Malianos regressam às ruas contra revisão constitucional
AFP | mjp
1 de julho de 2017
Apesar do adiamento do referendo, cerca de 2 mil pessoas manifestaram-se em Bamako contra o projeto de revisão da Constituição, na véspera da cimeira do G5 Sahel focada no combate ao extremismo islâmico.
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Cerca de 2 mil malianos voltaram a sair à rua este sábado, em Bamako, em protesto contra a revisão da Constituição que visa implementar alguns compromissos do acordo de paz assinado em 2015 entre o Governo e os ex-rebeldes tuaregues do norte do país. Entre outras medidas, o projeto prevê a criação de um Senado e de um Tribunal de Contas. No entanto, os críticos afirmam que a revisão da Constituição confere demasiados poderes ao Presidente.
A manifestação – que não foi autorizada, devido à cimeira do G5 prevista para domingo e ao estado de emergência - reuniu menos participantes que as ações anteriores, numa altura em que o referendo à revisão constitucional, inicialmente previsto para 9 de julho, foi adiado, ainda sem data definida.
Vários dirigentes da oposição participaram no protesto deste sábado, incluindo os antigos chefes de Governo Modibo Sidibé e Zoumana Sacko.
"Viemos, mais uma vez, pedir a retirada do projeto de referendo. É demasiado urgente”, explica o presidente do colectivo "Touche pas à ma Constitution" (Não toques na minha Constituição), Sy Kadiatou Sow.
"Uma boa parte do Mali está ocupada. É mais urgente libertar o país do que organizar este referendo”, afirma Moussa Keita, do movimento "Trop c'est trop” (Basta), referindo-se à presença radical islâmica no norte e no centro do Mali.
As últimas eleições no Mali, ao nível dos municípios, foram adiadas diversas vezes até terem lugar, em novembro de 2016, em apenas parte do território nacional devido à violência em várias zonas do país.
Força conjunta contra o extremismo islâmico
O norte do Mali caiu em 2012 nas mãos de grupos radicais islâmicos ligados à Al-Qaeda que foram mais tarde expulsos por militares de uma operação francesa lançada em janeiro de 2013.
No entanto, várias zonas continuam fora do controlo das forças malianas, francesas e da ONU e são regularmente palco de ataques, apesar da assinatura do acordo de paz, cujo objetivo é isolar definitivamente os extremistas.
Este domingo, o Presidente francês, Emmanuel Macron, participa na cimeira do G5 Sahel numa demonstração de apoio à força conjunta dos cinco países - Mali, Níger, Burkina Faso, Mauritânia e Chade – contra a ameaça radical islâmica.
Face ao agravamento da situação no centro do Mali, na fronteira com o Burkina Faso e o Níger, os cinco países decidiram em fevereiro reativar o projeto de criação desta força conjunta. A iniciativa recebeu o apoio da União Africana, da União Europeia (com uma promessa de 50 milhões de euros) e do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
A força conjunta deverá concentrar-se inicialmente no Mali, Burkina Faso e Níger, juntando-se à operação francesa "Barkhane”, que combate os radicais islâmicos no Sahel, e à missão da ONU no Mali (MINUSMA).
Na cimeira deste domingo, 2 de julho, o Presidente francês vai anunciar os termos exatos do apoio à força internacional, que deverá passar sobretudo por equipamentos. França espera conseguir chamar outros países a apoiar o financiamento da força conjunta, nomeadamente a Alemanha, a Holanda e a Bélgica. Por outro lado, as autoridades francesas esperam também receber apoio concreto dos Estados Unidos, cuja presença militar passa pelos drones baseados no Níger.
A questão financeira é particularmente sensível. Em junho, Idriss Déby, Presidente do Chade – principal potência militar do G5 - ameaçou retirar-se das operações por motivos de orçamento.
Conservar os manuscritos de Tombuctu
A invasão islamita no norte do Mali pôs em risco de destruição milhares de documentos históricos. Estes foram salvos por Abdel Kader Haidara, feito pelo qual a Alemanha lhe outorgou o Prémio de África na edição de 2014.
Foto: DW/P. Breu
Tesouros históricos
Os manuscritos de Tombuctu são documentos históricos sem preço, que relatam a busca pelo conhecimento no mundo islâmico há muitos séculos. Tombuctu foi, em tempos, o centro islâmico da pesquisa e erudição em África.
Foto: DW/P. Breu
Contrabandeados em caixas de chumbo
Quando os islamitas começaram a destruir monumentos no norte do Mali em 2012, um grupo de cidadãos consternados transportou clandestinamente centenas de milhares de manuscritos de Tombuctu para a capital maliana, Bamako, no sul do país. Aqui foram depositados num edifício de residências, para aguardar a restauração e digitalização.
Foto: DW/P. Breu
O salvador dos manuscritos
Abdel Kader Haidara organizou a operação de resgate. O proprietário de uma biblioteca não só se preocupou em salvar os seus próprios manuscritos, mas também todos os documentos históricos de Tombuctu em risco de destruição.
Foto: DW/P. Breu
Nasce uma biblioteca digital
Os manuscritos estão agora a ser digitalizados na biblioteca de Bamako. Cada página é fotografada individualmente. A imagem é controlada e depois catalogada num arquivo central. O gigante da internet, Google, já manifestou interesse na coleção.
Foto: DW/P. Breu
Acesso geral aos manuscritos
A digitalização tem dois objetivos: preservar os manuscritos para a posteridade, caso os originais não resistam à humidade e ao calor de Bamako. E garantir o acesso a todos os interessados. Antes do conflito armado no norte e do resgate dos documentos não existia qualquer plano para os digitalizar.
Foto: DW/P. Breu
Caixas feitas à medida
Depois de serem digitalizados, os manuscritos são colocados em caixas de cartão isentas de ácidos. Aqui podem ser guardados para a posteridade. Uma vez que os manuscritos não têm todos o mesmo tamanho, as caixas tiveram que ser produzidas em trabalho manual.
Foto: DW/P. Breu
Uma biblioteca vazia
Na Biblioteca Comemorativa de Mamma Haidara, em Tombuctu, não há um único livro. E não é certo que a biblioteca volte a albergar documentos históricos no futuro. Muitos responsáveis acreditam que os documentos estão a salvo em Bamako. Mas também há quem receie pela identidade histórico-cultural de Tombuctu, caso os manuscritos não regressem a casa.
Foto: DW/P. Breu
Biblioteca em ruínas
O Instituto Ahmed Baba Institute foi criado com capitais da Fundação Aga Khan, África do Sul e Arábia Saudita. Para além de albergar a biblioteca, também tinha equipamento para a digitalização e restauração. Hoje, o instituto está vazio e dilapidado.
Foto: DW/P. Breu
Monumento aos manuscritos perdidos
Quando chegaram a Tombuctu, os islamitas deitaram fogo a muitos manuscritos no pátio do Instituto Ahmed Baba. Pretendiam assim demonstrar o seu poder ao ocidente e à UNESCO. Cerca de 4000 manuscritos foram destruídos. Os restos queimados servem hoje de memorial ao património perdido.
Foto: DW/P. Breu
Tombuctu vai cair na insignificância?
Quando Tombuctu perdeu a sua importância económica no século XX, descobriu o turismo como fonte de receitas alternativa. Mas o conflito de 2012 espantou os turistas, pelo que Tombuctu corre agora o perigo de perder também a sua relevância cultural, tanto mais que já não tem os manuscritos. E ninguém sabe se eles vão regressar.
Foto: DW/P. Breu
Sobram alguns manuscritos
Ainda existem algumas bibliotecas privadas. Mas em Timbuktu já é considerada uma biblioteca uma dúzia de páginas que cabem numa pele de carneiro. Este habitante de Timbuktu herdou alguns manuscritos do seu avô. É o que possui de mais valioso.
Foto: DW/P. Breu
Um futuro incerto
A situação política no Mali é tensa, e o exército maliano é demasiado fraco para garantir a estabilidade e segurança. Muitos habitantes de Tombuctu que fugiram da cidade optaram por não regressar. Eles não confiam na paz precária e a sua cidade enfrenta um futuro incerto.