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Maputo "fez pouco" no combate ao branqueamento de capitais

António Cascais
21 de dezembro de 2022

Economista Camilo Lourenço concorda com inclusão de Moçambique na lista da União Europeia de países de alto risco no combate à lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo. Diz que Maputo "não fez o suficiente".

Economista português Camilo Lourenço
Foto: Privat

A Comissão Europeia (UE) incluiu Moçambique na lista de jurisdições de países terceiros considerados de alto risco devido a deficiências estratégicas nos seus regimes de combate ao branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo.

O economista Camilo Lourenço português, que cresceu em Moçambique, considera que é uma decisão "legítima" na medida em que Moçambique fez "muito pouco" para clarificar a sua situação no combate ao branqueamento de capitais.

A lista da UE tem em conta informações fornecidas pelo Grupo de Ação Financeira Internacional (GAFI).

DW África: Que implicações tem a inclusão de Moçambique nesta "lista negra" da União Europeia?

Camilo Lourenço (CL): São decisões muito complicadas, por duas razões: Primeiro, porque é algo que dificulta as operações internacionais dos bancos moçambicanos e dos bancos estrangeiros que operam com Moçambique. Em segundo lugar, porque ao colocar Moçambique com este estatuto, isto vai prejudicar as empresas e os negócios.

DW África: Portanto, as instituições europeias e outras entidades passarão a ser obrigadas a aplicar uma maior diligência nas transações com entidades financeiras moçambicanas?

CL: Exatamente. E a verdade é que, nos últimos anos, Moçambique já tinha sido alertado para este problema e não fez o suficiente. Não vou dizer que não fez nada, porque não seria justo, mas não fez o suficiente para afastar as suspeitas.

DW África: Mas, Camilo Lourenço, conhecendo razoavelmente bem o setor financeiro moçambicano e o seu quadro regulatório, acha que esta medida da Comissão Europeia é atempada e legítima?

CL: É uma medida legítima, porque Moçambique foi avisado. Nos últimos anos, houve muitas operações complicadas, pouco esclarecidas e pouco claras, que o país foi instado a tentar resolver, e não o fez com o grau que a Comissão Europeia exigia. São conhecidos os financiamentos internacionais que foram parar a bancos moçambicanos, que não se conseguiu provar que tivessem a melhor aplicação - e alguns casos, que não foram clarificados, envolvem figuras do regime. São pessoas muito bem colocadas na estrutura política e isso causava dificuldades internas, [mas] a falta de clarificação destas situações acabou por culminar nesta decisão da União Europeia.

"Alto risco" de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo em MoçambiqueFoto: DW/M. Sampaio

DW África: A "lista negra" inclui outros países africanos, como o Burkina Faso, Mali, Marrocos, República Democrática do Congo, Sudão do Sul, Senegal, Tanzânia e Uganda. Porque não outros países? Não se estará aqui com dois pesos e duas medidas?

CL: Não, eu julgo que não. Só o facto de pronunciarmos estes nomes destes países já dá para perceber [o problema]. As autoridades moçambicanas sabiam muito bem em que companhia iriam ficar [na "lista negra"] se a União Europeia tomasse esta decisão. Agora, poderá haver mais países? Pode. Mas a verdade é que [estão nesta lista] precisamente porque não foram capazes de clarificar as operações pouco claras em que estão envolvidos, nomeadamente branqueamento de capitais e muito mais. Isso não quer dizer que não se resolva. Agora, é mau, porque, quando se vai parar a estas listas, toda a comunidade internacional olha para os países em causa e diz que não pode fazer certos negócios com aquele país, pois corre um risco muito grande de ser associada à lavagem de dinheiro.

DW África: Há vozes críticas que dizem que isto terá sido uma decisão política por parte da União Europeia, porque Moçambique depende muito das dádivas financeiras para o seu Orçamento do Estado. Concorda?

CL: Não. Acho que não é isso. Eu conheço muito bem Moçambique e, quando lá vou, digo muitas vezes que devia servir de vergonha não conseguir ter verbas suficientes para financiar o seu Orçamento de Estado e ter de depender das dádivas estrangeiras. Eu digo isto muitas vezes. Não há mal que o país, a certa altura, caia nessa situação, mas é mau quando não desenvolve políticas suficientes ou adequadas para poder escapar a esta situação.

DW África: A União Europeia é uma instância com legitimidade para apontar o dedo a países como Moçambique, uma vez que a União Europeia também tem países com quadros regulatórios deficientes: Malta, Chipre, Holanda, Portugal, a própria Alemanha é criticada por lavar dinheiro da 'Ndrangheta e Camorra. Portanto, a União Europeia tem essa legitimidade?

CL: Não se deve confundir as coisas. Uma coisa são espaços na União Europeia onde existem determinados regimes fiscais mais favoráveis, como o que acontece com Portugal ou Luxemburgo e Liechtenstein, por exemplo. Outra coisa completamente diferente é estar envolvido em operações financeiras internacionais cuja natureza se aproxima do crime.

Portanto, quando a Comissão Europeia toma uma decisão destas tem a legitimidade para a tomar por uma razão muito simples: se a Comissão Europeia se dirige a Portugal e diz que é preciso corrigir um certo aspeto do regime fiscal da Madeira, isso é corrigido. Todas estas solicitações foram feitas aos países [na "lista negra], entre os quais Moçambique, mas [não foram corrigidas], pelo menos em grau suficiente.Por isso foi sido tomada essa decisão.

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