Mali: 13 mil soldados da ONU em retirada sem precedentes
AP | Lusa
29 de agosto de 2023
Por exigência da junta militar, as Nações Unidas estão a retirar do Mali quase 13 mil soldados que fazem parte da missão de estabilização. Uma operação "sem precedentes", sublinha o secretário-geral António Guterres.
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O enviado especial da ONU para o Mali, El-Ghassim Wane, deu a conhecer os detalhes da operação ao Comité das Nações Unidas, segunda-feira (28.08). Os 12.947 soldados da paz e a polícia da Missão de Estabilização Multidimensional Integrada das Nações Unidas no Mali (MINUSMA) devem regressar pa casa, os seus 12 campos e uma base temporária terão de ser entregues ao governo e 1.786 funcionários civis dispensados até 31 de dezembro, como exige o Governo do Mali.
Numa carta distribuída aos membros do Conselho de Segurança da ONU, António Guterres disse que "o cronograma, o âmbito e a complexidade da retirada" da missão "não têm precedentes".
O "vasto terreno do país sem litoral, o ambiente operacional hostil em certas regiões e os seus climas tornam a retirada da missão dentro de um prazo de seis meses extremamente difícil", admitiu o secretário-geral.
Guterres disse que a logística de movimentação de tropas e equipamento é ainda mais limitada pela presença de "grupos armados terroristas" e pela recente tomada do poder por parte de uma junta militar no vizinho Níger.
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Uma missão complexa
O líder da missão no Mali disse na reunião que a retirada registou "progressos significativos" e está no "bom caminho", mas admitiu que a segunda fase poderá ser "extremamente difícil", devido aos mesmos fatores mencionados por Guterres.
El-Ghassim Wane deu como exemplo a experiência do encerramento do campo de Ber, no qual o último comboio de "capacetes azuis", equipamentos e materiais levou 51 horas para percorrer um percurso de 57 quilómetros para chegar à cidade de Timbuktu.
"Isso deveu-se à natureza do terreno, que é desfavorável - situação agravada pela estação chuvosa - e insegurança. Este comboio foi atacado duas vezes por elementos extremistas não identificados, ferindo quatro capacetes azuis e danificando três veículos antes de chegar a Timbuktu", disse.
Desde 2012, o Mali enfrenta uma profunda crise de segurança que começou no norte e se espalhou para o centro do país, bem como para os vizinhos Burkina Faso e Níger.
A MINUSMA, que está há 10 anos no país africano, começou a abandonar as suas posições depois de em junho o Governo transitório maliano, liderado por uma junta militar, pedir a sua retirada "imediata", solicitação que foi aprovada posteriormente pelo Conselho de Segurança da ONU.
Golpes de Estado em África: Um mal endémico
Em menos de um ano, o continente africano viveu oito golpes e tentativas de golpe de Estado. A maior parte aconteceu na África Ocidental, região do continente mais fértil para as intentonas. Não há fator surpresa.
Foto: Radio Television Guineenne/AP Photo/picture alliance
Níger: Tentativa de golpe fracassada
A tentativa de golpe de Estado aconteceu a 31 de março de 2021, dois dias antes da tomada de posse do Presidente Mohamed Bazoum. Na capital, Niamey, foram detidos alguns membros do Exército por detrás da tentativa. O suposto líder do golpe é um oficial da Força Aérea encarregado da segurança na base aérea de Niamey. O Níger já sofreu 4 golpes de Estado: o último, em 2010, derrubou Mamadou Tandja.
Foto: Bernd von Jutrczenka/dpa/picture alliance
Chade: Uma sucessão com sabor a golpe de Estado
Pouco depois do marechal Idriss Déby ter vencido as presidenciais, morreu em combate contra rebeldes. A 21 de abril de 2021, o seu filho, o general Mahamat Déby, assumiu a liderança do país, sem eleições, nomeando 15 generais para o Conselho Militar de Transição, entre eles familiares seus. Idriss governou o Chade por mais de 30 anos com mão de ferro e o filho dá sinais de lhe seguir os passos.
Foto: Christophe Petit Tesson/REUTERS
Mali: Um golpe entre promessas de eleições
O coronel Assimi Goita foi quem derrubou Bah Ndaw da Presidência do Mali a 24 de maio de 2021. Justifica que assim procedeu porque tentava "sabotar" a transição no país. Mas Goita prometeu eleições para 2022 e falou em "compromisso infalível" das Forças Armadas na defesa da segurança do país. Pouco depois, o Tribunal Constitucional declarou o coronel Presidente da transição.
Foto: Xinhua/imago images
Tunísia: Um golpe de Estado sem recurso a armas
No dia 25 de julho de 2021, Kais Saied demitiu o primeiro ministro, seu rival, Hichem Mechichi, e suspendeu o Parlamento por 30 dias, o que foi considerado golpe de Estado pela oposição, que convocou manifestações em nome da democracia. Saied também levantou a imunidade dos parlamentares e garantiu que as decisões foram tomadas dentro da lei. Nas ruas de Tunes, teve o apoio da população.
Foto: Fethi Belaid/AFP/Getty Images
Guiné-Conacri: Um golpista da confiança do Presidente
O dia 5 de setembro de 2021 começou com tiros em Conacri, uma capital que foi dominada por militares. O Presidente Alpha Condé foi deposto e preso pelo coronel Mamady Doumbouya - que dissolveu a Constituição e as instituições. O golpista traiu Condé, que o tinha em grande estima e confiança. Doumboya tinha demasiado poder e não se entendia com a liderança da ala castrense.
Foto: Radio Television Guineenne via AP/picture alliance
Sudão: Golpe compromete transição governativa
A 25 de outubro de 2021, os golpistas começaram por prender o primeiro ministro, Abdalla Hamdok, e outros altos quadros do Governo para depois fazerem a clássica tomada da principal emissora. No comando estava o general Abdel Fattah al-Burhan, que dissolveu o Conselho Soberano. Desde então, o Sudão vive manifestações violentas, com a polícia a ser acusada de uso excessivo de força.
Foto: Mahmoud Hjaj/AA/picture alliance
Burkina Faso: Golpe de Estado festejado
A turbulência marcou o começo do ano, mas a intentona foi celebrada em grande nas ruas da capital, Ouagadougou. A 23 de janeiro de 2022, o tenente-coronel Paul Damiba liderou o golpe de Estado ao lado do Exército. Ao Presidente Roch Kaboré não restou outra alternativa se não demitir-se. Tal como os golpistas de outros países, comprometem-se a voltar à ordem constitucional após consultas.
Foto: Facebook/Präsidentschaft von Burkina Faso
Guiné-Bissau: Intentona ou "inventona"?
Tiros, alvoroço, mortos e feridos no Palácio do Governo marcaram o dia 1 de fevereiro de 2022 em Bissau. O Presidente Umaro Sissoco Embaló diz que os golpistas queriam matá-lo e ao primeiro ministro, Nuno Nabiam. Houve algumas detenções, mas até hoje não se conhece o líder golpista. No país, acredita-se que tudo não passou de um "teatro" orquestrado pelo próprio Presidente, amplamente contestado.