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Livro relata perseguição interna no movimento de independência em Angola

João Carlos (Lisboa)20 de março de 2014

Lançado em Lisboa, “Angola: Sonho e Pesadelo” é considerado “um passo corajoso em defesa da memória política do país."

Mário Pinto de Andrade, líder histórico do MPLA, durante a luta pela independênciaFoto: casacomum.org/Fundo Mário Pinto de Andrade

O autor angolano Adolfo Maria denuncia o que chama de “cultura da exclusão”. “Angola: Sonho e Pesadelo” é o testemunho dos anos de idealismo e perseguição no movimento que lutou pela libertação de Angola.

O “sonho”, segundo o autor, era aquele pelo qual lutaram muitos angolanos contra o colonialismo português. “Era a construção de um país em que o povo fosse feliz e tivesse liberdade”, explica.

Uma parte desse sonho almejado pelos angolanos realizou-se com a libertação do jugo colonial. Os cidadãos angolanos passaram a ser livres e constituíram um Estado, diz o escritor, que foi dirigente da “Angola Combatente”, a emissora do MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola).

No entanto, parte deste sonho acabou se tornando um pesadelo no período pós-colonial. “Inclusive com repressão sobre patriotas que tinham lutado contra o colonialismo português e pela independência nacional”, lamenta.

Ao comentar o seu trabalho, Adolfo Maria conecta a Angola idealizada na época com o atual momento do país. “Pelo menos o sonho que todos nós tínhamos era que a independência resultasse imediatamente no bem-estar geral do povo. Hoje há muita desigualdade social e económica em Angola. Isso deve ser resolvido”, sublinha.

“Revolta Activa”

Nas memórias de Adolfo Maria, há um facto que marca os primeiros anos após a libertação, em 1975.

Cinco meses depois da proclamação da independência, a 13 de abril de 1976, a direção do MPLA decidiu prender vários membros da chamada “Revolta Activa”, que veio a ser extinta depois.

A Revolta Activa era uma tendência dentro de Movimento Pela Libertação de Angola (MPLA), do qual o autor fazia parte. Surgiu em 1974, reivindicava a democratização do movimento.

Ele relata que os mentores daquela política repressiva acabavam adotando a mesma postura opressora contra os companheiros de luta.
“Eram pela supressão do outro, daquele que tem idéias diferentes”, disse.

Adolfo Maria conseguiu esconder-se e viveu cerca de três anos na clandestinidade, tendo voltado a Angola, depois da amnistia presidencial de 1978.

Democracia à angolana

Adolfo Maria acha que Angola é uma democracia ainda imperfeita, que precisa distribuir melhor as suas riquezas para contrapor as desigualdades sociais e económicas.

Para ele há muito trabalho a fazer tanto por parte da corrente política que detém o poder, como da oposição e dos cidadãos. O escritor salienta que, apesar da coação e hegemonia do partido no poder atualmente, “há uma imprensa que diz o que quer”.

Ele considera a liberdade de associação que existe hoje como uma grande diferença. “É radicalmente diferente daquela ditadura que punia até a morte”, opina. O escritor acha que os tempos de pesadelo já passaram.

Na apresentação feita na quarta-feira (19/3), no repleto auditório da Universidade Lusófona, a juíza angolana, Francisca Van Dúnem, Procuradora Geral distrital de Lisboa, refere-se ao autor como um “combatente da liberdade”, que fez registro histórico através de uma narrativa dramática.

“Este livro é uma parte da história das organizações que lutaram pela independência de Angola. Poderia ser apenas a história do exílio interior de um homem. Mas, do meu ponto de vista, é muito mais do que isto. Um homem que se isola do mundo para escapar à repressão dos seus companheiros de armas”, disse a juíza.

Aliás, também é intenção do autor dar a conhecer, sobretudo à nova geração, uma parte da história de Angola, ainda por escrever. Segundo o professor catedrático, Adelino Torres, que assina o prefácio, “Angola precisa de uma história escrita por todas as facções”.

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