Apesar da trégua de dois meses agora anunciada, o líder do MDM, o terceiro maior partido moçambicano, considera que ainda há "desafios para alcançar a paz verdadeira". Daviz Simango insiste em revisão da Constituição.
Publicidade
"Primeiro é preciso compreender se, com essas tréguas, estamos a atacar o essencial", disse o líder do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), em conferência de imprensa, na terça-feira (03.01) na sede do partido na cidade da Beira.
Daviz Simango insiste, por isso, na revisão da Constituição da República, que considera ser a raiz do problema, por não se adequar à conjuntura económica e política do país. "O grande problema dos conflitos políticos e económicos que hoje atravessamos estão em torno da nossa Constituição. Neste momento há que adequar e adaptar a nossa Constituição à dinâmica de Moçambique", defendeu, recordando as propostas do seu partido sobre redução dos poderes do chefe do Estado, a eleição dos governadores provinciais e a descentralização.
"O problema de descentralização é um problema do país, é um problema de todos nós e não pode ser discutido por dois partidos, portando estamos a cometer um erro grave naquilo que é o futuro da estabilidade do país", observou o líder político, acrescentando que enquanto estes temas não forem revistos na lei fundamental, "vai continuar a haver conflitos".
Falta de clareza
O líder do MDM disse que o país foi surpreendido com o anúncio de uma trégua de uma semana a 27 de dezembro, agora prolongada para 60 dias, sem clareza sobre os princípios das negociações que deviam ser regidos pelo Parlamento. "O que terá acontecido com os princípios que deveriam ter ido a Assembleia da República?", questionou Simango.
O autarca da Beira referiu que, em sede de diálogo entre Governo e Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), foi aprovada uma resolução com sete princípios que devia ser remetida para a Assembleia da República até novembro, prevendo-se que fosse debatida até 15 de dezembro, o que não aconteceu.
Simango acrescentando que "nesta suposta trégua" de uma semana aconteceram incidentes. "Houve compatriotas nossos que morreram por balas e esses incidentes não são tornados públicos", declarou.
O líder da RENAMO anunciou terça-feira (03.01) o prolongamento por 60 dias da trégua temporária declarada há uma semana, para dar tranquilidade às negociações de paz em Moçambique. "Esta trégua ou prorrogação é para criarmos um ambiente favorável para podermos assegurar o diálogo aí em Maputo", declarou Afonso Dhlakama.
O segundo anúncio de trégua surge um dia após ter mantido uma conversa por telefone com o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, para fazer o balanço da cessação de hostilidades de uma semana.
Moçambique: centenas de pessoas marcham contra a situação política e económica
Centenas de moçambicanos marcharam no dia 18 de junho de 2016 em Maputo contra a situação política e económica do país. A manifestação foi convocada pela sociedade civil para exigir esclarecimentos ao Governo.
Foto: picture alliance/dpa/A. Silva
Pela Avenida Eduardo Mondlane rumo à Praça da Independência
"Pelo direito à esperança" foi o mote da manifestação que reuniu centenas de pessoas no centro de Maputo, no sábado dia 18 de junho de 2016. Os manifestantes exigem o fim do conflito político-militar entre o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o esclarecimento da dívida pública e mais liberdade de expressão.
Foto: picture alliance/dpa/A. Silva
"A intolerância política mata a democracia"
Em entrevista à DW África, Nzira de Deus, do Fórum Mulher, uma das organizações envolvidas, afirma que a liberdade dos moçambicanos tem sido muito limitada nos últimos meses. "É preciso deixar de intimidar as pessoas, deixarem as pessoas se expressarem de maneira diferente, porque eu acho que é isso que constrói o país. Não pode haver ameaças, não pode haver atentados", diz Nzira.
Foto: DW/L. Matias
De preto ou branco, manifestantes pedem paz
Com camisolas pretas e brancas e cartazes com mensagens de protesto, centenas de moçambicanos mostram o seu repúdio à guerra entre o Governo e a RENAMO, às dívidas ocultas e às valas comuns descobertas no centro do país. Num percurso de mais de dois quilómetros, entoaram cânticos pela liberdade e pela transparência.
Foto: DW/L. Matias
"Valas comuns são vergonha nacional"
Recentemente, foram descobertas valas comuns na zona central de Moçambique. Uma comissão parlamentar enviada ao local para averiguações nega a sua existência. Alguns dos corpos encontrados foram sepultados sem ter sido feita uma autópsia, o que dificulta o conhecimento das causas das suas mortes.
Foto: DW/L. Matias
"É necessário haver um diálogo político honesto e sincero"
Nzira de Deus considera que a crise política que Moçambique enfrenta prejudica a situação do país e defende que “haja um diálogo político honesto e sincero e que se digam quais são as questões que estão em causa". Para além da questão da dívida e da crise política, os manifestantes estão preocupados com as liberdades de expressão e imprensa.
Foto: DW/L. Matias
Ameaças não vão amedrontar o povo
No manifesto distribuído ao público e lido na estátua de Samora Machel, na Praça da Independência, as organizações da sociedade civil exigiram à Procuradoria-Geral da República uma auditoria forense à dívida pública. "Nós queremos que o ex-Presidente [Armando Guebuza] e o seu Governo respondam por estas dívidas", declarou Alice Mabota, acrescentando que as ameaças não vão "amedrontar o povo".
Foto: DW/L. Matias
Sociedade Civil presente
A manifestação foi convocada por onze organizações da sociedade civil moçambicana. Entre as ONGs que organizaram a marcha encontram-se a Liga dos Direitos Humanos (LDH), o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), o Observatório do Meio Rural, o Fórum Mulher e a Rede HOPEM.