Em entrevista ao semanário Novo Jornal e à Televisão Pública de Angola (TPA), o chefe de Estado sublinhou que a revisão da Carta Magna não é um ato obrigatório, havendo órgãos com competência para avançar com o processo, e que a revisão da Constituição pode acontecer a qualquer momento, desde que se saiba com que objetivo.
No entender de João Lourenço, o próprio Presidente pode desencadear o processo de revisão, não sendo, porém, obrigado a fazê-lo por entender que não existem razões expressas. O Presidente angolano salientou que cabe ao Parlamento angolano, através da Conta Geral do Estado (CGE), fiscalizar a sua ação enquanto Presidente da República.
No início deste ano, os dois maiores partidos da oposição em Angola defenderam a revisão da Constituição angolana, considerando que a versão atual atribui "excessivos poderes ao Presidente da República" e que "não está adequada para servir o interesse dos cidadãos".
Poderes concentrados
Segundo o presidente do grupo parlamentar da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), o maior partido da oposição, o "excesso de poderes" do Presidente, emanado da Constituição de 2010, concorre para constantes solicitações de autorizações legislativas ao Parlamento, situação que deve merecer "alguma ponderação".
"É preciso acautelar para que não se esteja a caminhar para o excesso de poderes concentrados. A leitura que temos é que devíamos já estar na altura de podermos aceder a uma revisão do excesso de poderes. Angola faz hoje uma transição de um Presidente da República [João Lourenço] que está a vestir um casaco que foi feito à medida do anterior Presidente da República [José Eduardo dos Santos]", disse o deputado Adalberto da Costa Júnior.
"É preciso assumir que o país, formatado como se encontra, não está adequado a servir o interesse dos cidadãos. Temos necessidade de uma revisão da Constituição, da lei eleitoral (...) e, quanto mais se retardar estas matérias, mais se tem o país impreparado para servir o interesse comum", sustentou.
André Mendes de Carvalho, presidente do grupo parlamentar da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), também defendeu a revisão da Constituição. "Quando queremos um indivíduo com os poderes todos que o Presidente tem, ele [chefe de Estado] tem de ser eleito de uma maneira mais direita, porque não pode estar no meio dos deputados como cabeça de lista e 'virar' Presidente", disse.
De acordo com o deputado, "há vários aspetos" na Constituição que "carecem de alguma revisão", desde logo o "modelo de eleição" do Presidente da República, que, no seu entender, "é impróprio" para um regime presidencialista.
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".