Libertados cinco elementos do movimento Lunda Tchokwé
Lusa | Cláudia Pereira
11 de julho de 2017
Cinco elementos do Movimento Protectorado Lunda Tchokwé, que reivindica a autonomia da região leste de Angola, foram libertados após quase sete meses de prisão, informou à Lusa fonte da defesa.
"Isto foi um julgamento, na minha opinião, de caráter político. Porque os membros são integrantes de um movimento que reclama a autonomia e isto é para desencorajar essas pretensões, com detenções frequentes", afirmou o advogado.
O julgamento terminou esta terça-feira (11.07.), no tribunal do Dundo, província da Lunda Norte, e os cinco elementos daquele movimento foram absolvidos do crime de homicídio voluntário na forma tentada, mas condenados a uma pena de quatro meses de prisão efetiva pelo crime de assuada, pela alegada desordem pública provocada na manifestação realizada em Cafunfo, Lunda Norte, a 4 de janeiro.
"O mesmo crime foi expiado porque eles já estão há quase sete meses em prisão e por isso foram hoje libertados. Foram absolvidos do outro crime por falta de elementos de prova, até porque o agente da polícia, apesar de notificado duas vezes, nunca se apresentou em tribunal, bem como outros agentes declarantes. Infelizmente são atos recorrentes, quem faz a queixa, depois não aparece", explicou.
Apesar de o agente alegadamente agredido na manifestação não ter comparecido em tribunal, num julgamento que arrancou no final de maio, o Ministério Público angolano manteve as acusações, por se tratar de um crime público.
As reivindicações do movimento"No entanto, numa outra manifestação realizada em junho, um dos manifestantes foi morto por um segurança da polícia. É um crime público e ninguém foi detido, o que é lamentável", criticou ainda Sebastião Assurreira, recordando que dezenas de outras pessoas foram detidas - entretanto libertadas - nesse outro protesto, bem como várias terão sido feridas pela polícia.
O Movimento Protectorado Lunda Tchokwé defende a instituição do chamado "Reino Lunda", que abrange um vasto território no interior de Angola, do norte a sul, envolvendo as províncias da Lunda Norte, Lunda Sul, Moxico e Cuando Cubango.
Na área norte deste território (Lundas) está concentrada a produção angolana de diamantes, a segunda principal fonte de receitas em Angola, depois do petróleo.
Os promotores desta reivindicação baseiam-se num acordo celebrado entre os representantes de Portugal e da Bélgica, antigas potências coloniais na região, antes da Conferência de Berlim (1884-1885), que delimitou as fronteiras das colónias africanas.
Artivismo: a arte política de André de Castro
O papel político da arte é o mote de "Liberdade Já", a exposição do artista brasileiro André de Castro que lembra, entre outros ativistas, os presos políticos angolanos.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
"Liberdade Já" em serigrafia
A arte pode ter uma missão política - é o que prova esta exposição de André de Castro, a primeira mostra a solo do artista visual brasileiro na Europa. Este primeiro painel à entrada da exposição, em Lisboa, é um tributo aos presos políticos angolanos. O autor deu-lhe o título de "Liberdade Já", slogan que alimentou o movimento de solidariedade internacional pela libertação dos ativistas.
Foto: MUXIMA/A. Ludovice
Debate sobre política internacional
Tanto este projeto "Liberdade Já" (2015) como "Movimentos" (2013-2014) tiveram repercussão mundial. O artista brasileiro destaca, através das suas obras, os jovens presos políticos de Angola, libertados em 2016. As suas imagens acabam por incentivar o debate sobre acontecimentos políticos internacionais.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Os "revús" compõem o painel…
O artista compõe o painel com "monoprints" em serigrafias repetidas. Aqui podem ver-se alguns dos jovens angolanos presos em Luanda, em 2015, por discutirem um livro sobre métodos pacíficos de protesto. Luaty Beirão, Domingos da Cruz, Nuno Álvaro Dala, Nito Alves, Benedito Jeremias e Nelson Dibango, entre outros, foram julgados pelo crime de atos preparatórios para a prática de rebelião.
Foto: DW/J. Carlos
… e multiplicam-se pelo mundo digital
O luso-angolano Luaty Beirão foi escolhido como símbolo do ativismo político, dando força à exposição, com a curadoria da Muxima. Os retratos multiplicaram-se no mundo digital, foram reproduzidos em t-shirts e posters. A venda das serigrafias expostas em mostras coletivas em Lisboa e Nova Iorque, em 2016, reverteu integralmente a favor das famílias dos presos políticos angolanos.
Foto: DW/J. Carlos
Além de Angola...
Em dezembro, André de Castro comemorou com as irmãs a abertura da exposição em Lisboa, que também apresenta rostos de ativistas como José Marcos Mavungo, advogado e ativista de Cabinda. Além de Angola, o artista desafia os visitantes a revisitar o movimento da Primavera Árabe. Dá a conhecer as pessoas e as suas lutas, propondo um ângulo mais pessoal e humano na narração do momento histórico.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Arte como ator social
No interesse do público e das comunidades, o artista brasileiro assume ser um promotor social. "Ao expor 'Movimentos' e 'Liberdade Já' juntos, a mostra permite um recorte da arte como ator social, questionando intenção, receção, apropriação e estética nas ruas e na internet", afirma André de Castro. É o que mostra a coleção "Movimentos", colocada na outra parede da sala.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Coragem para mudar o mundo
Nesta segunda parede, André de Castro imortaliza várias causas em diversas partes do mundo. São mulheres e homens que recusam aceitar a forma como são tratados pelos respetivos Estados. Acreditam, tal como o autor da exposição, que o mundo pode ser muito melhor. Por isso, com coragem, decidiram sair à rua.
Foto: MUXIMA/Andrea Ludovice
Identidade política dos manifestantes…
Este primeiro projeto de André de Castro, em 2013, foi selecionado para a 11ª Bienal Brasileira de Design Gráfico e visto por mais de 40 mil visitantes, passando por Miami (2013), Nova Iorque (2014) e Brasília (2015). As serigrafias, que resultam de entrevistas realizadas através das redes sociais, retratam as identidades políticas dos manifestantes de diferentes países.
Foto: DW/J. Carlos
… e cultura das manifestações
Através das serigrafias, o artista procurou valorizar a força da ação individual dos manifestantes. Cada participante enviou uma foto de rosto, usando as redes sociais, e respondeu a uma série de perguntas sobre a sua identidade política. Assim, foram criados retratos políticos individuais que, em conjunto, formam uma mini etnografia da cultura material e imaterial das manifestações.
Foto: DW/J. Carlos
Do outro lado do mundo
Em Nova Iorque, no Zuccotti Park, a sugestão original foi ocupar Wall Street, símbolo dos capitais financeiros internacionais. Porque, afinal, foi a especulação de capitais que deu origem à crise que atormentou o mundo há anos. Questiona Daniel Aarão Reis, ao apresentar a exposição: "Como aceitar que os responsáveis não ficassem com o fardo principal das medidas de superação desta mesma crise?"
Foto: DW/J. Carlos
Novos dispositivos de mobilização
A arte política de André de Castro, que também evoca figuras como Ghandi e Martin Luther King, faz lembrar a tradição dos grandes movimentos dos anos 1960, que dispensava partidos e sindicatos. Ao invés disso, surgiram novos dispositivos de mobilização e de ação.
Foto: DW/J. Carlos
Espelho D’ Água valoriza as serigrafias
A exposição, que também será posteriormente exibida no Porto (a norte de Portugal), encontra-se no Espaço Espelho D’Água, em Lisboa. A calçada deste espaço, tipicamente portuguesa, foi construída com base numa obra do autodidata artista plástico angolano, Yonamine, que tem vivido em diversos países de África, Europa e América do Sul.