A demissão do chefe do Governo é a primeira etapa para a nomeação de um primeiro-ministro de consenso, a pedido do Alto Tribunal Constitucional, para ultrapassar a crise política no país.
Publicidade
"Vou entregar a minha demissão ao Presidente da República hoje. Enquanto homem de Estado, não serei um obstáculo à vida da Nação", declarou Olivier Mahafaly Solonandrasana, num encontro com a imprensa nesta segunda-feira (04.06), na capital malgaxe.
"Aceito sem problemas e com alegria demitir-me. Não tenho nada a lamentar e posso sair de cabeça erguida", acrescentou o primeiro-ministro, que cumpre uma decisão judicial que ordenou a formação de um novo Governo de consenso para acabar com uma crise política em Madagáscar.
Desde abril, centenas de partidários da oposição manifestam-se contra o pacote de reformas eleitorais proposto pelo Presidente Hery Rajaonarimampianina. Mas depois que essas propostas foram derrubadas pelos tribunais, os protestos se tornaram um movimento para expulsar o chefe de Estado.
Governo de consenso
Entretanto, o Tribunal Constitucional determinou que a composição do novo Governo de consenso deve refletir proporcionalmente o resultado das últimas eleições legislativas em 2013. Mas, a decisão desencadeou um debate entre o Governo e a oposição sobre sua interpretação. Ambos os lados dizem que detêm a maioria no Parlamento, onde muitos deputados mudaram de alianças desde 2013.
"Estamos no processo de implementar o acordo político. Sem a renúncia do nosso primeiro-ministro, o Presidente não poderia nomear um novo", disse Rivo Rakotovao, chefe do partido do Presidente (HVM) e líder do Senado.
No fim de semana, Rajaonarimampianina rejeitou três indicações da oposição para o cargo de primeiro-ministro de consenso. Todos os nomeados são membros do partido Mapar, liderado pelo ex-presidente Andry Rajoelina.
"Nós nos comprometemos. Reitero meu apelo (do fim de semana) para um primeiro-ministro que não é do lado deles ou do nosso", acrescentou Rakotovao.
Nem os esforços domésticos nem internacionais para resolver a crise na antiga colónia francesa deram frutos. O esforço mais recente, uma reunião do Conselho de Reconciliação Nacional, que incluiu delegados do Governo e da oposição, terminou sem sucesso na sexta-feira.
O ministro da Defesa, Beni Xavier Rasolofonirina, ameaçou na quinta-feira mobilizar forças de segurança se os esforços políticos para resolver a crise fracassarem.
"A renúncia é lógica em termos da crise atual. Agora eles devem nomear uma nova PM entre os 73 legisladores da oposição", disse o parlamentar de Mapar, Jean-Brunel Razafitsiandraofa.
O novo líder do Executivo "de consenso" deverá ser nomeado até 12 de junho, de acordo com o calendário fixado pelo Alto Tribunal Constitucional.
Madagáscar - Pobre ilha rica
A ilha de Madagáscar é famosa pela biodiversidade, fertilidade e riqueza em matérias primas. Mas a perene crise política paralisa a economia e agrava a pobreza da população.
Foto: DW/F.Müller
Recuo económico no país em crise
O país no Oceano Índico é rico em matérias primas, incluindo enormes reservas de titânio, níquel e petróleo no chão e ao largo da costa. Não obstante, uma grande parte da população vive na pobreza. Há quatro anos que uma crise política assola o país, que paralisa também a economia nacional. Os malgaxes vivem na incerteza, no medo e com grandes problemas financeiros.
Foto: DW/F.Müller
Isolado e empobrecido
Sob a politica económica liberal do Presidente Marc Ravalomanana, e graças a investimentos e assistência ao desenvolvimento, a economia malgaxe recuperou um pouco entre 2002 e 2008. Andry Rajoelina, encontra-se no poder desde o seu golpe de Estado em 2009, à frente de um controverso Governo de transição. Os países doadores congelaram a assistência e os preços dos alimentos básicos subiram.
Foto: DW/F.Müller
O dinheiro não chega para uma refeição quente
Nas ruas da capital, Antananarivo, um prato com arroz com um pouco de carne e legumes custa cerca de 500 ariary, o que equivale a 17 cents do euro. O que é muito dinheiro no Madagáscar. Segundo o Banco Mundial, 92% da população vive do equivalente a menos de 1,50 euros por dia. Muitas famílias passam fome.
Foto: DW/F.Müller
Colheitas pobres
Não obstante do cultivo extensivo de arroz, o principal alimento malgaxe também tem que ser importado. Mesmo havendo solos férteis e água abundante. Mas a agricultura não desenvolveu o seu potencial. Apesar de quase 90% da população trabalhar na agricultura, o sector só gera um quarto do Produto Interno Bruto, diz o Banco Mundial.
Foto: DW/F.Müller
Natureza perigosa
Partes da ilha são regularmente assoladas por ciclones, cheias e secas extremas, ameaçando as colheitas. Ainda não existe um sistema eficiente de alerta e protecção. Acresce a invasão de uma praga de gafanhotos desde a primavera de 2012. A produção de arroz arrisca-se a perdas enormes de até 630 000 toneladas por ano, estima a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, FAO.
Foto: DW/F.Müller
Ajuda inicial para agricultores
Desde que começou a crise política e económica em 2009, muitas pessoas procuram o seu ganha pão na agricultura. É frequente não terem a formação necessária, só conhecerem técnicas antiquadas e não terem dinheiro para comprar maquinaria, diz a organização não-governamental CITE. Esta ONG ajuda os jovens agricultores a levarem os seus produtos para o mercado.
Foto: DW/F.Müller
À espera de clientes
A agricultura representa a única esperança também para Jean-Noël und Erick Régis. Por enquanto ainda se esforçam por alimentar a família trabalhando como condutores de riquixás na cidade de Antsirabe, no centro do país. Mas nem todos os dias conseguem pagar a renda equivalente a dois euros para o “pousse-pousse”. Antes da crise tinham 20 clientes nos dias bons, hoje são apenas quatro ou cinco.
Foto: DW/F.Müller
Receio pelos zebus
Para muitas famílias, os zebus são animais de trabalho, alimento e investimento e cruciais à sobrevivência. Mas com a crise aumentou a criminalidade. Quase diariamente os jornais relatam assaltos de ladrões de gado a aldeias, das quais roubam centenas de cabeças. A esta prática deu-se o nome de “dahalo”. Os conflitos com os habitantes e as forças de ordem muitas vezes resultam e mortos e feridos.
Foto: DW/F.Müller
Viver na insegurança
Eliane (atrás, à direita) perdeu o seu irmão num desses assaltos. Os “dahalo” mataram-no, diz. Juntamente com os seus familiares, Eliane colhe algodão num campo no sul seco do Madagáscar. A família vive, sobretudo, do cultivo de mandioca e milho. Mas no ano passado um ciclone destruiu grande parte da colheita. Eliane tem à sua disposição por ano mais ou menos o equivalente a 100 euros.
Foto: DW/F.Müller
Eleições para sair da crise?
Antananarivo, a capital, é o centro político do Madagáscar. Os observadores são unânimes: para que o país se liberte da crise e da pobreza é necessário pôr termo à situação de transição política. Mas as eleições já foram adiadas por várias vezes. De qualquer modo, muitos malgaxes dizem que não importa quem governa o país. Importa ter o que comer no dia seguinte.