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Liberdade de imprensaMoçambique

MDM alerta para "grande retrocesso" na nova lei de imprensa

18 de fevereiro de 2021

Futuro da liberdade de imprensa preocupa MDM e MISA Moçambique. Proposta de lei da comunicação social permite processos de difamação do Presidente sem provas. Proposta de lei da radiodifusão limita emissões estrangeiras.

Foto: DW/J. Beck

De acordo com a proposta do Governo, os órgãos de comunicação social podem ser condenados por difamação sem que haja prova da verdade dos factos se o ofendido for o Presidente da República ou um chefe de Estado estrangeiro ou seu representante. Os órgãos de comunicação social que tenham, num período de cinco anos consecutivos, três condenações por crime de difamação ou injúria, correriam futuramente o risco de serem suspensos por até um mês no caso de um diário.

legislação, a que a DW África teve acesso, inclui também vários artigos que limitariam substancialmente as emissões estrangeiras no país.

Emissões em sinal aberto de órgãos de comunicação social estrangeiros ficariam proibidas. Além disso, as estações nacionais também não poderiam retransmitir programas de emissoras internacionais como a DW África, RFI ou VOA - Voz da América, tanto em direto como em diferido. As únicas exceções seriam programas de música, desporto, filmes, séries ou telenovelas.

Emissões internacionais proibidas

À DW África, o presidente do Conselho Superior da Comunicação Social, Tomás Vieira Mário, admite o fim das emissões estrangeiras em sinal aberto em FM ou de televisão, de órgãos como a RTP África ou a BBC.

"Acho que sim [vão parar de emitir]. Acho que a lei [incide] nesse tipo de casos muito especiais e específicos de sinal aberto de emissoras estrangeiras. Penso que, se a lei for aprovada, deixarão de emitir em sinal aberto para Moçambique. Nós temos em Moçambique muitas emissões estrangeiras em sinal aberto", afirma Tomás Vieira Mário.

As novas medidas não ficariam por aqui. Nas propostas do Governo consta também que cada órgão internacional só poderá ter no máximo dois correspondentes em todo o país.

Se as novas propostas forem aprovadas, seria um "grande retrocesso" em relação aos ganhos democráticos alcançados em Moçambique, diz Fernando BismarqueFoto: DW/S. Lutxeque

Ouvido pela DW África, Fernando Bismarque, deputado e porta-voz do Movimento Democrático de Moçambique (MDM, na oposição), considera que estas propostas inviabilizam um dos grandes ganhos da democracia moçambicana, que é a liberdade de imprensa.

"De facto, este impedimento de transmissão de canais internacionais no nosso território é um retrocesso muito grande", diz Bismarque. "Demonstra que há uma patrulha ideológica e captura da imprensa nacional. Isto é um perigo para a democracia, que custou muito sangue aos moçambicanos."

O porta-voz do MDM espera que haja um movimento que impeça que estas normas que "inviabilizam as conquistas democráticas sejam aprovadas pelo próprio Parlamento".

Sociedade civil propõe emendas

A Assembleia da República de Moçambique vai retomar as sessões plenárias em 25 de fevereiro, após cerca de dois meses de interregno para férias. Nestas sessões poderão ser debatidas e votadas as duas propostas das novas leis, que já foram aprovadas pelo Conselho de Ministros.

A comissão permanente do Parlamento promove neste momento um debate com cinco organizações da sociedade civil para recolher propostas de alteração. Ernesto Nhanale, diretor executivo do Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA) em Moçambique, diz que fizeram um dossiê à parte sobre as emissões internacionais.

"Nós fizemos dois pareceres: um para a lei de comunicação social em geral e também a questão da lei da radiodifusão. Penso que todos nós, como atores, temos que levantar esses aspetos que devem ter uma análise mais aprofundada. A Assembleia da República convidou-nos a comentar esses detalhes e há vários aspetos que configuram uma limitação à liberdade de imprensa".

MISA considera "inconstitucionais" vários artigos das propostas de lei sobre comunicação socialFoto: DW/R. da Silva

O responsável do MISA acrescenta que "há vários aspetos discutíveis" nas novas leis, nomeadamente quanto à "atribuição da carteira profissional, criação da entidade reguladora e esta questão da radiodifusão". Nhanale salienta que uma aprovação no Parlamento sem as alterações sugeridas pela sociedade civil seria uma grande afronta à liberdade de imprensa e de expressão em Moçambique.

"É importante que neste momento de debate possamos corrigir esses elementos para que tenhamos uma lei que concorde com a Constituição da República", conclui.

Tudo legal

Porém, Tomás Vieira Mário, do Conselho Superior da Comunicação Social, rejeita que, à partida, as propostas coloquem em causa a liberdade de imprensa em Moçambique.

"As leis, como estão, não creio que podemos delas ler perigo. Podemos é ficar atentos tendo em conta os antecedentes mais recentes em torno da liberdade de imprensa, desde logo as dificuldades que houve na cobertura dos ataques terroristas em Cabo Delgado, onde os jornalistas foram presos ilegalmente", afirma o responsável do órgão governamental.

Esta semana, o britânico Tom Bowker foi expulso e banido de Moçambique por dez anos após uma ordem do Ministério do Interior, que o jornalista considerou ser "ilegal" e ter "motivações políticas". O portal Zitamar News, em que Bowker trabalha, cobria a atualidade moçambicana, mas ganhou também notoriedade com as suas notícias sobre os ataques terroristas em Cabo Delgado.

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