Em conferência de imprensa em Luanda, Samakuva disse que para construir uma sociedade mais justa é preciso mais do que palavras.
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Nesta segunda-feira (23), o maior partido de oposição de Angola, a União Nacional para Independência Total de Angola (UNITA), promoveu em Luanda uma conferência de imprensa para responder ao pronunciamento do Presidente João Lourenço, proferido na última semana, também na capital do país. A fala de Lourenço aconteceu por ocasião da abertura do novo ano parlamentar da IV Lesgislatura, desde o fim do regime do partido único em 1992.
Samakuva / conf.de Imprensa - MP3-Mono
Em réplica ao discurso sobre o Estado da Nação, o líder do UNITA, Isaías Samakuva, afirmou que, mais do que palavras, o novo Presidente da República deve partir para ações concretas. Samakuva duvida que João Lourenço venha a ter força suficiente para combater os monopólios, a exclusão e a corrupção.
A grande questão
O dirigente do UNITA saudou a mensagem do chefe de Estado contra o combate à corrupção. No entanto, ele disse que prefere ser como o apostolo São Tomé: quer ver para crer. ''Angola só irá combater com êxito os monopólios, a exclusão e a corrupção se fizer primeiro a despartidarização do Estado”, afirmou. E continuou a mandar seu recado a João Lourenço, ao dizer: "A nossa pergunta é: será que esta era do ‘Partido-Estado' chegou ao fim? Será que o novo Presidente quer mesmo combater hegemonia, abrir a economia e iniciar uma nova era? Essa é a nossa grande questão. Ficamos com o benefício da dúvida”, completou.
Dramático e Complexo
Para Samakuva, mais do que palavras, o novo Presidente da República deve partir para políticas concretas. Ele salientou ainda que João Lourenço herda um fardo muito pesado de José Eduardo dos Santos, que permaneceu no poder por 38 anos. E declarou ainda que o Estado da Nação atualmente é dramático e complexo porque faliu. "Travamos várias guerras e assinamos vários acordos de paz militar, mas ainda não construímos a paz social. Fizemos várias transições constitucionais, mas ainda não fizemos a transição para a plena democracia e para prosperidade. Descobrimos muito petróleo e muito diamante, mas ainda temos mais de 20 milhões de pobres”, disse o chefe do UNITA.
Sobre a recuperação da economia, Samakuva considera que uma retomada só será possível se forem enfrentados um mar de desafios. Eles passam pela institucionalização da democracia e pela libertação do Estado do autoritarismo partidário. ''A nossa crise é resultado da centralização de poder num só órgão do Estado, que mal é fiscalizado. Outra razão é a concentração da riqueza nacional numa só família política”, apontou.
Possíveis Soluções
De acordo com o líder do UNITA, a solução desse problema é a descentralização política e admnistrativa. "Precisamos criar autarquias locais e recuperar os poderes fiscalizadores do Parlamento. Temos de fazer uma reforma do poder judiciário e democratizar a economia de forma efectiva. Acrescente-se a isso, a reforma da administração eleitoral”, elencou.
Samakuva assegurou que as soluções para a construção de uma sociedade mais justa, que assegure o desenvolvimento do país, são: o diálogo para o compromisso, a aceitação da igualdade política e económica e também da diversidade cultural e do pluralismo de expressão.
Angola: Os contrastes de um gigante petrolífero
O "boom" do petróleo ainda não é para todos. Ao mesmo tempo que Angola oferece oportunidades de investimento a empresas nacionais e estrangeiras, mais de um terço da população vive com menos de um dólar por dia.
Foto: DW/R. Krieger
Lama no cotidiano
O bairro Cazenga é o mais populoso de Luanda – ali, vivem mais de 400 mil pessoas numa área de 40 quilômetros quadrados. Em outubro de 2012, chuvas fortes obrigaram muitos habitantes a andar na lama. Do Cazenga saíram muitos políticos do partido governista angolano MPLA. "Uma das prioridades de políticos pobres é a riqueza rápida", diz o economista angolano Fernando Heitor.
Foto: DW/R. Krieger
Dominância do MPLA
Euricleurival Vasco, 27, votou no MPLA nas eleições gerais de agosto de 2012: "É o partido do presidente. Desde a guerra civil, ele tenta deixar o poder, mas a população não deixa". Críticos dizem que José Eduardo dos Santos não cumpriu nenhuma promessa eleitoral, como acesso à água e à eletricidade. Mas o governo lançou um plano de desenvolvimento em novembro para dar esses direitos à população.
Foto: DW/R. Krieger
Economia informal em Angola
Muitos angolanos esperam riqueza do chamado "boom" do petróleo. Mas grande parte da população é ativa na economia informal, como estas vendedoras de bolachas na capital, Luanda. Segundo a ONU, 37% da população vivem com menos de um dólar por dia. Elias Isaac, da organização de defesa dos direitos humanos Open Society, considera este um "contrassenso" entre "crescimento e desenvolvimento".
Foto: DW/R. Krieger
Uma infraestrutura de fachada?
A capital angolana Luanda é considerada uma das cidades mais caras do mundo. Um prato de sopa pode custar cerca de 10 dólares num restaurante, o aluguel de um apartamento mais de cinco mil dólares por mês. A Baía de Luanda é testemunho constante do "boom" do petróleo: guindastes e arranha-céus disputam quem é mais alto.
Foto: DW/Renate Krieger
O "Capitólio" de Angola
Próximo à Baía de Luanda, surge a nova sede do parlamento angolano. O partido governista MPLA vai ocupar a maior parte dos 220 assentos: elegeu 175 deputados em agosto de 2012. Por outro lado, o MPLA perdeu 18 assentos em comparação à eleição de 2008. A UNITA, maior partido da oposição, ganhou 32 assentos em 2012 – mas tem pouco espaço...
Foto: DW/R. Krieger
O presidente no cotidiano de Luanda
…porque, segundo críticos, o presidente José Eduardo dos Santos (numa foto da campanha eleitoral) "domina tudo": o poder Executivo, o Judiciário e o Legislativo, diz o economista Fernando Heitor. José Eduardo dos Santos também parece dominar muitas ruas de Luanda: em novembro de 2012, quase todas as imagens eram da campanha do partido no poder, o MPLA.
Foto: DW/R. Krieger
Dormir nos carros
Os engarrafamentos são frequentes em Luanda. Por isso, muitos funcionários que moram em locais mais afastados já partem para a capital angolana de madrugada. Ao chegarem em Luanda, dormem nos carros até a hora de ir trabalhar – juntamente com as crianças que precisam ir à escola. A foto foi tirada às 06:00h da manhã perto do Palácio da Justiça em novembro de 2012.
Foto: DW/R. Krieger
A riqueza em recursos naturais de Angola
Angola é o segundo maior produtor de petróleo da África, mas também tem potencial para se tornar um dos maiores exportadores de gás natural. A primeira unidade de produção de LNG – Gás Natural Liquefeito, em inglês – foi construída no Soyo, norte do país, mas ainda está em fase de testes. A fábrica tem uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas de LNG por ano.
Foto: DW/Renate Krieger
Para acabar com a dependência do petróleo...
A diversificação da economia poderia ser uma solução, diz o Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo angolano criou um fundo soberano do petróleo para investir no país e no estrangeiro, e para ter uma reserva caso haja oscilações no preço do chamado "ouro negro". Uma alternativa, segundo especialistas, poderia ser a agricultura, já que o petróleo só deve durar mais 20 ou 30 anos.
Foto: DW/R. Krieger
Angola atrai estrangeiros
Vêem-se muitas placas em chinês e empresas chinesas em Angola. Os chineses são a maior comunidade estrangeira no país. Em seguida, vêm os portugueses, que em parte fogem à crise económica europeia. Depois, os brasileiros, por causa da proximidade cultural. Todos querem uma parte da riqueza angolana ou investem na reconstrução do país.
Foto: DW/R. Krieger
Homem X Asfalto
Para o educador Fernando Pinto Ndondi, o governo angolano deveria investir "no homem e não no asfalto". Há cinco anos, Fernando e sua famíla foram desalojados da ilha de Luanda por causa da construção de uma estrada. Agora vivem nestas casas precárias. O governo constrói novas casas para a população. Porém, os preços, a partir de 90 mil dólares, são altos demais para a maior parte dos angolanos.
Foto: DW/Renate Krieger
Para onde vai o dinheiro?
O que aconteceu com 32 mil milhões de dólares lucrados pela empresa petrolífera estatal angolana Sonangol entre 2007 e 2011? Um relatório do FMI constatou, em 2011, que faltava essa soma nos cofres públicos. A Sonangol diz ter investido o dinheiro em infraestrutura. Elias Isaac, da Open Society, diz que o governo disponibiliza mais informações – o que "não é sinônimo de transparência".