José Ramos-Horta fala sobre resolução de conflitos em Bissau
Braima Darame (Bissau)
9 de fevereiro de 2017
O ex-Presidente de Timor-Leste partilha a sua experiência no processo de reconciliação do seu país, durante um simpósio no Parlamento da Guiné-Bissau. Evento é mais uma tentativa para a estabilidade guineense.
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O antigo Presidente de Timor-Leste, José Ramos-Horta, participa esta quinta-feira (09.02) No simpósio internacional "Enfrentar o passado para construir a Guiné-Bissau de amanhã”, que decorre até sábado (11.02) no Parlamento de Bissau, a capital do país. O prémio Nobel da Paz fala sobre os caminhos para o processo de reconciliação política e social guineense.
"Vim não para dar lições, mas para partilhar a experiência de Timor-Leste no processo de reconciliação e ouvir e aprender com os irmãos guineenses", afirma Ramos-Horta. Para o ex-Presidente timorense, "na Guiné-Bissau, apesar das grandes dificuldades políticas, não há conflitos interétnicos, inter-religiosos ou inter-políticos".
Estão também em debate questões ligadas à Justiça como pilar do desenvolvimento num sistema democrático. Na sexta-feira (10.02), serão analisados os processos de transformação socioeconómicos e políticos, bem como o papel da sociedade civil na estabilização política e reconciliação nacional. O ex-líder timorense voltará a usar da palavra no sábado (11.02), antes de José Mário Vaz, o Presidente guineense, encerrar o simpósio.
Desenvolvimento guineense
Cipriano Cassamá, presidente do Parlamento, lançou um repto aos dirigentes do país para concentrarem atenções na organização o quanto antes da Conferência Nacional "Caminhos para Paz e Desenvolvimento", destinada a debater a reconciliação entre os guineenses.
"Este lema deverá sensibilizar os guineenses para a necessidade da paz e estabilidade como condições para o desenvolvimento socioeconômico do país", destacou Cassamá.
O antigo Presidente de transição da Guiné-Bissau, após o golpe de Estado de 12 de abril de 2012, defende o cumprimento das leis e um diálogo franco, através do qual se poderá alcançar a tão almejada estabilidade política na Guiné-Bissau. "Sem um diálogo sincero e franco, sem o cumprimento das leis, sem o respeito pela diferença da opinião, não há solução para a reconciliação".
Caminhos para a paz
09.02.17 Simpósio na Guiné-Bissau - MP3-Mono
O encontro é organizado pela Comissão para Organização da Conferência Nacional (COCN) "Caminhos para a Paz e Desenvolvimento". Aumentar a consciência nacional sobre a importância de lidar com o passado para resgatar o país do ciclo de instabilidade e conflito político e social é um dos principais objetivos.
A COCN, liderada pelo padre Domingos da Fonseca, foi restabelecida pela Assembleia Nacional Popular em 2015, para retomar os trabalhos de consulta iniciados em 2009 sobre a necessidade de escolher um mecanismo de reconciliação nacional para a Guiné-Bissau.
Até ao momento, a COCN analisou os resultados das consultas a mais de três mil pessoas em todo o território da Guiné-Bissau, estudou a experiência de outros países como Timor-leste e Costa do Marfim e produziu o seu relatório final que será também apresentado durante o simpósio.
A COCN tem tido o apoio do Escritório Integrado das Nações Unidas para a Consolidação da Paz (UNIOGBIS), o Fundo das Nações Unidas para a Consolidação da Paz e do Governo de Timor-Leste.
Ser mulher na Guiné-Bissau significa vida dura
A maioria das mulheres guineenses tem uma vida difícil. Têm de percorrer dezenas de quilómetros para ir buscar lenha. Muitas morrem ainda jovens. A taxa guineense de mortalidade materna é uma das mais altas do mundo.
Foto: DW/B. Darame
Primeira a acordar, última a ir dormir
No campo, uma mulher trabalha a dobrar. Costuma acordar antes dos restantes membros da família e é a última a deitar-se no final do dia. São as mulheres que têm de caminhar até à mata para procurar lenha e água, às vezes em zonas de difícil acesso, a vários quilómetros da aldeia, como nesta fotografia na vila de Quinhamel, na região de Biombo, no norte da Guiné-Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Vender para sustentar a família
Com um pano estendido no chão, as vendedoras vão expondo os seus legumes, malaguetas verdes, pepinos, cenouras, alfaces. São cultivados em quintais ou em pequenos campos. "Vender para sustentar a família" é o lema das mulheres guineenses. Mais de metade vende em feiras improvisadas, como aqui no Mercado de Bandim, o maior mercado de céu aberto da cidade de Bissau.
Foto: DW/B. Darame
Economia dominada por homens
À beira das estradas, as mulheres sentam-se em bancos e mesas de madeira e vendem laranjas, mangas, bananas e outros frutos - como aqui em Bissack, bairro nos arredores de Bissau. As vendedoras têm uma receita que ronda os 10 euros diários. Em média, uma guineense consegue ganhar 907 dólares por ano, bastante menos que os homens que conseguem em média 1.275 dólares.
Foto: DW/B. Darame
Recolher areia para sobreviver
Tia Nhalá não sabe que idade tem, mas sabe que todos os dias deve acordar cedo, às 05h00, para recolher areia no bairro de Cuntum, em Bissau. Sem qualquer proteção no rosto, sem luvas e pés descalços, Nhalá, que aparenta ter 67 anos, trabalha duramente durante largas horas. Recolhe areia que depois vende a pessoas que a usam em obras de construção civil.
Foto: DW/B. Darame
Venda ambulante em condições perigosas
No Bairro de Belém, em Bissau, meninas deambulam de porta em porta para vender frutas. Organizações da sociedade civil denunciaram já várias vezes que as vendedoras ambulantes correm riscos, como o de serem violadas sexualmente, pois estão muito expostas e vulneráveis. Também há denúncias de que algumas mulheres são forçadas a fazer esse trabalho.
Foto: DW/B. Darame
Vender peixe é um bom negócio
As vendedoras de peixe geralmente possuem arcas velhas para a conservação do pescado. Colocam-nas nos portos - como aqui na Ilha de Bubaque (Bijagós) - para servir de local de armazenamento quando receberem peixe fresco dos pescadores. Nos últimos anos, a venda de peixe tornou-se num dos negócios mais rentáveis para as mulheres guineenses.
Foto: DW/B. Darame
Um dos piores países para ser mãe
As condições precárias nas zonas rurais da Guiné-Bissau têm reflexos nas estatísticas: em 126 partos morre uma mulher, segundo dados das Nações Unidas. Em comparação, no Japão, em 20.000 partos morre uma mulher. A taxa de mortalidade materna na Guiné-Bissau é uma das mais altas do mundo. Ainda assim, não existe no país uma estratégia política dirigida à mulher no meio rural.
Foto: DW/B. Darame
País difícil para as crianças
Cada mulher guineense tem em média cinco filhos. O país tem uma das taxas de fecundidade mais altas do mundo. Mas muitas crianças não chegam a celebrar o seu quinto aniversário. Segundo dados das Nações Unidas, 129 de 1.000 crianças morrem até aos cinco anos de idade, muitas durante no parto, o que torna a Guiné-Bissau um dos piores países do mundo para se nascer.
Foto: DW/B. Darame
Trabalhos domésticos no feminino
Em Mansoa, região de Oio, norte da Guiné-Bissau, as casas de adobe agrupadas debaixo de enormes árvores desenham intricados caminhos onde secam redes de pesca, peles de antílopes e roupas rasgadas de criança. A comida prepara-se num fogão improvisado a lenha, em frente da casa. Trabalhos domésticos como cozinhar, cuidar das crianças ou limpar cabem tradicionalmente às mulheres.
Foto: DW/B. Darame
Carregar à cabeça é a única solução
Nas zonas mais recônditas da Guiné-Bissau, como na aldeia de Suru, região de Biombo, a cerca de 20 quilómetros de Bissau, não há uma rede de estradas que facilite o transporte das mercadorias. Não há carros que façam as ligações entre as aldeias. Carregar à cabeça, por vezes mais de cinco quilos, é a única solução para que essas mulheres possam fazer chegar os produtos ao destino.
Foto: DW/B. Darame
Lenha e água a quilómetros de distância
Nas mais de 80 ilhas e ilhéus completamente isolados e sem grande presença do Estado guineense, as populações vivem no regime do "salva-se quem poder". As mulheres percorrem dezenas de quilómetros para ir buscar lenha e água potável. Em muitos casos - como aqui na Ilha de Bubaque (Bijagós) - atravessam rios caminhando, com os pés descalços, sem roupas adequadas e carregadas.
Foto: DW/B. Darame
Ultrapassando rios e braços de mar
Devido à falta de barcos nas aldeias insulares do arquipélago dos Bijagós, o fornecimento e o transporte de bens é extremamente difícil. É recorrente ver mulheres atravessando rios ou braços de mar bastante profundos. Estes caminhos para procurar lenha e água doce são bastante perigosos para quem não sabe nadar.
Foto: DW/B. Darame
Desigualdade começa na educação
A maioria das mulheres guineenses vive em situação de extrema pobreza. Em médias, as mulheres frequentaram a escola apenas 1,4 anos, menos de metade do que os homens guineenses, que têm em média 3,4 anos de escolaridade, segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas. Só investindo na educação e na saúde será possível melhorar a situação das mulheres da Guiné-Bissau.