Mali: Violência nas ruas nas vésperas das presidenciais
Rodrigue Guézodjè | Reuters | AFP | DPA | cvt
5 de junho de 2018
Fim de semana ficou marcado pela repressão policial de uma manifestação da oposição. Organizadores acusam autoridades de orquestrar violência e planeiam novo protesto para esta semana.
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A calma voltou às ruas de Bamako, capital do Mali, esta segunda-feira (04.06), depois de um fim de semana agitado pela repressão policial de um protesto da oposição que deixou 25 feridos.
A escalada de violência tem lugar a apenas algumas semanas da realização das eleições presidenciais, marcadas para 29 de julho. A oposição acusa o poder de orquestrar a violência e já está a planear uma nova manifestação.
No protesto de sábado (02.03), os manifestantes exigiram a organização de eleições transparentes e acesso equitativo aos meios de comunicação públicos. A manifestação não tinha sido autorizada e foi reprimida pelas forças de segurança. Os protestos estão proibidos no país, com base no estado de emergência que se encontra em vigor desde o atentado de 2015 contra um hotel em Bamako no qual 20 pessoas morreram.
"A marcha é um direito. Mesmo nas democracias mais antigas do mundo, quando uma marcha não é autorizada, os agentes de segurança pública têm os equipamentos apropriados para manter a ordem", diz Bou Touré, membro do bureau político do partido da oposição RPM, criticando a resposta violenta das forças de segurança.
Críticas ao chefe de Estado
No domingo, os partidos da oposição do Mali condenaram a violência policial usada para dispersar os seus apoiantes. As formações políticas afirmam que a polícia usou munição real e cassetetes contra manifestantes desarmados e acusam os agentes de lançar gás lacrimogéneo no quartel-general do partido ADP, da oposição.
Soumaila Cisse, líder da oposição e candidato à Presidência do Mali, diz que "o Presidente [Ibrahim Boubacar Keita] está a procurar maneiras de não realizar a eleição".
Para o líder da oposição, Boubacar Keita "quer permanecer no poder" e "sabe que se houver uma eleição, será derrotado".
Mali: Violência nas ruas a um mês das presidenciais
"Está em pânico. Mas não vamos deixar que esse clima de pânico nos desencoraje, continuaremos a lutar pelo nosso país, para que continue a ser uma democracia. Mas não vamos aceitar o que aconteceu, e vamos reagir no devido tempo", garante.
O primeiro-ministro Soumeylou Boubeye Maiga nega "formal e vigorosamente" as declarações, que define como "falsas e caluniosas".
Entretanto, a oposição já está a anunciar uma nova manifestação para a próxima sexta-feira, e há receios de uma nova escalada da violência no país.
Sociedade civil preocupada
Para o ativista Youssouf Mohamed Bathily, é importante que o poder em vigor mude os seus métodos para tranquilizar a população. O ativista classifica os últimos acontecimentos como "uma grande traição" e "um ataque grave à democracia" num período pré-eleitoral.
"Poucos dias depois da declaração de sua candidatura às eleições de 29 de julho, o Presidente garantiu que seria uma campanha eleitoral pacífica e republicana. Não deveria ser culpado de atos dignos de uma ditadura, dignos do fascismo", lamenta.
Em comunicado, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, pediu "tranquilidade e moderação", após a sua visita à nação da África Ocidental no início desta semana.
Esta segunda-feira, a União Europeia exortou o Governo do Mali a respeitar a "liberdade de expressão" e "mostrar moderação". Bruxelas prometeu enviar observadores eleitorais para o Mali.
Eleições no Mali de 2013: Um novo começo?
Gao, nas margens do rio Níger, é a cidade comercial mais importante do norte do Mali. As mercadorias são transportadas pelo rio em grandes canoas. Gao também abastece a cidade de Kidal. A normalidade regressa lentamente.
Foto: Katrin Gänsler
Gao anseia por normalidade
Gao, nas margens do rio Níger, é a cidade comercial mais importante do norte do Mali. As mercadorias são transportadas pelo rio em grandes canoas. Gao também abastece a cidade de Kidal.
Foto: Katrin Gänsler
De centro de comércio a teatro de guerra
Com a chegada do Movimento Nacional de Libertação de Azawad (MNLA), em março de 2012, a vida agitada da cidade mudou drasticamente. “Eles destruíram tudo”, queixa-se Mamai, que trabalha como vigilante na escola católica de Gao, da qual só resta o edifício. Por que é que fizeram isso? Mamai encolhe os ombros: “Só queriam causar estragos. Não encontro outro motivo.”
Foto: Katrin Gänsler
Confrontos em Gao deixam marcas
Rapidamente o MNLA teve de devolver o poder. Em abril de 2012, houve batalhas com o Movimento para a Unidade e a Jihad na África Ocidental (MUJAO). O movimento derrotou os rebeldes tuaregues e estabeleceu a sua sede numa esquadra da polícia em Gao. Testemunhas dos renhidos confrontos são os buracos aí deixados pelas balas.
Foto: Katrin Gänsler
Edifício da polícia é tabu
Quem quebrou as regras da Sharia, ficou detido no edifício da polícia. Foi aqui que os islamitas mantiveram as mulheres. As mulheres mais bonitas foram levadas para o primeiro andar, onde se encontrava o comando da MUJAO. Seis meses após a libertação da cidade, ainda é tabu entrar no antigo edifício da polícia.
Foto: Katrin Gänsler
Não há números oficiais de vítimas
Também Faty Walett Mohamed tem saudades do marido. A mãe de seis filhos não sabe onde ele está. Luta todos os dias para, de alguma forma, voltar a reunir a família. Fugir está fora de questão. “Noutros lugares, a situação não é melhor”. Até agora não foram divulgados os números oficiais de vítimas.
Foto: Katrin Gänsler
Mulheres ficavam em casa
Foram as mulheres quem mais sofreu. Tiveram de se cobrir completamente e mal podiam sair de casa. Além disso, muitas delas trabalhavam no mercado ou vendiam frutas e legumes à beira da estrada.
Foto: Katrin Gänsler
Túmulo de Askia
O MUJAO não atacou o Túmulo de Askia, Património Mundial da UNESCO. Com a chegada do MUJAO, era grande o receio de que fosse destruído. “Os jihadistas diziam: em Gao, os muçulmanos não vão enaltecer edifícios como em Timbuktu. Por isso, deixem-nos em paz”, relatou um dos guardas do túmulo.
Foto: Katrin Gänsler
Uma rádio contra a ocupação
O MUJAO ofereceu muitas vezes dinheiro ao jornalista Malick Aliou Maïga para este trabalhar para o movimento. Ele recusou-se e preferiu lutar aos microfones da “Rádio Aadar Koïma Aadar” por uma Gao livre - contra as agressões do MUJAO. Como sinal de gratidão para com os franceses, que ocuparam Gao no final de janeiro de 2013, o estúdio chama-se hoje “Operação Serval”.
Foto: Katrin Gänsler
Capacetes azuis da ONU ocupam-se da segurança
Os franceses ainda estão presentes na cidade, sobretudo em redor do aeroporto. Os soldados da MINUSMA, a força de manutenção de paz, também se ocupam da segurança. Um grupo de 12 mil soldados começou a trabalhar no Mali no início de julho de 2013. Gao é um dos principais locais da missão.
Foto: Katrin Gänsler
Falta de infra-estruturas
Mas mesmo que a situação de segurança tenha voltado a ser classificada como melhor, ainda falta algo para se poder voltar à normalidade da vida quotidiana. Em Gao, ainda nenhum banco voltou a abrir. E as atividades económicas continuam difíceis.
Foto: Katrin Gänsler
Eleições porão fim à crise?
Por isso, muitas pessoas depositam grandes esperanças nas eleições presidenciais de 28 de julho (primeira volta) e de 11 de agosto (segunda volta). Um chefe de Estado eleito democraticamente significa, eventualmente, o fim do governo de transição e uma maior capacidade de acção para o país. A normalidade do dia-a-dia poderia, então, regressar a Gao.
Foto: Katrin Gänsler
Um país indivisível
Algo particularmente importante é que, apesar dos recentes distúrbios causados pelos rebeldes do MNLA na cidade vizinha de Kidal, muitas pessoas em Gao desejam um Mali unido e pacífico.