Libertados 40 independentistas detidos há meses em Cabinda
Lusa
24 de abril de 2019
Ativistas do Movimento Independentista de Cabinda foram libertados após vários apelos internacionais, anunciou advogado. Estavam detidos há cerca de três meses.
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Quarenta dos 51 ativistas de um movimento independentista de Cabinda detidos no fim de janeiro foram libertados na sequência de pressões internacionais sobre o governo provincial local, disse esta quarta-feira (24.04) à agência de notícias Lusa o advogado Arão Tempo.
Segundo o advogado angolano, os 40 ativistas foram libertados na sexta-feira e fazem parte de um grupo de 64 que foi detido há quase três meses na sequência da organização de uma manifestação para celebrar, a 01 de fevereiro, o 134.º aniversário da assinatura do Tratado de Simulambuco, razão da luta pela independência do enclave.
"Houve pressões internacionais sobre o governador de Cabinda [Eugénio Laborinho] para exigir a libertação dos detidos e saíram 40 dos 51 que estavam detidos, que ficaram sob termo de identidade e residência", explicou Arão Tempo, contactado telefonicamente na cidade de Cabinda a partir de Luanda.
Segundo Arão Tempo, que reiterou a ilegalidade das detenções - "a Constituição permite a liberdade de manifestação" -, na quinta-feira irá haver "uma concertação" com outros advogados locais para determinar o que irá ser feito para garantir a libertação dos restantes 11 detidos, 10 homens e uma mulher.
Nas declarações à Lusa, Arão Tempo lembrou que 13 dos ativistas de Cabinda foram libertados há cerca de um mês, tendo ficado igualmente sob termo de identidade e residência.
Motivo da detenção: planeamento de marcha
A grande maioria dos detidos está ligada ao Movimento Independentista de Cabinda (MIC), uma organização secessionista recente e que viu também ser presos o presidente, Maurício Bufita Baza Gimbi, e o vice-presidente António Marcos Soqui.
Em 07 de fevereiro, em declarações à Lusa, Sebastião Macaia Bungo, secretário para Informação e Comunicação do MIC, referiu que as detenções foram sendo acumuladas desde 28 de janeiro, à medida que se aproximava o dia em que o movimento se preparava para celebrar o aniversário do Tratado de Simulambuco.
A marcha, que acabaria por ser proibida pelas autoridades policiais angolanas, visava, além de comemorar os 134 anos do tratado assinado em 1885 entre Portugal e os príncipes, chefes e oficiais dos reinos de Cabinda (Makongo, Mangoyo e Maloango), colocando o enclave sob protetorado português, também exigir a independência.
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01:57
A polícia angolana, acrescentou, prendeu antecipadamente os organizadores e ativistas, impedindo-os de exercerem o seu direito de manifestação, que o MIC disse ser "legítima", depois de ter entregado o pedido de autorização às autoridades provinciais, que não responderam.
"Em vez de dar luz verde à marcha, [a polícia] lançou uma operação de prisão dos dirigentes e ativistas do MIC, iniciada nos dias 28 e 29 de janeiro, e fez toda uma campanha para dissuadir as pessoas a participar em qualquer marcha", acusou então Sebastião Macaia Bungo.
As detenções levaram, em fins de fevereiro, a Amnistia Internacional (AI) a lançar uma campanha a favor dos ativistas, que pediu aos defensores dos direitos humanos para escreverem cartas ao ministro da Justiça de Angola, Francisco Queirós, e ao embaixador angolano em Washington, Agostinho da Silva Neto, a denunciar as prisões.
O Governo angolano tem desdramatizado sucessivamente a agitação civil no enclave, tendo o ministro da Defesa, Salviano Sequeira, garantido a 15 deste mês à Lusa que "nada se passa" na província, nem mesmo militarmente, indicando desconhecer as ações militares da Frente de Libertação do Estado de Cabinda - Forças Armadas de Cabinda (FLEC/FAC).
No final de 2018, o chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas (CEMGFA) de Angola, general Egídio de Sousa Santos ("Disciplina"), considerou, porém, que existem "grupinhos que teimam em desafiar a lei angolana", mas que "são irrelevantes" e não representam uma ameaça militar real, insistindo que o enclave entre os dois Congos pertence a Angola.
Artivismo: a arte política de André de Castro
O papel político da arte é o mote de "Liberdade Já", a exposição do artista brasileiro André de Castro que lembra, entre outros ativistas, os presos políticos angolanos.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
"Liberdade Já" em serigrafia
A arte pode ter uma missão política - é o que prova esta exposição de André de Castro, a primeira mostra a solo do artista visual brasileiro na Europa. Este primeiro painel à entrada da exposição, em Lisboa, é um tributo aos presos políticos angolanos. O autor deu-lhe o título de "Liberdade Já", slogan que alimentou o movimento de solidariedade internacional pela libertação dos ativistas.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
Debate sobre política internacional
Tanto este projeto "Liberdade Já" (2015) como "Movimentos" (2013-2014) tiveram repercussão mundial. O artista brasileiro destaca, através das suas obras, os jovens presos políticos de Angola, libertados em 2016. As suas imagens acabam por incentivar o debate sobre acontecimentos políticos internacionais.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Os "revús" compõem o painel…
O artista compõe o painel com "monoprints" em serigrafias repetidas. Aqui podem ver-se alguns dos jovens angolanos presos em Luanda, em 2015, por discutirem um livro sobre métodos pacíficos de protesto. Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Nuno Álvaro Dala, Nito Alves, Benedito Jeremias e Nelson Dibango, entre outros, foram julgados pelo crime de atos preparatórios para a prática de rebelião.
Foto: DW/J. Carlos
… e multiplicam-se pelo mundo digital
O luso-angolano Luaty Beirão foi escolhido como símbolo do ativismo político, dando força à exposição, com a curadoria da Muxima. Os retratos multiplicaram-se no mundo digital, foram reproduzidos em t-shirts e posters. A venda das serigrafias expostas em mostras coletivas em Lisboa e Nova Iorque, em 2016, reverteu integralmente a favor das famílias dos presos políticos angolanos.
Foto: DW/J. Carlos
Além de Angola...
Em dezembro, André de Castro comemorou com as irmãs a abertura da exposição em Lisboa, que também apresenta rostos de ativistas como José Marcos Mavungo, advogado e ativista de Cabinda. Além de Angola, o artista desafia os visitantes a revisitar o movimento da Primavera Árabe. Dá a conhecer as pessoas e as suas lutas, propondo um ângulo mais pessoal e humano na narração do momento histórico.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Arte como ator social
No interesse do público e das comunidades, o artista brasileiro assume ser um promotor social. "Ao expor 'Movimentos' e 'Liberdade Já' juntos, a mostra permite um recorte da arte como ator social, questionando intenção, receção, apropriação e estética nas ruas e na internet", afirma André de Castro. É o que mostra a coleção "Movimentos", colocada na outra parede da sala.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Coragem para mudar o mundo
Nesta segunda parede, André de Castro imortaliza várias causas em diversas partes do mundo. São mulheres e homens que recusam aceitar a forma como são tratados pelos respetivos Estados. Acreditam, tal como o autor da exposição, que o mundo pode ser muito melhor. Por isso, com coragem, decidiram sair à rua.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Identidade política dos manifestantes…
Este primeiro projeto de André de Castro, em 2013, foi selecionado para a 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e visto por mais de 40 mil visitantes, passando por Miami (2013), Nova Iorque (2014) e Brasília (2015). As serigrafias, que resultam de entrevistas realizadas através das redes sociais, retratam as identidades políticas dos manifestantes de diferentes países.
Foto: DW/J. Carlos
… e cultura das manifestações
Através das serigrafias, o artista procurou valorizar a força da ação individual dos manifestantes. Cada participante enviou uma foto de rosto, usando as redes sociais, e respondeu a uma série de perguntas sobre a sua identidade política. Assim, foram criados retratos políticos individuais que, em conjunto, formam uma mini etnografia da cultura material e imaterial das manifestações.
Foto: DW/J. Carlos
Do outro lado do mundo
Em Nova Iorque, no Zuccotti Park, a sugestão original foi ocupar Wall Street, símbolo dos capitais financeiros internacionais. Porque, afinal, foi a especulação de capitais que deu origem à crise que atormentou o mundo há anos. Questiona Daniel Aarão Reis, ao apresentar a exposição: "Como aceitar que os responsáveis não ficassem com o fardo principal das medidas de superação desta mesma crise?"
Foto: DW/J. Carlos
Novos dispositivos de mobilização
A arte política de André de Castro, que também evoca figuras como Ghandi e Martin Luther King, faz lembrar a tradição dos grandes movimentos dos anos 1960, que dispensava partidos e sindicatos. Ao invés disso, surgiram novos dispositivos de mobilização e de ação.
Foto: DW/J. Carlos
Espelho D’ Água valoriza as serigrafias
A exposição, que também será posteriormente exibida no Porto (a norte de Portugal), encontra-se no Espaço Espelho D’Água, em Lisboa. A calçada deste espaço, tipicamente portuguesa, foi construída com base numa obra do autodidata artista plástico angolano, Yonamine, que tem vivido em diversos países de África, Europa e América do Sul.