Chang: Tribunal sul-africano recusa pedido contra extradição
Lusa | tms
28 de julho de 2022
Tribunal da África do Sul recusa pedido da PGR de Moçambique e abre caminho para a extradição do ex-ministro Manuel Chang para os EUA. Mas Maputo ainda pode recorrer da decisão, alerta o Fórum de Monitoria do Orçamento.
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O Tribunal Superior da África do Sul, divisão de Gauteng, indeferiu um novo pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) de Moçambique para recorrer da decisão sobre a extradição do ex-ministro das Finanças Manuel Chang para os Estados Unidos.
A juíza Margarete Victor considerou na quarta-feira (27.07) que a Procuradoria-Geral (PGR) de Moçambique "não apresentou quaisquer razões imperiosas" para que o pedido para recurso fosse concedido.
"Além disso, o recurso não tem uma possibilidade razoável de sucesso num tribunal de instância superior. Em consequência, o requerente da autorização de recurso é recusado. (...) A autorização para recorrer é indeferida", adiantou a juíza Victor na ordem judicial a que a agência de notícias Lusa teve acesso esta quinta-feira (28.07).
A juíza sul-africana ordenou ainda ao Governo moçambicano a custear as despesas do pedido de autorização junto do Tribunal Superior, em Gauteng, para recorrer ao Supremo Tribunal de Recurso da África do Sul contra a ordem judicial para a extradição do antigo governante moçambicano para os Estados Unidos.
Decisão abre caminho para a extradição
A decisão da juíza Margarete Victor abre caminho para que Manuel Chang seja transferido para os Estados Unidos, onde seria julgado.
Mas, em declarações à DW África, Adriano Nuvunga, coordenador do Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO), alerta que a PGR moçambicana ainda pode recorrer da decisão para evitar a extradição do ex-ministro.
"Manuel Chang pode recorrer ao Tribunal Superior de Recurso da África do Sul e, se este decidir também negativamente, aí pode o pedido de recurso junto do Conselho Constitucional", explica.
Nuvunga afirma que o FMO vai "continuar a litigar junto das instituições sul-africana para conseguir a extradição" do ex-ministro para os EUA.
FMI recomenda:"Não escondam as dívidas como Moçambique"
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"O objetivo é pedir a extradição de Manuel Chang para os Estados Unidospara responder pelos crimes que pesam sobre ele lá e ajudar a esclarecer a situação, para que possamos, como moçambicanos, ter acesso aos pins de onde estão os ativos amealhados com este caso grande de corrupção que empurrou milhões de moçambicanas e moçambicanos para a pobreza", diz o coordenador do FMO.
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"Peça-chave" das dívidas ocultas
Chang está detido na África do Sul desde dezembro de 2018, acusado de fraude financeira e branqueamento de capitais no caso das dívidas ocultas.
O ex-ministro das Finanças moçambicano é considerado "peça-chave" nas dívidas ocultas do Estado moçambicano contraídas entre 2013 e 2014, à revelia do Parlamento, no valor de 2,2 mil milhões de dólares, ao assinar as garantias de Estado em nome do Governo do ex-Presidente Armando Guebuza.
Além dos processos que correm em Moçambique, o caso é também alvo da justiça norte-americana, que pretende julgar Manuel Chang na alegada burla internacional multimilionária.
A PRG de Moçambique diz que o ex-ministro, se extraditado para Maputo, enfrentaria o peso da justiça moçambicana. Os EUA, por seu turno, defendem o julgamento de Chang pela justiça norte-americana.
Julgamento das dívidas Ocultas: "Outras coisas..."
O julgamento do caso das dívidas ocultas revela aos poucos mais informações sobre o que muitos consideram o maior escândalo de corrupção de Moçambique. Conheça as peculiaridades do caso e dos seus personagens.
Foto: Fotolia/Carlson
O caso
O escândalo das dívidas ocultas veio ao de cima entre 2013 e 2014. É a maior fraude financeira de Moçambique e prejudicou a nação e a imagem do país. Em causa estão cerca de 2 mil milhões de euros. O esquema tem como "cabeças" altos funcionários do Estado e trabalhadores de bancos como o Credit Suisse. O julgamento começou a 23 de agosto e conta com 19 arguidos, 70 testemunhas e 69 declarantes.
Foto: Roberto Paquete/DW
Julgamento nas instalações de uma cadeia
A falta de capacidade para albergar muita gente terá levado o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo a optar pelo Estabelecimento Penitenciário Especial de Máxima Segurança da Machava para o julgamento. E é na B.O., como é conhecida a cadeia, onde estão detidos a maioria dos envolvidos no caso. Alguns dos julgamentos mais mediatizados do país costumam acontecer aqui.
Foto: Romeu da Silva/DW
Juiz da causa é de índole duvidosa?
Efigénio Baptista não tem percurso profissional imaculado, foi julgado e condenado duas vezes por ameaças e ofensas corporais num caso de abuso de poder em Manica. Também terá sido alvo de contestação popular em Sofala, que culminou com a queima da sua casa. Alguns setores questionam a escolha do juiz, defendem que deveria ter sido escolhido um juiz sénior para o caso. O "juiz júnior" tem 42 anos.
Foto: Romeu da Silva/DW
"Alérgico a corrupção" e sujeito a pressão
Sobre as condenações, o juiz Efigénio Baptista, numa entrevista ao "O País" esclareceu: "Mas eu recorri da decisão e o Tribunal de Recurso da Beira anulou-a. Por isso, eu não tenho cadastro criminal". Baptista terá estado ainda sob pressão por ser o juiz do caso mais "cabeludo" do momento. A imprensa moçambicana chegou a noticiar sobre possíveis ameaças ao juiz.
Foto: Romeu da Silva/DW
Ordem dos Advogados em representação do povo
A Ordem dos Advoagados de Moçambique (AOM) intervém no julgamento na qualidade de assistente e pretende auxiliar o Ministério Público. O objetivo é assegurar que o povo moçambicano seja informado, atualizado e esclarecido sobre os contornos do processo. São sete representantes, entre eles os ex-bastonários Gilberto Correia e Flávio Menete.
Foto: Romeu da Silva/DW
Bendita seja a mulher entre os homens...
Ana Sheila Marrengula é representante do Ministério Público no julgamento. É a única mulher entre o jurado, o que desencadeou queixas de falta de inclusão. É apreciada pelas suas questões consideradas pertinentes, mas igualmente criticada pelos seus modos pouco profissionais de questionar os réus. Pede indemnização civil ao Estado de cerca de três mil milhões de dólares acrescidos de juros.
Foto: Christoph Hardt/picture-alliance/Geisler-Fotopress
O uniforme da discórdia
No primeiro dia do julgamento os réus não se apresentaram de uniforme prisional, como é prática no país e conforme solicitação do juiz. A defesa contestou a exigência, alegando que a lei não obriga a isso, mas no final valeu a ordem de Efigénio Baptista que defende "tratamento igual" entre os presos. Na terça-feira (24.08) a cor laranja dominava a sala de audiências na B.O.
Foto: Romeu da Silva/DW
Alexandre Chivale, um advogado (in)suspeito?
Advogado da família Guebuza é a "sensação" entre os causídicos. Para além da sua postura destemida, e até entendida como de afronta, Chivale marcou o primeiro dia do julgamento. É que é administrador da Txopela, empresa suspeita do seu constituinte, Carlos do Rosário. E mais: ocupa uma das casas supostamente adquiridas com o dinheiro do calote. Tribunal deu-lhe 72 horas para deixar o imóvel.
Foto: privat
A memória curta de Cipriano Mutota
Foi a estreia do banco dos réus. Mutota revela que foi traído pelos seus parceiros do negócio na partilha dos "lucros" e não ficou contente. E não se lembra do destino dado a cerca de 656 milhões de euros que terá recebido como "luvas". O ex-diretor do Gabinete de Estudos da secreta praticamente confirmou a acusação do Ministério Público. Diz que Nyusi e Guebuza aprovaram o projeto.
Foto: Romeu da Silva/DW
Manuel Chang regressa no momento "H"
Justamente no dia do arranque do julgamento, a África do Sul anunciou a tão esperada extradição de uma das peças chave do crime, Manuel Chang. O juiz decidiu que o ex-ministro das Finanças será ouvido "na qualidade de declarante, quando estiver no território nacional", em resposta ao pedido da Ordem dos Advogados de Moçambique e reafirmado pelo Ministério Público e pelos advogados dos 19 arguidos.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
O "massagista" do sistema
Foi o lobista do negócio entre o Estado e a Privinvest, identifica-se como facilitador. Num dos emails trocado com a Privinvest mencionou uma "massagem ao sistema", mas no julgamento negou. Recebeu de Jean Boustani cerca de 8,5 milhões de dólares e recusa-se a devolver o valor, alegando que é resultante do seu trabalho. É visto como astuto, embora se tenha destacado por contradições no tribunal.
Foto: Romeu da Silva/DW
A amnésia da "cinderela"
É o terceiro réu a sentar-se no banco. Ndambi é filho do ex-Presidente Armando Guebuza é foi apelidado de cinderela pelos seus parceiros de negócios por ser lento a agir. Terá recebido 33 milhões de dólares de luvas de Jean Boustani, negociador da Privinvest. Não se recorda de quase nada que é questionado pelo juiz, diz que não tem memória de elefante. Foi um dos pivôs no tráfico de influência.