Os músicos são cabeça de cartaz, neste sábado (03.12), entre os concertos que assinalam o décimo aniversário do Musicbox, um emblemático espaço cultural de Lisboa, com previsão de casa cheia.
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Os rappers e ativistas angolanos celebram 20 anos de amizade e sobem ao palco juntos para cantar versos e rimas que exaltam a atual realidade sócio-política de Angola, onde têm sido frequentes atos por parte do poder com o objetivo de limitar a liberdade de expressão e a participação cívica.
"Ikopongo” é o espetáculo que os dois músicos angolanos apresentam em Lisboa, o mesmo que as autoridades angolanas proibiram em Luanda, sem qualquer explicação, em novembro passado. MCK, uma das vozes críticas e discordantes do regime de Luanda, confirma em entrevista à DW África que, depois de três tentativas, foram proibidos os concertos que deveriam ter lugar na capital angolana.
Segundo o rapper, todas estas proibições têm algo em comum. "A primeira tentativa foi na Rádio Vial, a segunda no Chá de Caxinde e a terceira no Cine Tivoli. Em nenhuma dessas conseguimos, mas todas têm algo em comum: a violação de um direito, de um acordo contratual. E, na maior parte dos casos, por um ato arbitrário ou sem qualquer respaldo jurídico-legal, fomos impedidos sem uma justificação de lei como tal".
"Ikopongo" - Resistência
Mas, como "Ikopongo” significa resistência – explica o cantor – o grupo conseguiu realizar o concerto em Angola num sítio secreto, em sala fechada e sem público, com transmissão em direto via Internet. Foi a forma que os músicos encontraram para mostrar que a sua arte é de afirmação artístico-cultural.
"Infelizmente, por falta de liberdade, como acontece em quase tudo em Angola, não existem muitos espaços de abertura democrática para discussão e reflexão, para debate e reivindicação, e às vezes para apresentação de uma mera sugestão. E vamos realizar o concerto aqui em Lisboa, no Musicbox”.
Liberdade em Angola?
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O músico tem um olhar crítico sobre a vida política angolana. Hoje com "a liberdade excessiva” proporcionada pelas redes sociais, ele vê o futuro de outra maneira. MCK diz que o movimento de jovens ativistas como ele representa a geração que rompeu o ciclo do medo em Angola.
"Tal como nós, existem hoje vários jovens ousados em Angola que querem experimentar o sabor da liberdade. Entretanto, eu acho que, por força disso, vai ser difícil manter a atmosfera de medo [na sociedade angolana] que, na maior parte dos casos era mantida como uma violência silenciosa e tácita. Era a violência do dinheiro. Hoje, Angola tem menos dinheiro para corromper a consciência das pessoas. Tem menos dinheiro para silenciar as pessoas e para comprar até a opinião internacional. E na maior parte dos casos fazem muito isso com a imprensa portuguesa”.
Futuro
Entretanto, MCK antevê uma Angola mais aberta no futuro - principalmente no que toca às liberdades fundamentais consagradas na Constituição. E acredita que, com uma possível retirada do Presidente José Eduardo dos Santos, o seu sucessor não ficará no poder por mais de 30 anos."Do meu ponto de vista, para quem como eu que nunca experimentou outra coisa, José Eduardo dos Santos foi presidente dos meus avós, do meu pai, meu, da minha filha; entretanto, tudo o que vier depois vai ser menos grave do que isso. Terei a garantia que o próximo presidente já não vai ficar no poder, por exemplo, mais de 30 anos. Isso é um facto, é uma garantia”, diz o músico.
02.12.2016 MCK/Luaty Beirão - Lisboa - MP3-Mono
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O concerto em Lisboa conta com a participação de Luaty Beirão, do grupo dos 17 jovens acusados pela justiça angolana por envolvimento em atos preparatórios de rebelião. Em conversa com a DW, o "rapper” luso-angolano – que faz nesta cidade o primeiro concerto após a sua prisão em Luanda –, exalta o papel da música na mobilização de mais consciências e admite que ela tem estado a contribuir para mudanças em Angola.
"Heróis de hoje": Os mais votados pelos leitores da DW África em 2015
Durante um mês, a DW África pediu aos seus leitores sugestões para "heróis de hoje". Chegaram numerosas respostas e muitas concentraram-se numa dúzia de pessoas. Saiba quem foram os "heróis de hoje" mais votados.
Foto: Maka Angola
12° lugar: William Tonet
O jornalista angolano foi a décima segunda pessoa mais votada pelos ouvintes da DW como "herói de hoje". Tonet é diretor e proprietário do semanário independente "Folha 8" e um dos jornalistas mais conhecidos de Angola. No ano passado, foi constituído arguido num processo que lhe foi movido pelos serviços secretos angolanos por difamação e injúria. Tratou-se da 98ª vez que Tonet foi processado.
Foto: DW/N. Sul d'Angola
11° lugar: Nelson Mandela
Embora tenha sido um concurso da DW África à procura de "heróis de hoje", Nelson Mandela reuniu um número grande de propostas. O ex-Presidente da África do Sul (de 1994 a 1999) e líder da luta contra o regime racista do "Apartheid" faleceu no dia 5 de dezembro de 2013. Mesmo assim, continua ser um símbolo mundial da luta por uma sociedade mais justa e sem discriminação racial.
10° lugar: Jonas Malheiro Savimbi
Mais um político já falecido fica no décimo lugar. Jonas Savimbi foi guerrilheiro e líder histórico da UNITA (União Nacional para a Independência Total de Angola) durante mais de 30 anos. Combateu o colonialismo português e depois da independência de Angola em 1975, o Governo do MPLA. Após a morte de Savimbi em combate em 2002, a UNITA assinou um acordo de paz e passou a ser um partido político.
Foto: Getty Images/Keystone
9° lugar: Samora Machel
O nono lugar dos "heróis de hoje" mais votados também pertence a um político já falecido. Samora Moisés Machel foi líder da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique), de inspiração marxista. A seguir à independência de Moçambique, em 1975, tornou-se o primeiro Presidente do país. Em 1986, morreu num acidente de aviação, cujas causas continuam por esclarecer, nos Montes Libombos, África do Sul.
Foto: Getty Images/Keystone
8° lugar: Carlos Serra Júnior
O jurista é o ambientalista moçambicano mais conhecido. Ficou famoso pelas suas campanhas contra o desmatamento descontrolado das florestas do seu país. Denunciou práticas ilegais dos madeireiros e dos compradores dos troncos, que em muitos casos acabaram por ser exportados para a China. Ultimamente, Carlos Serra envolveu-se em campanhas contra sacos plásticos e a favor da limpeza das praias.
Foto: privat
7° lugar: Os 15 ativistas detidos em Angola
Muitos ouvintes da DW votaram nos 15 ativistas que estão detidos desde junho, sob a acusação de planearem um golpe de Estado. Vários também votaram em Nito Alves (na foto), o jovem que já foi preso em 2014 depois de ter mandado imprimir camisolas com dizeres considerados ofensivos sobre o Presidente angolano. O rapper Luaty Beirão ("Brigadeiro Mata Frakus") foi outro ativista preso muito votado.
Foto: DW/Nelson Sul D´Angola
6° lugar: Afonso Dhlakama
Assumiu a liderança da RENAMO após a morte do primeiro presidente do movimento, André Matsangaíssa, em 1979. Em 1992, assinou um acordo de paz com o Governo da FRELIMO pondo fim à guerra civil. Candidatou-se cinco vezes à Presidência e lidera a oposição moçambicana. Dhlakama goza de popularidade entre os ouvintes da DW, apesar dos confrontos armados dos últimos anos entre a RENAMO e o Governo.
Foto: António Cascais
5° lugar: David Mendes
O advogado é conhecido como um dos maiores defensores dos direitos humanos, das liberdades e do Estado de Direito em Angola. Nos últimos anos, David Mendes defendeu muitos prisioneiros políticos como Nito Alves. Como membro da organização não-governamental Associação Mãos Livres é uma das vozes mais relevantes da sociedade civil angolana.
Foto: DW/P.B. Ndomba
4° lugar: Brigadeiro Dez Pacotes
O músico angolano Brigadeiro Dez Pacotes recebeu muitos votos dos ouvintes da DW, que louvaram a sua coragem de enfrentar o Governo do MPLA. Em 2011 (na foto), num vídeo no portal Youtube, criticou a censura do seu disco "Ditadura da Pedra" , cuja venda foi proibida pelo Ministério da Cultura. É tido como uma das vozes mais conhecidas dos chamados "jovens revolucionários" angolanos.
Foto: Screenshot Youtube
3° lugar: Azagaia
O rapper moçambicano Azagaia (Edson da Luz) tornou-se famoso através da sua música "Povo no Poder", sobre os protestos contra o aumento dos preços dos táxis coletivos, os chamados "chapas", em 2008. Várias emissoras estatais deixaram de tocar a música. Nos anos seguintes, o cantor fez jus aos seu nome artístico quando lançou críticas ácidas ao Governo da FRELIMO e contra a violência policial.
Foto: DW/R.d.Silva
2° lugar: Alice Mabota
Em segundo lugar está a advogada moçambicana Alice Mabota, a única mulher dentro dos 12 "heróis de hoje" mais votados pelos ouvintes da DW África. Durante muitos anos, foi uma das vozes mais ativas da sociedade civil de Moçambique como presidente da organização não-governamental Liga dos Direitos Humanos (LDH). Como advogada, Alice Mabota também defendeu António Muchanga, o porta-voz da RENAMO.
Foto: DW/Leonel Matias
1° lugar: Rafael Marques
No pódio como "herói de hoje" dos ouvintes da DW África está o jornalista angolano Rafael Marques. Denuncia a corrupção em Angola através do seu portal Maka Angola e tem sido uma das vozes mais críticas em relação ao Governo de José Eduardo dos Santos (MPLA). Recentemente, foi condenado a seis meses de prisão suspensa, acusado de denúncia caluniosa por causa do seu livro "Diamantes de Sangue".