Recursos naturais e posição geográfica de Moçambique despertam interesse de investidores alemães, diz responsável da delegação em Maputo da Câmara de Comércio alemã para a África Austral.
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Até agora, a Alemanha teve pouca presença económica em Moçambique. Estão presentes apenas cerca de 40 empresas, principalmente dos ramos da logística, engenharia ou da química - alguns nomes grandes, como as empresas de tecnologia Siemens e ThyssenKrupp e a farmacêutica Merck.
No entanto, até ao fim deste ano, deverá entrar em funcionamento uma mina de grafite na localidade de Ancuabe, província de Cabo Delgado, do grupo alemão AMG Graphit Kropfmühl, como anunciou Friedrich Kaufmann, responsável da delegação em Maputo da Câmara de Comércio alemã para a África Austral, em entrevista à DW.
DW África: Como tenta convencer empresários alemães a investirem em Moçambique?
Friedrich Kaufmann (FK): Moçambique é um país rico em recursos naturais, sobretudo gás, carvão, grafite e pedras semipreciosas. Logisticamente, tem uma posição muito interessante na África Austral, com portos, aeroportos e ligações com os chamados “países do hinterland” - Malawi, Zâmbia e Zimbabué. A logística é muito interessante para as empresas alemãs.
DW África: No que diz respeito aos recursos naturais, é possível entrar em funcionamento uma nova mina alemã?
FK: Temos há muitos anos o projeto de uma mina de grafite em Ancuabe. Depois de muita preparação, esperamos que a mina seja inaugurada no final deste ano. A grafite é um recurso muito valioso, muito procurado no mercado internacional. Além do carvão, que já é exportado em Moçambique, a grafite pode ser um segundo motor de recursos naturais para o país.
DW África: O conflito armado entre as forças do Governo e a oposição da RENAMO tem criado alguns problemas para atrair investidores da Alemanha?
FK: Ainda não porque, na zona de conflito – sobretudo as províncias de Manica, Sofala, Zambézia e um pouco em Tete – não temos empresas alemãs. A mina de grafite situa-se no norte, na província de Cabo Delgado. São zonas ainda pacíficas. Manica, Sofala e Zambézia são, sobretudo, províncias de agricultura e turismo e a Alemanha, tradicionalmente, não está nestes setores em Moçambique e em praticamente toda a África. Portanto, não há grandes problemas. O sul do país e Maputo quase não são tocados pelas consequências do conflito armado.
DW África: E a crise económica, com o aumento da dívida, a desvalorização do metical e o aumento da inflação, preocupa os empresários alemães presentes em Moçambique?
FK: Com certeza. É um grande problema. Atualmente há escassez de divisas e Moçambique ainda é uma economia que depende das importações – que são pagas em divisas. O dólar, o euro e o rand são necessários para pagar as faturas. Se não for possível pagar as faturas, chegamos a um ponto que os processos de produção e venda em Moçambique são impossíveis. Uma pequena empresa alemã, com três ou quatro pessoas, a Urano, importou peças, motores e máquinas da Alemanha e já fechou as portas, porque simplesmente não consegue pagar as transações.
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DW África: Qual tem sido o segredo das outras empresas? Pagam por meios próprios e esperam um dia recuperar as divisas necessárias?
FK: Exactamente. E há outra opção: algumas empresas que são sucursais de empresas internacionais alemãs ou de empresas alemãs na África do Sul têm acesso a divisas pelas empresas a que estão afiliadas. Economicamente, estas empresas são capazes de ajudar ou fazer transações. Por exemplo, os grandes bancos em Moçambique podem sobreviver porque bancos como o Standard Bank ou o Barclays tem acesso a reservas em divisas pelos bancos na África do Sul, Inglaterra ou outros países.
Faces de Tete e do carvão de Moçambique
A vida mudou na província de Tete desde a chegada de empresas multinacionais para explorarem o carvão. Os ventos da mudança trouxeram, para alguns, oportunidades para melhorar de vida; para outros, novas preocupações.
Foto: DW/Marta Barroso
Coque, o trabalhador
Coque tem 28 anos. Trabalha há quatro anos na empresa mineira britânica Beacon Hill. Lá, amarra lonas nos camiões que transportam o carvão até ao vizinho Malawi. Tal como muitos jovens na região, dantes Coque fabricava tijolos que vendia no mercado local. Mas hoje, diz, vive melhor. Por camião recebe 800 meticais, cerca de 20 euros, que divide com o colega que estiver com ele no turno.
Foto: Marta Barroso
Paulo, o diretor de operações da Vale
Apesar dos enormes incentivos fiscais de que gozam as empresas dos megaprojetos em Moçambique, como a brasileira Vale, Paulo Horta diz que um projeto de mineração como o de Moatize gera uma cadeia produtiva tão grande que a população local beneficia em grande medida com a sua vinda para Tete: através da criação de outras empresas, serviços, tributos gerados por terceiros e criação de empregos.
Foto: DW/Marta Barroso
Gomes António, vítima de maus tratos
Gomes António Sopa foi espancado e detido pela polícia na sequência da manifestação de 10 de janeiro de 2012, quando os habitantes de Cateme bloquearam a passagem do comboio que transportava carvão das minas até ao porto da cidade da Beira. Muitas das promessas feitas pela Vale, responsável pelo reassentamento de centenas de famílias, continuam por cumprir. Ainda hoje, Gomes António sente dores.
Foto: Marta Barroso
Duzéria, a curandeira
Os habitantes do Centro de Reassentamento de 25 de Setembro, no distrito de Moatize, queixam-se de que muitos aspetos culturais não foram respeitados durante o processo de reassentamento pelas empresas mineiras. A curandeira do bairro, por exemplo, diz que no planeamento do complexo não se teve em conta a construção de uma casa para o seu espírito.
Foto: Marta Barroso
Lória, a rainha
Provavelmente Lória Macanjo e a sua comunidade deverão ser reassentadas brevemente: a multinacional Rio Tinto está já a operar um mina de carvão em Benga, perto da sua aldeia, Capanga. Também aqui, debaixo da terra que herdou do pai, a empresa mineira descobriu carvão. Mas a rainha sabe do destino dos que já se mudaram e recusa-se a deixar a sua casa.
Foto: DW/Marta Barroso
Olivia, a cabeleireira
Olivia (esq.) tem 29 anos e veio em 2008 do seu país, o Zimbabué, fugindo à crise financeira que lá se vive. Tete é agora a terra das grandes oportunidades, tinham-lhe dito. Hoje, é cabeleireira no Mercado Primeiro de Maio e, tal como a amiga Faith (dir.) faz trabalhos de manicure. Diz que, por dia, consegue 500 a 1000 meticais, entre 15 e 25 euros. Com esse dinheiro consegue sustentar-se.
Foto: DW/Marta Barroso
Guta, o empresário
Ao todo, Guta emprega 130 homens nas áreas de carpintaria e construção civil na cidade de Tete. Diz que desde a chegada das grandes empresas à região não sentiu grandes alterações no seu negócio. Os projetos de mineração requerem quantidades às quais não consegue responder. Uma vez, conta, a Vale pediu que fornecesse, juntamente com outra carpintaria da cidade, 5000 portas em 60 dias.
Foto: DW/Marta Barroso
Canelo, o vendedor de amendoins
Canelo diz que tem 11 anos. E diz também que frequenta a segunda classe. Todas as tardes vende amendoins no centro de Tete. "Para ajudar a mãe que não tem trabalho." O pai também está desempregado. Canelo é uma de muitas crianças que vendem amendoins na cidade. Um saco pequeno fica por dois meticais, cerca de cinco cêntimos de euro, o maior custa cinco meticais, treze cêntimos de euro.
Foto: DW/Marta Barroso
Catequeta, o ativista
Manuel Catequeta mudou-se para Tete em 2001. O ativista dos direitos humanos sabe o que custa viver com a subida constante do custo de vida. O seu salário não lhe permite luxos. A sala de sua casa "de dia é sala, de noite vira quarto". Mas mudar de casa, para já, está fora de questão. Hoje em dia, uma boa casa na capital provincial passa dos 5.000 dólares, cerca de 4.000 euros, por mês.
Foto: DW/Marta Barroso
Júlio, o otimista
O músico Júlio Calengo vê oportunidades de negócio, agora que em Tete há tantas empresas novas. O seu objetivo é, em breve, montar uma empresa de limpeza: tanto nos escritórios das empresas mineiras como nos das firmas que entretanto apareceram na cidade. Interessados não vão faltar, diz Júlio. O que é preciso é ter criatividade e, claro, dinheiro.