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ReligiãoÁfrica

Milhares de peregrinos africanos retidos a caminho de Meca

Henry-Laur Allik
7 de julho de 2022

As restrições à Covid-19, o aumento dos preços e atrasos este ano tornaram a peregrinação a Meca para os muçulmanos africanos ainda mais complicada do que no passado.

Alaa Abdel-Fattah, Mona Seif
Foto: picture-alliance/AP Photo/A. Nabil

O Islão exige de todos os muçulmanos aptos que façam uma peregrinação à cidade sagrada de Meca, a chamada hadjdj, pelo menos uma vez na vida.

Devido à Covid-19, a Arábia Saudita impediu os peregrinos internacionais de viajar para Meca em 2020 e 2021.

Este ano, o reino limitou o número de visitantes internacionais nos cinco dias de celebrações a 850.000 peregrinos. O que é significativamente inferior aos cerca de 1,9 milhões de peregrinos estrangeiros que compareceram em 2019, antes da pandemia.

A Arábia Saudita também introduziu novas regras: só foram autorizados a deslocar-se a Medina fiéis com menos de 65 anos, que nunca empreenderam a peregrinação, estão vacinados contra a Covid-19 e não sofrem de doenças crónicas.

As novas regras vieram somar-se a dificuldades tradicionalmente enfrentadas por muçulmanos africanos ansiosos por cumprir os ritos associados ao hadjdj.

A marfinense Siriki Bamba ficou grata por obter um visto este ano. Mas lamentou que a sua mãe e a sua tia tivessem de ficar em casa devido à alteração das regras.

"Estava previsto ir com a minha mãe, mas ela tem 78 anos de idade. A minha tia tem 63 anos, mas infelizmente, tem hipertensão", disse à DW. "Não puderam ir. Foi triste".

Estima-se que 40% da população africana seja muçulmana Foto: Pascal Deloche/Godong/picture alliance

Aumento em flecha dos preços

Um obstáculo ainda maior foi o aumento dos preços dos pacotes de viagem.

Em muitas nações da África Ocidental, o custo da assistência é determinado por agências estatais, que visam manter os preços acessíveis para permitir ao maior número possível de muçulmanos cumprir com este pilar do Islão uma vez na vida.

Mas o atual aumento global dos preços do combustível levou à subida dos preços dos bilhetes de avião. Acresce que em muitas nações africanas, a moeda caiu drasticamente em relação ao dólar americano, tornando a peregrinação substancialmente mais cara do que em anos anteriores.

Na Nigéria e no Senegal, por exemplo, o custo da viagem aumentou em cerca de 60%, e no Gana a subida foi de 100%.

Nos Camarões o preço acabou por aumentar apenas 16% em relação a 2019, porque o Governo concedeu um subsídio avultado à comissão nacional responsável pela organização da peregrinação, na sequência do tumulto que se seguiu ao anúncio do preço inicial.   

A Nigéria tem a maior população muçulmana em ÁfricaFoto: Adeyinka Yusuf/AA/picture alliance

Quotas reduzidas devido à Covid

A Arábia Saudita limitou o número de visitantes com um sistema de quotas, estabelecendo uma ligação entre os números de cada país e o número de muçulmanos que ali vivem.

Devido à redução do número de visitantes este ano, as nações muçulmanas em todo o mundo viram as suas quotas reduzidas para 45% abaixo dos níveis de 2019.

A Nigéria, que tem a maior população muçulmana em África, viu a sua quota reduzida de 95.000 peregrinos em 2019 para 43.000 em 2022.

O secretário executivo do Conselho de Bem-Estar dos Peregrinos do Estado de Kano, Muhammad Abba Danbatta, disse aos meios de comunicação nigerianos tratar-se de um corte razoável, uma vez que, há dois anos, apenas 47.000 peregrinos nigerianos viajaram para Meca.

Problemas recorrentes

Problemas de organização que são recorrentes nalguns países irritaram muitos peregrinos.

Uma disputa entre a administração do Estado nigeriano de Kano e a comissão estatal responsável pelo hadjdj em torno da concessão de licenças a companhias aéreas para o transporte de peregrinos para a Arábia Saudita, deixou mais de 1.200 pessoas, encalhadas durante vários dias num acampamento perto do aeroporto da capital regional.

Segundo a imprensa nigeriana, cerca de 8.000 peregrinos estão retidos em todo o país. Na quarta-feira, a Arábia Saudita prorrogou o prazo de chegada dos peregrinos nigerianos pela segunda vez, permitindo agora a chegada até à meia-noite de 7 de julho.

O mesmo aconteceu no Níger, que este ano está autorizado a enviar cerca de 7.200 peregrinos. 1.800 ficaram retidos quando o transporte prometido para Medina, na Arábia Saudita, não se concretizou.

Peregrinações muçulmanas em África incluem o Grande Magal de Touba no SenegalFoto: CARMEN ABD ALI/AFP

A virtude da paciência

Mustapha Adamu, um jornalista baseado em Kano, disse à DW que alguns peregrinos nigerianos provavelmente irão pedir a devolução do seu dinheiro. Mas a maioria vai calmamente esperar pela sua vez no próximo ano, afirmou.

"Como muçulmanos, acreditamos que qualquer viagem envolve dificuldades e algumas consequências, especialmente neste exercício sagrado". Por isso, devem há que tem paciência, disse. "Faz parte do desafio".

Mas a paciência da Asma'u Ahmad parece ter-se esgotado. A nigeriana preparava a sua peregrinação há dois anos.

Fez o depósito de 2,5 milhões de nairas (equivalentes a 5.900 euros) como exigido pela comissão, para assegurar o seu lugar de peregrinação, disse à DW. Mas em seguida as autoridades não deram mais sinal de si.

"Foi-nos dito que seríamos chamados", disse Ahmad. Mas o tempo passou e o processo de distribuição de documentos e exames médicos não avançou. Ahmad pensa ter sodo vítima de fraude.

O total de peregrinos em Meca neste ano não deverá ser superior a um milhãoFoto: AFP/Getty Images

Plano de poupança

O jornalista Adamu diz que o maior desafio para os africanos não é a falta de organização ou informação, nem sequer a corrupção, da qual diz não ter qualquer indício neste contexto. O problema é a pobreza.

"Há quem venda as suas propriedades apenas para poder ir a Meca uma vez na vida", explicou. "E todos os anos sobem os preços enquanto a situação económica deteriora".

Consciente da importância da peregrinação para os muçulmanos, no ano passado a Comissão Nacional Hajj da Nigéria introduziu um plano de poupança para muçulmanos com baixo rendimento.

"Milhares de muçulmanos subscreveram o plano", disse Adamu.

Julien Adaye e Nasiru Salisu Zango contribuíram para este artigo.

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