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Liberdade de imprensaGuiné-Bissau

"Ministério do Interior é responsável pelo assalto à rádio"

António Cascais
9 de fevereiro de 2022

Depois de a Rádio Capital FM ser atacada por homens armados no início desta semana, diretor-geral da emissora diz, em entrevista à DW, que o Ministério do Interior é o responsável político "número 1" pelo assalto.

Lassana Cassamá, Rádio Capital FM
O jornalista Lassana Cassamá, da Rádio Capital FM.Foto: Privat

A Rádio Capital FM foi atacada na segunda-feira (07.02). Um grupo de homens armados forçou a entrada nas instalações da emissora, na capital guineense, disparando vários tiros. Há sete feridos confirmados, entre eles a jornalista Maimuna Bari, que está hospitalizada em estado grave.

Mas os episódios de violência em Bissau não param por aqui. Na noite de terça-feira (08.02), a casa do analista político Rui Landim, em Bissau, também foi alvo de um ataque. Homens armados dispararam contra o portão e lançaram gás lacrimogéneo dentro da casa.

O jurista Luís Vaz Martins foi alvo de outro ataque, embora fontes tenham confirmado que ele saiu ileso da sua residência. Contactado pela DW, Vaz Martins disse que ainda não está em condições de gravar entrevista por estar a procurar um lugar seguro para se esconder. Ambos são comentadores da Capital FM.

Diante deste cenário, que envolve um atentado às liberdades de imprensa e direitos humanos na Guiné-Bissau, a DW África falou com o jornalista responsável da Rádio Capital FM, Lassana Cassamá.

Rádio Capital FM, em Bissau, após ataque na segunda-feiraFoto: Privat

DW África: Como viveu os diversos ataques contra jornalistas e comentadores, assim como contra as instalações da Rádio Capital FM?

Lassana Cassamá: Qualquer pessoa com o espírito aberto e solidário, mesmo que não seja profissional da Rádio Capital FM, não poderia ficar indiferente a este ataque contra a estação. Eu fiquei profundamente chocado. Não pelos danos materiais, mas sim porque estavam – e ainda estão – vidas humanas em jogo: há sete feridos. Imaginem os homens armados e encapuzados a entrar numa estação de rádio, a atacar civis desarmados que não têm nada nas mãos, além das suas canetas, gravadores e bloco de notas. Homens armados e encapuzados chegam e começam a disparar indiscriminadamente. As pessoas tiveram que fugir, pulando o muro e saltando do primeiro piso para o chão, e isso resultou em vários feridos. Estamos a falar de sete, além de uma pessoa que foi agredida no recinto do palácio presidencial quando foi fazer a cobertura de um seminário do Alto Comissariado de Luta contra a Covid-19, ao lado palácio presidencial. Portanto, todo este cenário não nos deixa indiferentes; ficámos chocados e consternados.

DW África: E houve também um ataque contra outros colaboradores vossos, nomeadamente comentadores e analistas...

LC: Sim, além do que aconteceu, estamos a falar também de perseguições aos nossos comentadores Luís Vaz Martins e o Dr. Rui Landim, que, neste momento, estão em lugares seguros... mas, na verdade, não estão porque neste momento toda a Guiné-Bissau está insegura. Portanto, como responsável máximo da Rádio Capital, fiquei chocado, "digerindo" esta situação, sobretudo [ao pensar] nas vidas humanas, que estão em jogo neste momento.

DW África: Há feridos que precisam de mais cuidados neste momento?

Ataque à Rádio Capital FM foi ao segundo em menos de dois anos. O outro (na foto) ocorreu em julho de 2020Foto: DW/D. Iancuba

LC: Quem se encontra gravemente ferida é a nossa colega Maimuna Bari. Estamos a diligenciar, neste momento, junto com o Sindicatos dos Jornalistas da Guiné-Bissau, para poder evacuá-la de Bissau com destino a Portugal. Estamos a trabalhar para isso e, provavelmente, ela poderá ter sorte e sair do país. Segundo os relatos médicos, ela está numa situação caótica e é preciso que tenha um acompanhamento especializado, que não existe na Guiné-Bissau.

DW África: Tendo em conta estes ataques, como é que vê o futuro da Rádio Capital FM? Há viabilidade para poderem continuar?

LC: Não há viabilidade ou certeza de que poderemos voltar às emissões brevemente, porque estamos descapitalizados. Mas a Rádio Capital nunca resignará. Isso está fora de questão. Nós emergimos neste país e fazemos parte da Guiné-Bissau. Os ouvintes têm crédito na Rádio Capital FM. Se desistirmos, seremos uma desilusão para a maior parte dos guineenses. Não podemos fazer isso. É a nossa profissão e os riscos são inerentes. Portanto, um dia, tarde ou cedo, retomaremos as nossas emissões. 

DW África: Lassana Cassamá, sabemos que ainda não há indicações sobre quem são os autores deste crime. Mas na sua opinião, quem são os responsáveis por estes atentados?

LC: Em toda esta dinâmica, eu diria que o Ministério do Interior é o responsável número um pelo assalto à Rádio Capital. Porquê? Porque, quando houve o primeiro ataque, em julho de 2020, o Ministério colocou lá homens seus. Os homens do Ministério do Interior é que andavam a assegurar a rádio, desde 2020. Portanto, não se entende como é possível que outro grupo, desconhecido deste Ministério, chegue à rádio para assaltá-la, disparando contra todos os equipamentos e todas as pessoas, sem que haja uma reação a respeito disso.

[Por outro lado,] o comissário da Polícia de Ordem Pública já deu uma conferência de imprensa dizendo que era "um ato isolado". Mas como é que ele afirmou isso sem ter recolhido os elementos no terreno? A equipa [de investigação criminal] ainda estava na rádio. Portanto, há "muitas coincidências", há muita confusão e muitas dúvidas sobre o que de facto aconteceu na Rádio Capital FM. 

Três feridos no ataque a rádio privada em Bissau

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