"Zungueiras" sofrem nas mãos de agentes de fiscalização
Manuel Luamba
13 de agosto de 2018
Em Luanda, as vendedoras ambulantes, conhecidas como "zungueiras”, queixam-se de maus tratos por parte dos agentes da fiscalização, que lhe passam corridas e até as agridem. Ativista fala em Justiça desigual.
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Luciana Nsumba é uma das muitas zungueiras que encontram nas ruas de Luanda o sustento dos filhos. Mas não é fácil garantir o pão durante o dia devido à ação dos agentes da fiscalização. Luciana Nsumba já chegou a ser presa algumas vezes.
"Já fui presa cerca de três vezes no bairro Uige e no São Paulo nas corridas. Na prisão, fica-se mesmo de castigo. Não se vai lá fora. Quando alguém vem te ver, eles dizem: ‘a fulana não está aqui'. E você fica mesmo ali, a sofrer, sem água e sem comida. Se eles quiserem, perguntam: ‘tens marido?'. Se disseres que tens, mandam chama-lo para ele pagar a multa de dez mil kwanzas [cerca de 33 euros]”, explicou à DW África.
Luciana Nsumba revelou ainda que muitas vezes as zungueiras são vítimas de agressão na rua e os seus produtos são levados pelos fiscais do Estado.
"Eles dão corrida, depois de te agarrar, e levam o negócio. Depois de ser levado o negócio, ainda te batem. Eles sabem que vão cobrar dinheiro para devolver o negócio, mas ainda te dão muitas voltas”, acrescentou.
Luanda: "zungueiras" sofrem violência por parte de agentes de fiscalização
Ser zungueira pode ser fatal
As corridas são constantes. Na tentativa de fugir dos fiscais, muitas vezes as zungueiras são atropeladas porque vendem os seus produtos à berma das estradas. Ainda na última quinta-feira (9.08) uma zungueira sobreviveu a um atropelamento no município de Viana, mas há situações em que acabam por morrer, denuncia a ativista Laurinda Gouveia.
"Muitas zungueiras ao vender e ao fugir dos fiscais atravessam as estradas e ao atravessar o carro bate-lhes e acabam por morrer. E outras morrem por espancamento”, conta Laurinda Gouveia.
Ainda assim, os fiscais não são responsabilizados. No entanto, o Tribunal Provincial de Luanda, condenou, no mês passado, a cidadã Maria Francisco Bento, de 45 anos, a cinco meses de prisão convertidos em multa por agredir um agente da fiscalização quando tentava remover a sua viatura mal estacionada na via pública.
Justiça não é igual para todos
Para Laurinda Gouveia, a "Justiça devia ser para todos” e que também devia haver responsabilização par os fiscais e o próprio Governo.
"Fazem isso porque o Governo acha que tem que manter a cidade limpa e manter a cidade limpa é combater as zungueiras ao invés de olhar para questões básicas. Elas só estão na rua porque vão buscar algumas coisas para comer”, defende Laurinda Gouveia.
Friedensdorf em Angola
A Friedensdorf começou a viajar até Luanda há duas décadas para recolher crianças doentes para tratamento médico na Alemanha e levar de volta outras já recuperadas. A 56ª ação de ajuda aconteceu em 2014.
Foto: DW/M. Sampaio
20 anos de ajuda a crianças doentes
Já passaram duas décadas desde que a Friedensdorf International começou a viajar até Luanda para recolher crianças doentes para tratamento médico na Alemanha e levar de volta outras já recuperadas. Desde a sua criação, há 47 anos, a organização não-governamental já ajudou crianças doentes de mais de 50 países, incluindo cerca de 3 mil crianças angolanas. Em 2014, aconteceu a 56ª ação de ajuda.
Foto: DW/M. Sampaio
Ritmos angolanos na despedida
Kuduro e outras danças angolanas são uma constante na festa de despedida que a Friedensdorf organiza na sua sede em Oberhausen, no centro-leste da Alemanha, antes da partida para Angola das crianças já recuperadas. Depois de várias operações e tratamentos, as crianças estão ansiosas por voltar à terra natal e rever a família. Mas os amigos que fizeram na Alemanha também vão deixar saudades.
Foto: DW/M. Sampaio
Experiência única
Para casa as crianças levam também uma experiência única, afirma Hannah Lohmann, porta-voz da Friedensdorf. “Neste momento, temos connosco meninos e meninas de nove países. São cristãos e muçulmanos, brancos e negros, africanos e asiáticos. Em comum têm o facto de todos terem vindo para a Alemanha para se curarem e isso cria uma ligação entre eles, que ultrapassa fronteiras e idiomas”, explica.
Foto: DW/M. Sampaio
Regresso azul
Quando regressa, cada criança recebe um saco azul de desporto, onde, além de roupa e medicamentos, cabem pequenos presentes que elas mesmas fizeram para a família e lembranças da estadia na Alemanha – brinquedos em madeira ou saquinhos de pano feitos à mão, por exemplo. Partem do Aeroporto de Düsseldorf, num avião fretado pela Friedensdorf. A bordo segue uma equipa da ONG, que inclui um médico.
Foto: DW/M. Sampaio
Luanda à vista
Depois de quase dez horas de voo, o avião aterra finalmente na capital angolana. À espera no Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro, em Luanda, costumam estar dois membros da ONG alemã, que viajam mais cedo para o país para tratar das formalidades da nova leva de doentes, e uma equipa da organização parceira angolana Kimbo Liombembwa, versão kimbundu da "Aldeia da Paz".
Foto: DW/M. Sampaio
Reencontro familiar
Do aeroporto as crianças que regressam da Alemanha seguem depois para a sede da Kimbo Liombembwa, um pequeno espaço situado no Hospital Pediátrico Dr. David Bernardino. É aqui que são oficialmente entregues aos pais, que voltam a abraçar os filhos depois de vários meses de ausência. A separação não é fácil, mas os resultados compensam, reconhecem muitos pais.
Foto: DW/M. Sampaio
Perda de Rosalino Neto
A Friedensdorf e a Kimbo Liombembwa lamentam a perda do médico Rosalino Neto, que dirigia a organização parceira. O fundador da Ordem dos Médicos de Angola morreu em junho passado, aos 63 anos, vítima de doença prolongada. Acompanhou as operações de ajuda desde o início e esteve várias vezes na Alemanha. As primeiras crianças chegaram à Alemanha em 1994, durante a guerra civil que durou 27 anos.
Foto: DW/M. Sampaio
Últimas recomendações
No dia da entrega das crianças aos pais, a equipa da Friedensdorf faz sempre um resumo dos tratamentos médicos realizados e deixa também uma série de recomendações. Muitas vezes é preciso continuar os exercícios de fisioterapia em casa ou trocar os sapatos ortopédicos quando estes deixarem de servir. Durante muitos anos, o médico Rosalino Neto traduziu as explicações da ONG aos pais.
Foto: DW/M. Sampaio
Alemanha, a última esperança
A Alemanha é a última esperança para muitos angolanos. O conflito no país terminou há 12 anos, mas a colaboração continua. Se antes se tratavam ferimentos causados pela guerra, hoje as doenças são causadas pela pobreza. A mortalidade infantil é uma das mais altas do mundo e metade da população vive abaixo do limiar da pobreza. O crescimento económico e os petrodólares não se refletem na saúde.
Foto: DW/M. Sampaio
Diagnósticos problemáticos
Os problemas de saúde das crianças são de vários tipos: infeções ósseas, malformações congénitas, queimaduras graves, luxações, fraturas expostas, subnutrição. Algumas sofreram acidentes e não foram devidamente tratadas na altura. E os pequenos corpos escondem também outros problemas não visíveis. Diagnósticos precisos sobre o seu estado de saúde também são um problema, segundo a Friedensdorf.
Foto: DW/M. Sampaio
Kimbo Liombembwa
Criada há 13 anos, a organização parceira angolana tem equipas de voluntários por todo o país para identificar crianças com doenças que não podem ser tratadas localmente. Já foram beneficiadas cerca de três mil crianças de várias regiões de Angola. A viagem das províncias até Luanda chega a durar três dias. Para as ações de ajuda a “Aldeia da Paz” conta também com o apoio da Embaixada da Alemanha.
Foto: DW/M. Sampaio
Comunicação sem fronteiras
A maior parte das crianças não sabe falar alemão, mas a comunicação não é um problema. "Sabemos algumas palavras em português, como 'tá fixe'. E quando querem ir à casa de banho, xixi todos entendem!", explica a porta-voz da Friedensdorf. Além disso, as crianças comunicam por sinais. A bordo costumam também seguir crianças que viajam para a Alemanha pela segunda vez e que servem de tradutoras.
Foto: DW/M. Sampaio
Ciclo da ajuda continua
No Aeroporto de Luanda, dois autocarros transportam as crianças até ao avião. Durante a viagem, redobram-se os cuidados com os novos pacientes. Quando chegam à Alemanha, os casos mais graves são imediatamente encaminhados para os hospitais. As restantes crianças seguem para a Friedensdorf, em Oberhausen. O ciclo da ajuda não fica por aqui. A próxima viagem já está agendada para maio de 2015.