José Mário Vaz cobra "posição clara e realista" da CEDEAO
Lusa | kg
29 de junho de 2019
Em discurso, Presidente guineense classifica resolução que determina a cessação imediata de suas funções como "golpe de Estado camuflado". CEDEAO se debruça sobre crise política na Guiné-Bissau em cimeira em Abuja.
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O Presidente da Guiné-Bissau, José Mário Vaz, pediu este sábado (29.06) à Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) para tomar uma posição clara e realista em relação à sua continuidade como chefe de Estado guineense.
"Sendo evidente que a falta de clarificação desta matéria poderá provocar o caos político no meu país, eu venho solicitar aos meus pares um posicionamento claro e realista sobre esta matéria", afirmou José Mário Vaz num discurso proferido na 55ª Cimeira Ordinária dos Chefes de Estado e de Governo da CEDEAO em Abuja, na Nigéria.
José Mário Vaz cumpriu cinco anos de mandato a 23 de junho, marcou eleições presidenciais para 24 de novembro, nomeou Aristides Gomes como primeiro-ministro, mas não indigitou o futuro Governo. Na quinta-feira passada, a maioria dos deputados do Parlamento aprovou uma resolução que determina a cessação imediata das funções constitucionais do Presidente da República e a sua substituição no cargo pelo presidente da Assembleia Nacional da República (ANP), Cipriano Cassamá.
"Interpretações erradas"
O chefe de Estado guineense justificou que marcou as eleições presidenciais para 24 de novembro com base na Lei Eleitoral da Guiné-Bissau.
A alínea n.2 estabelece que "no caso das eleições legislativas e presidências não decorrerem da dissolução da Assembleia ou da vacatura do cargo do Presidente da República (por morte ou outro impedimento definitivo), as eleições realizam-se entre o dia 23 de outubro e 25 de novembro do ano correspondente ao termo da legislatura ou do mandato presidencial".
Diante disso, José Mário Vaz classificou como "obviamente erradas" as interpretações de que o Presidente da República deverá ser forçosamente removido das suas funções por ter completado cinco anos de mandato a 23 de junho deste mês.
"Esse pronunciamento tem sido secundado, se não inspirado, por entidades e países fora da nossa sub-região que, sem o conhecimento da realidade e das leis da Guiné-Bissau, pretendem substituir à CEDEAO nos seus incansáveis esforços com vista à estabilização política do nosso país", afirmou.
No discurso, Jomav também sublinhou que a "correta interpretação das leis da Guiné-Bissau estabelece que o Presidente da República permanece em funções até ao empossamento do novo Presidente da República eleito, podendo entre outros empossar o novo Governo, velando sempre pelos superiores interesses da nação".
"Ato irresponsável"
Sobre a resolução aprovada no Parlamento, José Mário Vaz a considerou como um "ato irresponsável" que "viola grosseiramente a Constituição da República". "O ato dos 54 deputados constitui, pois, uma tentativa de subversão da ordem constitucional, através de um golpe de Estado camuflado na veste de resolução do parlamento", afirmou.
"Eu solicito a esta cimeira que tenha um pronunciamento claro e inequívoco sobre este claro atentado ao Estado de Direito, que pretende interromper e subverter o processo democrático", acrescentou. Na mensagem aos seus homólogos da CEDEAO, José Mário Vaz afirmou acreditar que, com a realização das presidenciais a 24 de novembro, os guineenses vão poder "encerrar o ciclo de convulsões e instabilidade".
O Presidente também defendeu que as eleições legislativas realizadas a 10 de março representaram um marco histórico na Guiné-Bissau, pois, pela primeira vez, após 25 anos de regime multipartidário, o país chegou "ao termo de uma legislatura sem interrupção do ciclo político e sem golpes de estado".
Raiz do problema
Ao dizer que o problema da Guiné-Bissau "não é um problema de pessoas, mas sim de instituições, e de sistema de governação", Jomav defendeu a materialização dos compromissos de reformas consagrados no Acordo de Conacri.
"Antes da eleição do novo presidente da República, é fundamental a realização da reforma constitucional que permita a redefinição e indispensável clarificação do sistema de governação e sobretudo dos poderes e competências do Presidente da República e, consequentemente a eliminação de focos de instabilidade recorrente", declarou.
Para isso, José Mário Vaz disse que a reforma constitucional deve ser feita através de um referendo prévio, "que defina o sistema de Governo que deverá ser rapidamente adotado pelo Parlamento antes da apresentação oficial das candidaturas para as eleições presidenciais".
Farpas e elogios: Frases das eleições na Guiné-Bissau
Principais partidos políticos, sociedade civil e comunidade internacional acompanham de perto contagem de votos na Guiné-Bissau. CNE só divulga resultados na quarta-feira (13.03), mas PAIGC já canta vitória.
Foto: Getty Images/AFP/SEYLLOU
PAIGC
O PAIGC declarou-se, na segunda-feira (11.03), vencedor das eleições legislativas de 10 de março na Guiné-Bissau. O porta-voz do partido João Bernardo Vieira garantiu que o povo conferiu ao PAIGC os destinos do país. No domingo, após votar, o líder do PAIGC, Domingos Simões Pereira, disse que estas eleições representam "um momento de viragem" para que, na Guiné-Bissau, "o império da lei vingue".
Foto: DW/F. Tchumá
MADEM-G15
Após o anúncio do PAIGC, o Movimento para a Alternância Democrática frisou que ninguém ganhou as eleições com maioria absoluta e que também fará parte do próximo Governo do país. As declarações de Braima Camará no domingo, dia das eleições, foram das mais críticas, pois o líder do MADEM-G15 acusou o primeiro-ministro de "usar dinheiro público para corromper líderes de opinião no dia de reflexão".
Foto: DW/J. Carlos
PRS
O Partido da Renovação Social disse, esta terça-feira, que "é falsa a informação da maioria folgada que o PAIGC sustenta para semear a confusão"."Nenhuma das forças políticas atingiu sequer a barra dos 40 deputados", disse Vítor Pereira. No domingo, depois de votar, Alberto Nambeia, líder do PRS, disse que esta votação constitui um "balão de oxigénio" para o povo, que quer mudanças no país.
Foto: DW/B. Darame
FREPASNA
Baciro Djá considera que era o candidato com mais experiência nestas eleições e, por isso, o justo vencedor. No entanto, esta segunda-feira, o líder do partido Frente Patriótica para a Salvação Nacional (FREPASNA) foi o primeiro a reconhecer a derrota no pleito. "Consideramos que o nosso resultado foi péssimo e a responsabilidade máxima é minha, enquanto presidente do partido", disse.
Foto: Presidency of Guinea-Bissau
Comissão Nacional de Eleições (CNE)
Pouco depois do arranque do pleito, no domingo, José Pedro Sambú, presidente da CNE, disse aos jornalistas que o processo estava a decorrer num "clima de transparência e sem sobressaltos". O mesmo cenário foi reportado pela porta-voz da comissão, ao final do dia. Felizberta Vaz garantiu ainda que os "pequenos problemas" que surgiram foram resolvidos. A CNE divulga os resultados esta quarta-feira.
Foto: CNE
Presidente da República
Em declarações aos jornalistas, depois de votar, no domingo, José Mário Vaz garantiu que os observadores estavam "surpresos" pela positiva com a Guiné-Bissau. O Presidente guineense pediu à imprensa para que passasse lá para fora essa "grande imagem" da Guiné-Bissau como um país onde "não há problemas". "Considero a Guiné-Bissau hoje campeã da liberdade", disse.
Foto: Getty Images/AFP/Seyllou
Primeiro-ministro guineense
Também no domingo, o primeiro-ministro guineense disse estar emocionado com a concretização de um processo eleitoral "difícil e intenso", no qual foi "necessária a intervenção da comunidade internacional". Aristides Gomes acrescentou ainda que, apesar das dificuldades, este foi um processo cheio de "pedagogia".
Foto: Präsidentschaft von Guinea-Bissau
Organização das Nações Unidas
David McLachlan-Karr, enviado das Nações Unidas à Guiné-Bissau, tem estado a reportar, com frequência, o ambiente vivido no país nestas eleições, nas redes sociais. Esta segunda-feira, o representante da ONU deu os parabéns à população guineense que, "em todo o país, saiu [às ruas] para votar pacificamente e com muito orgulho cívico".
Foto: DW/B. Darame
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Também a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), na pessoa de Luiz Villarinho Pedroso, acompanhou de perto a votação. No domingo, dia da eleição, o chefe da missão da CPLP disse que estas eleições foram um "exercício cívico exemplar", que decorreu com a "maior tranquilidade e normalidade". O balanço preliminar do escrutínio será feito ao longo desta terça-feira (12.03).
Foto: DW/N. dos Santos
CEDEAO
À semelhança da ONU e da CPLP, também a CEDEAO deu nota positiva às eleições guineenses. Numa conferência de imprensa, esta segunda-feira (11.03), Kadré Désiré Ouedraogo, chefe da Missão de Observação da CEDEAO, disse que as legislativas no país decorreram "de forma pacífica e transparente". Acrescentou ainda que espera que "todos [os partidos] aceitem os resultados".
Foto: DW/B. Darame
União Africana
Após o encerramento das urnas na Guiné-Bissau, Rafael Branco, chefe da Missão de Observação Eleitoral da União Africana destacou a forma tranquila com que decorreu o processo e salientou a "participação cívica notável".
Foto: DW/Nélio dos Santos
Liga Guineense dos Direitos Humanos
Também as organizações locais fizeram chegar elogios. À semelhança do que foi dito pela CNE, Augusto Mário da Silva, presidente da Liga Guineense dos Direitos Humanos, disse ter havido registo de "algumas falhas", mas "que foram imediatamente supridas". Tirando os atrasos na abertura das urnas em algumas mesas e trocas de cadernos eleitorais, "o processo decorreu de forma regular", disse.
Foto: DW/B. Darame
Sociedade Civil
Por último, a Célula de Monitorização do Processo Eleitoral salientou, esta segunda-feira, que "os eleitores compareceram em massa para exercer o seu direito de voto". Este grupo de monitorização das eleições, composto por 420 pessoas, espalhadas por todo o país, saudou também "a boa presença das forças de segurança nos centros de votação observados".