Migrações resultam do imperialismo - Presidente da RCA
AFP | Lusa
21 de setembro de 2023
O Presidente da República Centro-Africana (RCA), Faustin Touadéra, defendeu hoje, num discurso na ONU, que o afluxo de migrantes africanos para a Europa é o resultado da "pilhagem" e do "imperialismo colonial" em África.
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O Presidente da República Centro-Africana (RCA), Faustin Archange Touadéra, entende que "esta crise migratória crescente é uma das consequências terríveis da pilhagem dos recursos naturais dos países empobrecidos pela escravatura, pela colonização e pelo imperialismo ocidental, do terrorismo e dos conflitos armados internos, muitas vezes abertos num contexto de objetivos hegemónicos e de tensões geopolíticas e geoestratégicas entre as grandes potências mundiais".
O discurso de Touadéra desta quinta-feira (21.09) na ONU surge depois de serem conhecidos os últimos números sobre as migrações de africanos para a Europa, que se dirigem especialmente para a ilha italiana de Lampedusa, a menos de 150 quilómetros da costa da Tunísia.
"O mundo inteiro acompanhou com profunda consternação a chegada em massa, nos últimos dias, de milhares de migrantes africanos à ilha de Lampedusa, em Itália", notou o chefe de Estado.
Envolver africanos na busca de soluções
Entre segunda e quarta-feira da semana passada, cerca de 8.500 pessoas - mais do que toda a população de Lampedusa - chegaram a bordo de 199 embarcações, de acordo com a agência das Nações Unidas para as migrações.
No discurso citado pela agência France-Presse (AFP), o Presidente Touadéra elogiou "a solidariedade e os esforços incríveis feitos pelos países de acolhimento" e pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados para acolher estes migrantes.
Denunciando "os traficantes sem lei e os vendedores de ilusões", o Presidente da RCA apelou à ONU para que envolva os países africanos "na procura de soluções globais para as crises migratórias e os desafios existenciais que os jovens do continente enfrentam".
Memórias dos refugiados africanos de Lampedusa
Lampedusa é como uma porta de entrada de imigrantes para a Europa. Mamadou Ba veio do Senegal, mas entrou como estudante bolseiro para Portugal. Estas fotos de Lampedusa refletem a sua visão da "ilha das tragédias".
Foto: Mamadou Ba
Porta de Lampedusa
Lampedusa é como uma porta de entrada para a Europa de milhares de imigrantes africanos. Mamadou Ba também veio de África, Senegal, mas não entrou por esta porta. Foi como estudante bolseiro para Portugal em 1997. É ativista da organização não governamental SOS Racismo. Mamadou Ba tirou estas fotografias em Lampedusa. Refletem a sua visão desta ilha, que viu tantas tragédias de refugiados.
Foto: Mamadou Ba
Cemitério de barcos
Estes cascos encontram-se no cemitério dos barcos. É aí que ficam os barcos que transportaram os refugiados para a ilha italiana. Foram muitas as vidas que se perderam nas travessias do Mediterrâneo. A maior tragédia aconteceu no dia 3 de outubro de 2013 quando 366 refugiados perderam a vida. No dia 11 de janeiro de 2014, cerca de 200 refugiados foram salvos pela marinha italiana.
Foto: Mamadou Ba
Morrer por querer viver
A ilha de Lampedusa tem vindo a ser considerada um cemitério para milhares de imigrantes que “morrem por procurar uma vida melhor”, nas palavras de Mamadou Ba. Só em outubro de 2013 mais de 400 pessoas perderam a vida em dois naufrágios a caminho do norte de África para a ilha de Lampedusa. A maioria dos mortos era oriunda da Eritreia e da Somália.
Foto: Mamadou Ba
Memória dos imigrantes
Pouco sabemos dos milhares que morreram durante as tentativas de chegar à Europa. A maior parte dos imigrantes mortos são conhecidos pelos números anónimos das notícias sobre os naufrágios. Deixam poucos rastros como estas roupas de náufragos, que mal se distinguem. Mas os mortos são também memória na ilha de Lampedusa.
Foto: Mamadou Ba
Objetos que humanizam
Na ilha existe um museu com objetos de vítimas dos náufragos como passaportes, fotografias pessoais e anotações. “O que os objetos nos mostram é um que a morte não consegue levar a memória. Alguns objetos podem mostrar quão humanos eram e quão simples eram os seus sonhos”, conta Mamadou Ba.
Foto: Mamadou Ba
Normalidade em alto mar
Os imigrantes levavam consigo os seus hábitos quotidianos e a sua cultura. Tentavam continuar esta normalidade nas arriscadas travessias, que lhes prometiam uma vida melhor na Europa. No entanto, não se sabe ao certo se os objetos expostos no museu, como estes tachos, pertenceram a pessoas que morreram ou a sobreviventes que "apenas" perderam os seus pertences na travessia.
Foto: Mamadou Ba
Memórias de vidas perdidas
Em muitos pontos da ilha italiana de Lampedusa podemos encontrar a memória dos imigrantes. "A memória serve para manter a vida do que já não vive“, diz Mamadou Ba. A ilha tem uma extensão de apenas nove quilómetros. Ela dista cerca de 205 quilómetros da Sicília, no sul de Itália, e de cerca de 130 quilómetros da Tunísia, o que torna Lampedusa num ponto de entrada ideal para a União Europeia (UE).
Foto: Mamadou Ba
Inimigo à vista
Este bunker da Segunda Guerra Mundial à entrada de Lampedusa servia para defender a ilha da invasão de forças navais inimigas. Mamadou Ba, da organização não governamental portuguesa SOS Racismo, acredita que este bunker é simbólico: “Lampedusa é a construção do imigrante como inimigo da Europa. Que é preciso conter, que é preciso combater.”
Foto: Mamadou Ba
Contra a "Fortaleza Europa"
Em fevereiro de 2014, mais de 400 representantes da sociedade civil, reunidos em Lampedusa, aprovaram a "Carta de Lampedusa". Ela defende uma mudança de paradigma sobre as realidades migratórias. Dado que são já "incontáveis as tragédias fatais que se têm sucedido nas costas marítimas europeias", os signatários querem ver a imigração e os direitos humanos dos imigrantes na agenda da UE.
Foto: ALBERTO PIZZOLI/AFP/Getty Images
O mar de Lampedusa
A pequena ilha italiana que fica no meio do Mediterrâneo entre a Sicília e o norte de África espera por dias melhores. Poucos pensam que os fluxos migratórios e as tragédias associadas vão acabar se não houver uma transformação radical das políticas de imigração da Europa.